São Paulo, segunda-feira, 14 de abril de 2008

Texto Anterior | Próximo Texto | Índice

Fábrica estatal tem prejuízo na Venezuela

Vizinha à Sidor, que será nacionalizada, a produtora de alumínio Alcasa opera no vermelho há 16 anos

FABIANO MAISONNAVE
ENVIADO ESPECIAL A CIUDAD GUAYANA

Responsável pelas negociações para nacionalizar a siderúrgica argentina Sidor, o ministro venezuelano das Indústrias Básicas e Mineração (Mibam), Rodolfo Sanz, advertiu os sindicalistas da empresa na última quinta-feira: "Se reproduzirmos aqui o esquema do alumínio, estamos ferrados. Estamos claros aqui?"
Na função acumulada de presidente da Corporação Venezuelana de Guayana (CVG), controladora de 17 estatais, Sanz sabe do que está falando: várias dessas empresas, entre as quais cinco do "esquema do alumínio", registram anos operando no vermelho, em meio a denúncias de corrupção, altos custos trabalhistas e defasagem tecnológica.
A CVG foi fundada nos anos 1960, quando o governo venezuelano criou o pólo metalúrgico de Ciudad Guayana, cidade planejada de 1 milhão de habitantes, 700 km a leste de Caracas, cujos quarteirões e avenidas largas lembram muito Brasília. Suas empresas hoje mantêm 18 mil trabalhadores.

Sem investimento
O caso mais emblemático é o da Alcasa, fábrica de alumínio inaugurada em 1967 e hoje muitas vezes usada na propaganda oficial por ter uma "administração socialista",ou seja, compartilhada com o sindicato. Atualmente, emprega cerca de 4.000 pessoas.
Segundo dados oficiais, a Alcasa acumula 16 anos seguidos no vermelho. Somente em 2007, quando a dívida aumentou 25%, o prejuízo da estatal foi de R$ 370 milhões, ou seja, mais de R$ 1 milhão por dia.
"Para cada bolívar [moeda venezuelana] que a empresa tem investido em seus ativos totais, está endividada com seus credores em 192% e 240% nos anos 2006 e 2007. O que indica que a participação dos credores sobre o ativo total da empresa é maior do que 100%", relata o balanço da Alcasa.
Há 20 anos sem investimentos para atualização tecnológica, a fábrica, localizada em Ciudad Guayana, tem vários sinais de abandono. O destaque é a unidade de produção de carvão, onde houve um incêndio em 30 de maio do ano passado. Até agora, não há previsão de quando o local será reconstruído, e a empresa tem de trazer o produto de fora.

"Na unha"
"Nos últimos 12 anos, houve uma abandono completo das empresas da CVG à sua sorte", disse o secretário-geral do sindicato de trabalhadores da Alcasa, Henry Arias, em entrevista à Folha na sexta-feira, no sindicato. "Os trabalhadores da Alcasa merecem uma homenagem. Porque nem o presidente nem os ministros sabem como se produz uma gota de alumínio: com as unhas."
Arias afirma que a defasagem tecnológica da Alcasa tem se convertido numa ameaça tanto ao ambiente quanto à saúde dos funcionários. "Nas áreas de trabalho, as lâmpadas estão cheia de alumina. Imagine como entra nos pulmões."

Salários
De um aspecto Arias não reclamou: os salários pagos nas estatais são várias vezes superiores aos do setor privados.
Um operador de forno da vizinha Sidor, por exemplo, tem um salário mensal de cerca de R$ 470 -o impasse nas negociações salariais com o sindicato da empresa foi o motivo alegado por Chávez para nacionalizá-la. Na Alcasa, a mesma função rende dez vezes mais, R$ 4.700 -na sexta-feira, foi anunciado um aumento salarial médio de 10%.
Os valores foram fornecidos pelos sindicatos das empresas.
O sindicalista disse que "poderia haver" uma relação entre os salários altos e o déficit da empresa, mas diz que a culpa da atual situação é sobretudo da falta de investimentos.
"Se o Estado fizer as inovações tecnológicas, nós asseguramos a produção."


Texto Anterior: Entrevista: "Oviedo é um estadista", diz paranaense
Próximo Texto: Estatização eleva postos no setor público
Índice



Copyright Empresa Folha da Manhã S/A. Todos os direitos reservados. É proibida a reprodução do conteúdo desta página em qualquer meio de comunicação, eletrônico ou impresso, sem autorização escrita da Folhapress.