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GOLPE NA VENEZUELA
Washington prefere adotar cautela na crise, mas considera a deposição um presente, diante da pressão sobre os preços do petróleo
EUA desestimularam golpe contra Chávez
DO ENVIADO ESPECIAL A CARACAS
A diplomacia e os serviços de
inteligência dos Estados Unidos
monitoravam desde fevereiro os
movimentos para depor o presidente venezuelano Hugo Chávez.
Mas funcionários norte-americanos garantem que, desta vez, a Casa Branca decidiu não só ficar de
fora de um golpe militar na América Latina como também orientou opositores de Chávez a tirá-lo
do poder apenas por vias democráticas.
Até agora, embora os dados disponíveis sejam insuficientes para
indicar exatamente como atuaram os Estados Unidos, é possível
destacar o momento que a sugestão de um golpe teria sido exposta
por militares e empresários venezuelanos a autoridades norte-americanas.
Embaixadora
No dia 26 de fevereiro passado, a
então embaixadora dos EUA na
Venezuela, Donna Hrinak (que
hoje é embaixadora americana no
Brasil), despediu-se de seu posto
em Caracas com uma série de
conversas, públicas e privadas.
Hrinak reuniu-se com o prefeito de Caracas, Alfredo Peña, opositor de Chávez, e teve uma rápida
e cordial conversa com o próprio
presidente.
Em baixa nas pesquisas de opinião, Chávez apostara no fracasso
da greve geral convocada naquela
época. A greve foi um sucesso. O
presidente tentou usar o encontro
com Hrinak como sinal de sua legitimidade. Disse que os EUA não
gostavam dele, mas que o respeitavam como líder legítimo.
O relacionamento de Hrinak
com Chávez, dizem funcionários
do governo norte-americano, fora muito mais duro do que aquele
que Chávez gostaria de ter e muito mais suave do que aquele sugerido pela Casa Branca.
Naquele dia, Hrinak teve outras
conversas privadas - algumas
com militares, outras com empresários- antes de voltar a Washington.
Rumores
No dia 27 de fevereiro, o porta-voz do Departamento de Estado,
Richard Boucher, deu consistência aos rumores de que militares
venezuelanos descontentes com
Chávez teriam perguntado a autoridades norte-americanas se a
Casa Branca apoiaria um golpe.
"Quem quer mudanças, mudanças políticas, deve buscá-las
de maneira democrática e constitucional", disse Boucher, referindo-se a uma eventual sugestão de
golpe feita por militares venezuelanos.
Boucher disse ainda que "os
EUA não interferem nas eleições
de outros países".
Se o que dizem as autoridades
norte-americanas é verdade, Chávez teria caído por seus próprios
problemas, embora os EUA tenham torcido o tempo todo para
que isso ocorresse.
Para a Casa Branca, sua deposição é um presente num momento
em que a crise no Oriente Médio
pressionava os preços de petróleo. Quarto maior produtor de petróleo do mundo, a Venezuela é a
única nação americana que integra a Opep (Organização dos Países Produtores de Petróleo).
Com o fim da "revolução bolivariana" na Venezuela, terceiro
fornecedor de petróleo para os
EUA, os donos de refinarias nos
Estados do Texas e da Louisiana,
feitas especialmente para processar o tipo de petróleo venezuelano, voltam a ter um aliado em Caracas. Outros investidores norte-americanos voltam a sonhar com
os preços de royalties que pagavam antes da eleição de Chávez.
Além disso, acabam os encontros incômodos de Chávez com
inimigos arraigados dos EUA, como Saddam Hussein e Fidel Castro, e os rumores de uma aliança
entre Chávez e os guerrilheiros
das Farc. Mas nem por isso os
EUA (ao menos Hrinak) apoiariam um golpe na Venezuela.
Como a queda de Chávez ficou
na zona cinzenta entre a vitória
popular e a ação golpista, os EUA
demoraram um pouco para soltar
uma nota a seus diplomatas. Mas
acabou orientando-os a elogiar a
calma dos militares venezuelanos
e projetar um futuro otimista para
o país.
(MARCIO AITH)
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