São Paulo, terça-feira, 13 de fevereiro de 2007

Texto Anterior | Próximo Texto | Índice

entrevista

"Liderança de Raúl Castro é decisiva"

NICOLAS BOURCIER
DO MONDE, EM MIAMI

O americano Brian Latell, ex-especialista em Cuba da CIA, a agência central de espionagem, e autor do livro "After Fidel" (após Fidel), diz, nesta entrevista ao "Monde", que a liderança de Raúl Castro tem se mostrado decisiva na transição na ilha.

 

FOLHA - Como o sr. vê a situação de Cuba desde o afastamento de Fidel Castro, em 31 de julho do ano passado?
BRIAN LATELL
- Já se passaram mais de seis meses desde que Raúl Castro assumiu o comando. Foram seis meses durante os quais não houve manifestações, nem qualquer tentativa de nenhum outro dirigente de questionar a autoridade de Raúl. Este está comandando Cuba com uma liderança que vem se mostrando decisiva. Raúl se distingue até mesmo em seu estilo de governança. Ele administra os assuntos de maneira colegiada, pedindo o parecer de cerca de 20 altos dirigentes cubanos. Ele chegou a afirmar, diante dos estudantes da Universidade de Havana, que quer ouvir "novas reflexões".

FOLHA - É o caso de tomá-lo ao pé da letra quando ele convida os Estados Unidos para negociações?
LATELL
- Raúl já disse isso duas vezes. Em agosto ele anunciou aos jornalistas do "Granma" (o órgão oficial do Partido Comunista cubano) que era receptivo à idéia de um processo de normalização das relações entre Havana e Washington. No desfile militar de 2 de dezembro, Raúl repetiu algumas das frases que pronunciara naquela reunião.

FOLHA - Qual é a Cuba que Raúl Castro deseja?
LATELL
- Creio que Raúl compreende a situação melhor que Fidel. Ele sabe que precisa melhorar a economia do país, a qualquer custo. Que precisa atender às expectativas dos mais jovens. Assim, para relançar o processo, Raúl deseja fazer crescer e diversificar os investimentos estrangeiros, mesmo que provenham dos EUA. Ele também quer desenvolver as atividades econômicas privadas de pequena monta. O setor do turismo, que ele controla, funciona com base em técnicas de gerenciamento capitalistas.
A idéia de Raúl é desenvolver uma versão tropical do modelo chinês. Mas atenção: ele pensa no modelo chinês instalado por Deng Xiaoping no final dos anos 1970, e não no de hoje. Raúl não quer milionários nem Mercedes em Cuba.

FOLHA - Ele possui os meios para promover tal evolução?
LATELL
- Raúl foi o organizador do regime cubano. Se eu tivesse que empregar uma metáfora cinematográfica, diria que Fidel, o visionário, é o diretor do filme, e Raúl, o produtor. Foi Raúl quem estruturou o Exército, organizou as forças de segurança e desenvolveu setores inteiros da economia.

FOLHA - Por que ele foi subestimado por tanto tempo?
LATELL
- Raúl viveu por mais de meio século à sombra de seu irmão mais velho, sufocado por essa figura quase mítica. Fidel nunca admitiu publicamente até que ponto Raúl exerceu um papel essencial na estabilidade política do regime. Filho ilegítimo, Raúl se colocou em posição de subordinação em relação a seu irmão mais velho. Isto dito, Raúl não possui nenhuma das qualidades de Fidel. Não tem o carisma deste. Contrariamente a Fidel, que percorreu o mundo, Raúl viajou muito pouco. Sobretudo -e é esse seu maior ponto fraco-, ele nunca administrou uma crise de grande envergadura. Como vai reagir diante de adversidades?


Tradução de CLARA ALLAIN


Texto Anterior: Partido Democrata tenta cooptar cubanos da Flórida
Próximo Texto: Acordo com coreanos tem versão preliminar
Índice


Copyright Empresa Folha da Manhã S/A. Todos os direitos reservados. É proibida a reprodução do conteúdo desta página em qualquer meio de comunicação, eletrônico ou impresso, sem autorização escrita da Folhapress.