São Paulo, domingo, 13 de agosto de 2006

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Independência e guerra civil mudam balanço

GUSTAVO CHACRA
COLABORAÇÃO PARA A FOLHA, DE NOVA YORK

O artigo 5º da Constituição libanesa determina que a bandeira tenha um cedro no centro para representar a árvore que, segundo o site oficial da Presidência do Líbano, caracteriza o país desde o seu nascimento, bem antes da independência, quando sua madeira foi utilizada para construir "templos e navios", alguns fenícios, outros romanos, mas "que serviram de inspiração para a imortalidade e a tolerância".
A bandeira do Líbano foi desenhada pela primeira vez em 11 de novembro de 1943, 11 dias antes de o país ficar independente do mandato francês. Era então o único país majoritariamente cristão no Oriente Médio -hoje, a maioria é muçulmana.
Parte do que historicamente é chamado de Chams, região que engloba também a Síria, Jordânia e a Palestina histórica, o Líbano era uma faixa geográfica de montanhas ao longo da orla do Mediterrâneo, onde estavam cidades erguidas pelos fenícios, como Biblos e Tiro.
Nos montes do Líbano, desde o século 7, vivia um grupo de cristãos, com relativa autonomia, oriundos da Síria e aliados da França -os maronitas, que eram minoritários na "Grande Síria". Além deles, essa região continha uma maioria sunita, outros cristãos, drusos, xiitas e até mesmo judeus.
Com o fim da Primeira Guerra e o colapso do Império Otomano, a região foi dividida entre franceses e britânicos, no Acordo de Sykes-Picot, de 1916. O Reino Unido ficou com o que é hoje o Iraque, a Jordânia e a Palestina histórica. A França, com a Grande Síria, incorporando o Líbano.
Neste período, não havia ainda a noção de país entre os árabes. Eles viviam muito mais em função de suas vilas e de seus arredores.
Os franceses inicialmente dividiram a Grande Síria em cinco regiões: uma druza, chamada Jabal al-Druze, perto da fronteira com a Jordânia; uma alauíta, no litoral da atual Síria; duas sunitas, sendo uma ao redor de Alepo e a outra ao redor de Damasco; já os cristãos maronitas ficaram com o Líbano.
Todas essas áreas foram unificadas em um só Estado, menos o Líbano.
No início, os sunitas libaneses mantiveram boas relações com a Síria, os maronitas continuaram com as históricas relações com Paris, enquanto os xiitas foram marginalizados completamente do poder, isolados em pobres vilas no sul.
Com a mudança da OLP (Organização para a Libertação da Palestina), majoritariamente sunita, para o Líbano, no fim dos anos 60, a balança de poder se alterou. Em 1975, a tensão chegou ao seu ápice: maronitas contra sunitas, aliados à OLP, deram início à guerra civil, com Beirute dividida entre o oeste muçulmano e o leste cristão, com o centro sendo completamente destruído.
No entanto, a guerra civil não foi uma divisão simples. Maronitas, xiitas e sunitas também lutavam dentro de suas próprias comunidades. Síria e Israel acabaram por se envolver no conflito.
O conflito apenas se encerrou com os acordos de Taif, em 1989. Os maronitas tiveram o seu poder reduzido, com sunitas e xiitas não mais isolados, pois passaram a contar com o apoio do Irã e se fortaleceram, um com mais poder politico e outro com maior poder militar, por meio das armas do Hizbollah. Síria e Israel mantiveram a ocupação.
Desde o fim da guerra civil, muita coisa aconteceu no Líbano, alianças internas e externas foram feitas e desfeitas, israelenses e sírios se retiraram e uma nova guerra eclodiu em julho deste ano. Agora a resolução 1.701 da ONU foi aprovada para encerrar o conflito.
Se houver os fins do combate, o Líbano provavelmente retomará o seu diálogo nacional interrompido pelo conflito para decidir a nova balança de poder, em que não apenas a religião, mas também questões como as armas do Hizbollah, as relações com a Síria, com os 360 mil refugiados palestinos no país e com Israel terão de ser discutidas.
Como estampa a bandeira, o governo do premiê Fouad Siniora diz esperar que o cedro -símbolo de tolerância- prevaleça.


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