São Paulo, domingo, 13 de agosto de 2006

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Escândalos e impopularidade ameaçam abreviar governo Blair

Chamado de "poodle de Bush" por parte da imprensa, premiê britânico sofre críticas até dentro de seu partido e corre o risco de deixar o poder antes de 2010

Adnan Abidi - 5.ago.2006/Reuters
Indiano usa máscara contra Blair em ato pró-Líbano em Nova Déli


MARCO AURÉLIO CANÔNICO
DE LONDRES

Nos últimos nove anos desde que foi eleito -e reeleito duas vezes- primeiro-ministro do Reino Unido, foram raras as ocasiões em que Tony Blair precisou tanto de férias como as que desfruta desde a última terça-feira.
Mas, um dia depois de partir para o Caribe com sua família, deixando no Reino Unido a série de escândalos que seu governo enfrenta e as crescentes críticas pela política externa belicista, Blair foi alcançado por uma notícia ainda pior.
No desenvolvimento de uma investigação que o premiê já conhecia, mas cujos desdobramentos repentinos não haviam sido previstos, a polícia acabara de prender 24 supostos terroristas que estariam tramando um atentado de larga escala em vôos de Londres aos EUA.
Blair acompanhava à distância o alerta de segurança do país ser elevado pela primeira vez para seu nível máximo e as novas medidas de inspeção causarem o caos nos aeroportos.
A oposição questionou os motivos pelos quais o premiê viajou um dia antes da ação e criticou a ausência dele em plena crise -até porque o responsável pelo governo durante suas férias, o vice John Prescott, está envolvido em denúncias de corrupção.
O "timing" ruim da viagem foi apenas o mais recente problema de Blair. O contínuo apoio a Israel na guerra contra o Hizbollah no Líbano, contra a opinião pública, a imprensa e parte de seu partido, fez estrago muito maior à sua imagem.
O leque de problemas que levaram o premiê à sua pior avaliação entre o eleitorado, segundo pesquisa divulgada recentemente pelo jornal econômico "Financial Times", inclui ainda uma acusação de pagamentos de empréstimos com posições na Câmara dos Lordes que pode levar Blair a ser convocado pela polícia a depor.
Além do Oriente Médio e do possível depoimento, o primeiro-ministro também é atormentado pela pressão de seus correligionários para anunciar, já na convenção do Partido Trabalhista, em setembro, a data em que deixará o poder.
Após ser reeleito pela segunda vez, no ano passado, e entrar para a história como o único trabalhista a ter conseguido tal feito, Blair anunciou que não se candidataria novamente -dando vazão a comentários de que não chegaria nem até o fim deste mandato, em 2010.
Os simpatizantes de Gordon Brown, ministro das Finanças e provável herdeiro do cargo de primeiro-ministro, clamam pela saída imediata de Blair para que seja possível livrar o Partido Trabalhista do legado de apoio à política externa dos EUA, que pode levar à derrota nas próximas eleições gerais.

"Poodle de Bush"
As reações adversas a Blair no Reino Unido, até mesmo em seu partido, cresceram na mesma proporção que seu apoio ao governo Bush a partir do 11 de Setembro. O apoio incondicional do premiê britânico à invasão do Afeganistão (2001), em busca dos terroristas que coordenaram os atentados nos EUA, e à Guerra do Iraque (2003), atrás das supostas armas proibidas de Saddam Hussein, valeram o apelido, na imprensa e na oposição, de "poodle de Bush".
Mesmo a significativa união em torno do governo após os atentados de 7 de julho de 2005 em Londres, se esvaiu à medida que Blair recrudesceu a política de segurança interna, levando-o à sua maior derrota parlamentar, com a rejeição de um pacote de medidas contra o terror, em novembro passado.
A crise no Líbano, em que o Reino Unido foi o único parceiro dos EUA no apoio a Israel, postergando a resolução das Nações Unidas por um cessar-fogo, apenas exacerbou as críticas e o descontrole do premiê sobre seus ministros e aliados.
Mais de 110 parlamentares do Partido Trabalhista assinaram uma petição por um cessar-fogo imediato enquanto Blair titubeava, afirmando que a negociação era lenta para conseguir uma paz duradoura.

Problemas internos
A soma da crise de sua política externa com problemas internos levou o Partido Trabalhista à derrota nas eleições municipais de maio passado.
Como resultado, Blair fez uma reforma ministerial que mexeu em postos-chave de seu gabinete, mas não conseguiu estancar sua queda de popularidade nem o surgimento de acusações de corrupção.
A principal diz respeito à suspeita de que seu partido pagou quatro empresários que fizeram empréstimos de mais de 4,5 milhões de libras (R$ 18,6 milhões) com títulos de nobreza, que dão acesso à Câmara dos Lordes do Parlamento.
A investigação da Scotland Yard já levou à prisão, para interrogatório, do tesoureiro do partido, Michael Levy. Se Blair for convocado a depor, como especula parte da imprensa britânica, a pressão pela sua renúncia pode ser insustentável.


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