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Salvadorenho copia Lula em campanha
Candidato da ex-guerrilha FMLN, Mauricio Funes contratou marqueteiro petista e testa mensagem de moderação nas urnas hoje
Direita governista usou Chávez contra esquerda; à diferença de 2004, EUA ficaram neutros na disputa, a mais acirrada desde 1992
FLÁVIA MARREIRO
DA REPORTAGEM LOCAL
Hugo Chávez é a arma da direita e Luiz Inácio Lula da Silva
-e o marqueteiro petista João
Santana- são o norte da esquerda na eleição presidencial
de El Salvador que acontece
hoje, a mais disputada em 17
anos e a primeira na qual um
candidato da ex-guerrilha
FMLN (Frente Farabundo
Martí de Libertação Nacional)
tem chances de ganhar.
A julgar pela campanha da
governista Arena (Aliança Republicana Nacionalista, direita), no poder desde 1989, trata-se de um referendo na Venezuela. O candidato Rodrigo Ávila, 44, espalhou o bolivariano
em outdoors e spots de TV que
conclamam os salvadorenhos a
salvar o país de Chávez e das
"garras do comunismo".
É um ataque potente contra a
FMLN -convertida em partido
político no acordo de paz de
1992, que pôs fim à sangrenta
guerra civil (1980-1992) do país
centro-americano-, numa
eleição em que a ex-guerrilha
se mostrou mais disposta do
que nunca a mostrar imagem
de esquerda pragmática.
A frente escolheu Mauricio
Funes, 49, popular jornalista de
TV, para representá-la. Funes
-que lidera as pesquisas por
pequena margem- não lutou
na guerra civil e ainda mantinha relação próxima com Lula.
"O socialismo do século 21
não é para El Salvador", disse
Funes à Folha. "Considero Lula e seu estilo de governar meu
referencial mais próximo.
Quando fui escolhido candidato, não vacilei. Convenci o partido a contratar João Santana,
que conheço há anos", continuou ele, casado com a brasileira e petista Vanda Pignato,
funcionária da Embaixada do
Brasil em San Salvador.
O marqueteiro lulista encheu a TV com crianças e trabalhadores correndo balançando a bandeira salvadorenha em
clipes bem filmados com jingles com variações de "a esperança vencerá o medo", o slogan "Mudança Segura" e imagens de Lula e Barack Obama,
recente adepto do mantra.
Funes lançou até, há três
dias, uma Carta à Nação, nos
moldes da Carta ao Povo Brasileiro do petista em 2002. Prometeu segurança jurídica aos
investidores, negou que vá fazer nacionalizações e disse que
não quer rever o Cafta, o acordo de livre comércio dos EUA
com a América Central.
Apesar da íntima ligação de
Funes com o Brasil, a campanha governista acusa a Venezuela de ingerência. "Lula virou valor agregado. Não havia
espaço para criticar", diz o economista e analista político Roberto Rubio Fabián, do local
Funde (Fundação Nacional para o Desenvolvimento).
Questionado sobre o uso da
imagem de Chávez, Rodrigo
Ávila, engenheiro e ex-diretor
da polícia, não titubeou: "A verdade é dura. Foi Chávez quem
disse que queria incluir El Salvador na Pátria Grande Bolivariana". O candidato prometeu
construir a "nova direita".
Para Rubio, Funes não foi suficientemente claro ao marcar
distância do venezuelano, sob
risco de criar arestas na ala radical da FMLN. "O problema é
que ele precisava de um discurso moderado para o eleitorado
e um outro tom para dentro."
Fator EUA e votação
Os governistas não puderam
contar com o apoio explícito da
Casa Branca como em 2004, na
eleição de Antonio Saca. À época, na tradição da Guerra Fria, o
Departamento de Estado do
governo Bush disse que uma vitória da esquerda atrapalharia
as relações com Washington.
Estavam à frente da ofensiva
americana pró-Arena Otto
Reich e Roger Noriega, que antes trabalharam no governo
Reagan (1981-1989), quando os
EUA deram assessoria antiguerrilha ao Exército salvadorenho e apoio encoberto aos esquadrões da morte.
Um terço da população salvadorenha vive nos EUA, e 18%
do PIB vem de remessas dos
imigrantes. Os americanos são
os principais consumidores das
exportações do país, onde quase metade da população vive
abaixo da linha de pobreza. O
dólar é usado como moeda local desde 2001.
Desta vez, 46 congressistas
republicanos dos EUA até que
tentaram. O grupo enviou carta
a Barack Obama e a Hillary
Clinton alertando para "os riscos" de uma vitória da FMLN.
Mas o Departamento de Estado
disse que trabalhará bem com
quem ganhar.
A votação de hoje em El Salvador deve acontecer num clima tenso, dadas as denúncias
de tentativa de fraude feitas pela esquerda e as idiossincrasias
do sistema eleitoral -o país,
um pouco maior que Sergipe,
tem 4,2 milhões de eleitores.
A autoridade eleitoral é formada por indicados dos partidos, com maioria da direita. O
registro eleitoral é por ordem
alfabética, o que obriga eleitores a se deslocarem -e o transporte de eleitores não é crime.
Observadores europeus apontaram uso da máquina do Estado e da mídia em favor de Ávila.
Rubio Fabián teme uma
guerra de impugnações de urnas na apuração. "Se Funes
perder por poucos votos, será
difícil para a FMLN aceitar."
Folha Online
Leia a entrevista com
Funes (Ávila não atendeu
aos pedidos da Folha)
www.folha.com.br/090729
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