São Paulo, domingo, 15 de fevereiro de 2004

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Guru da direita elogia presidente, mas vê erros

MÁRCIO SENNE DE MORAES
DA REDAÇÃO

O republicano George W. Bush tem sido um ótimo presidente num tempo de guerras. Todavia talvez já pudesse ter dado mais atenção a certas questões domésticas, como os excessivos gastos do governo com programas não relacionados à segurança ou à defesa dos interesses americanos.
A avaliação é de Gary Bauer, presidente de um "think tank" conservador denominado American Values (valores americanos) e uma das figuras mais influentes da cena política dos EUA.
Leia a seguir trechos de sua entrevista, por telefone, à Folha.

Folha - Bush parece estar em dificuldade por conta de vários temas, como o déficit fiscal. Como o sr. avalia essa situação?
Gary Bauer -
Não é anormal que, no início do ano eleitoral, o candidato da oposição saia na frente, colocando o presidente na defensiva. Os pré-candidatos democratas vêm fazendo uma espécie de competição para mostrar quem ataca mais o presidente, e isso tem dominado os telejornais, o que influencia o eleitorado.
Contudo creio que Bush esteja em condições relativamente boas no que se refere à campanha. A economia realmente parece ter retomado o caminho do crescimento. E, se houver uma sólida criação de empregos nos próximos seis meses, ele deverá estar em ótima posição na campanha.

Folha - Quais são as principais fraquezas de Bush, que poderão ser exploradas pelos democratas?
Bauer -
A controvérsia em torno das armas de destruição em massa de Saddam Hussein é uma fraqueza. A maioria da população acredita no presidente atualmente, mas, se nos próximos meses, ela chegar à conclusão de que ele a enganou intencionalmente para invadir o Iraque, poderá haver o que chamamos aqui nos EUA de defasagem de credibilidade.
Ironicamente, outra fraqueza é a segurança interna. Bush fez um grande trabalho no que concerne à proteção do território americano, não fomos mais atacados desde o 11 de Setembro. Todavia, à medida que passam a sentir-se mais seguras em seu país, as pessoas tendem a voltar sua atenção para questões domésticas, como despesas com o setor social ou com educação, nas quais os democratas levam certa vantagem sobre os republicanos.

Folha - Bush tem dado sinais de que busca agradar a seu eleitorado conservador ultimamente. Ele será obrigado a abrandar o tom?
Bauer -
Na verdade, penso que ele terá de fortalecer sua base conservadora, já que parte dela está descontente. O presidente desagradou bastante a certos economistas conservadores quando decidiu gastar mais em programas federais não ligados à segurança. Alguns de seus simpatizantes de grupos religiosos conservadores crêem que ele pudesse ter sido mais ativo no debate sobre a definição do casamento.
Assim, veremos o presidente bem mais rigoroso no que diz respeito ao controle dos gastos governamentais e bem mais eloqüente a respeito da questão do casamento. Afinal, ele sabe que não pode correr o risco de afastar-se de sua base tradicional. Sua reeleição depende desses votos.

Folha - O enorme déficit orçamentário americano desagrada até a alguns setores do Partido Republicano. Qual é o problema?
Bauer -
Parte do déficit orçamentário é compreensível, já que o impacto econômico do 11 de Setembro provocou uma queda na arrecadação do governo, além de seus gastos terem subido por conta do conflito no Afeganistão, da guerra ao terrorismo global e da ofensiva contra Saddam Hussein.
É mais problemático, todavia, o fato de as despesas em setores não ligados ao Departamento da Defesa ou ao da Segurança Interna também terem tido um aumento considerável. Isso gera apreensão em muitos economistas conservadores. Por isso acredito que, neste ano, o presidente venha a fazer o possível para controlar o crescimento do Orçamento.

Folha - No entanto o corte de impostos defendido por Bush tende a agravar a situação, não é?
Bauer -
A redução de impostos foi a melhor medida econômica tomada pela atual administração. A economia americana teve uma fase ruim, e a última coisa que um dirigente deveria fazer nessas condições é tirar ainda mais dinheiro dos contribuintes. É difícil ganhar dinheiro, e ninguém gosta de mandá-lo para Washington.
Nos próximos meses, deveremos assistir a um espetacular fenômeno de criação de empregos nos EUA, e isso só ocorrerá por causa do corte de impostos proposto pelo atual governo.

Folha - Qual é sua análise do primeiro mandato de Bush?
Bauer -
Ele tem sido um ótimo presidente num tempo de guerras. Se tivesse de tecer críticas, diria que ele talvez não tenha dado a devida atenção a certas questões domésticas, mas creio que ele seja um grande presidente.
Talvez ele pudesse ter sido mais cuidadoso com questões ligadas aos gastos do governo não relacionados à segurança dos EUA. Bush poderia ter refletido duas vezes antes de sancionar aumentos significativos dos gastos públicos com remédios, por exemplo. Afinal, não se pode saber o verdadeiro custo do Medicare [espécie de seguro-saúde], e isso poderá gerar problemas orçamentários em cinco ou dez anos.


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