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São Paulo, quarta-feira, 14 de maio de 2003

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ANÁLISE

Terror e Bush se alimentam

MÁRCIO SENNE DE MORAES
DA REDAÇÃO

Atentados terroristas contra cidadãos ou propriedades ocidentais legitimam a atual política externa agressiva do governo americano, que, por sua vez, é em grande parte a justificativa utilizada pela rede Al Qaeda, do saudita Osama bin Laden, para atacar os interesses dos EUA, segundo analistas ouvidos pela Folha.
"A Al Qaeda busca expulsar os ocidentais da Arábia Saudita, onde ficam Meca e Medina, os dois locais mais importantes do mundo islâmico, e do Oriente Médio em geral", explicou Jean Leca, arabista e professor do Instituto de Estudos Políticos de Paris.
"Ora, a presença dos EUA em Najaf e em Karbala [Iraque], cidades sagradas para os muçulmanos xiitas, só faz justificar ações extremistas aos olhos dos terroristas. Quem cometeu os atentados em Riad, mesmo que não tenha sido a Al Qaeda, tinha isso em mente."
George W. Bush disse que a Al Qaeda pode ter realizado os ataques e que os terroristas "aprenderão o significado da justiça americana". Para Diana Owen, da Universidade de Georgetown (EUA), essa reação era esperada.
"Bush esteve apagado até setembro de 2001. No momento adverso, ele e seus assessores perceberam que tinham um papel crucial a desempenhar. Desde então, todavia, o governo vem mantendo essa cultura do medo nos EUA, que lhe é bastante favorável politicamente", analisou Owen.
"O Afeganistão, o Iraque e a guerra ao terrorismo são temas totalmente interligados para os estrategistas de Bush. Assim, ataques contra ocidentais no Oriente Médio legitimam a ação dos que defendiam a ofensiva preventiva contra o Iraque. É provável que a "nova ameaça terrorista" passe a ter grande destaque na mídia."
De acordo com Joseph Nye, reitor da Kennedy School of Government, da Universidade Harvard (EUA), Washington deve agir cautelosamente para não transformar a guerra ao terrorismo num choque de civilizações.
"Bin Laden quer o choque de civilizações. Mas, por enquanto, o Ocidente não caiu nessa armadilha. Não podemos permitir que essa idéia se torne uma profecia que se auto-realiza", avaliou Nye.
Leca teme, porém, que uma forte reação americana dê munição aos terroristas. "No Oriente Médio, os EUA são vistos como pró-Israel e não fazem muito para mudar isso. Quanto mais eles expuserem seu poder militar, pior será a repercussão na região."
Washington deverá, portanto, mostrar que sabe separar os muçulmanos radicais dos moderados. Senão, com o tempo, a profecia acabará se auto-realizando. Ademais, os serviços secretos são bem mais eficazes que os militares na guerra ao terrorismo.


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