São Paulo, sábado, 13 de março de 2004

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MORTE NOS TRILHOS

OS PSICÓLOGOS
O psicólogo Juan Cruz passou toda a noite ajudando famílias de vítimas. Ele diz que essa é a morte mais difícil de ser aceita porque não há justificativa ou sentido. "Podemos apenas oferecer um ombro."
Miguel Angel Rodriguez, da Cruz Vermelha, está preocupado com o estado mental de sua própria equipe. "Muitos dos psicólogos voluntários passaram toda a manhã em meio a sacos semi-abertos com corpos ou cadáveres incompletos. Alguns se resumem a apenas uma mão. Ainda assim, algumas das famílias insistem em ver os restos de seus amados, por mais horrível que seja, porque de outra maneira não conseguem acreditar."

AS CRIANÇAS
Na escola primária a apenas 500 metros da estação Santa Eugenia, pelo menos 6 dos 900 alunos perderam um pai. Um estudante de 13 anos fez um poema: "Lá vem o trem/ Pintado de vermelho e branco/ O vermelho do sangue e o branco do medo/ Lá vem o trem/ pintado de morte/ Lá vem o trem/ Cheio de maldade/ Em um instante/ Fazendo das crianças pobres órfãos".

A VÍTIMA DO ETA
Irene Vila perdeu suas pernas em um ataque do ETA em 1991 que também feriu gravemente sua mãe. Mas os acontecimentos de anteontem foram ainda mais dolorosos. "Foi o dia mais terrível de minha vida, muito pior do que quando eu fui atacada."
Ontem ela passou o dia conversando com parentes e amigos das vítimas. "Eu vim para dar meu apoio. Era o mínimo que poderia fazer." Ela disse ter ficado particularmente emocionada com a mãe de um rapaz de 20 anos, cujo corpo ficou irreconhecível. "Eu posso imaginar a dor que ela está sentindo em perder o filho de uma maneira tão selvagem."

OS FILHOS
Os quatro filhos de Alicia Cano Martinez, 60, passaram todo o dia procurando pela mãe. Cada vez mais desesperados, eles foram de hospital em hospital, sem encontrá-la. Seu nome não aparecia em nenhuma das listas de mortos ou feridos. Finalmente, às 6h de ontem, eles encontraram o seu corpo num necrotério montado num parque da capital. A história de Alicia é igual à de muitas das outras vítimas. Ela havia saído para o seu trabalho de assistente social como fazia todas as manhãs. Ela descia do trem no exato momento em que a explosão aconteceu.

O MUÇULMANO
Mohamed Samadi, 30, é vigia de uma loja em Madri. "Soube dos ataques pelo rádio e fiquei sem fala. Sou um muçulmano e contra o terrorismo de qualquer tipo. O islã é contra o terrorismo, nem todos os muçulmanos são terroristas. É preciso estabelecer a diferença. Foi um crime contra a humanidade, e todos nós somos humanos. Não há justificativa para isso."

O TOUREIRO
O toureiro Curro Martinez não foi para o seu treino habitual de ontem. Ao invés disso, ele se juntou à multidão que se formou no centro da cidade de Linares, na Andaluzia. Todas as touradas na Espanha foram adiadas por dois dias, durante o período oficial de luto. "Você se sente muito mal. Foi algo completamente imprevisível, que matou muitas pessoas inocentes. Como algo assim pôde acontecer?" (DO "INDEPENDENT")


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