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No exílio, Aristide fala em "golpe" e denuncia "genocídio"
FABIENNE POMPEY
DO "LE MONDE", EM JOHANNESBURGO
Jean-Bertrand Aristide não me
recebe em sua casa. O endereço da
residência que ele ocupa em Pretória com a mulher, Mildred, e os
dois filhos é segredo. Para reuniões, o governo sul-africano colocou à sua disposição uma casa
numa avenida elegante de Pretória. Desde que chegou à África do
Sul, o ex-presidente haitiano se
dedica a escrever um livro no qual
pretende relatar seu "seqüestro".
Para ele, não existe qualquer dúvida de que "os responsáveis pelo
golpe de Estado de 29 de fevereiro
foram a França e os Estados Unidos. Aquilo que vem acontecendo
entre nós no momento, o massacre ininterrupto de inocentes, a
repressão cega, a violência, o sangue, tudo isso serve apenas para
confirmar minhas primeiras declarações", afirma ele, chegando a
falar em "genocídio".
Sua convicção é inabalável: passados 200 anos da independência,
a França persiste em desestabilizar o Haiti. A antiga metrópole
"organizou 53 golpes de Estado",
com o objetivo de "impedir que
um país de negros se tornasse
uma referência de liberdade".
Para ele, é uma questão de "puro racismo". Os EUA e a França se
aliaram, milhões de dólares foram
despendidos para armar "bandidos, traficantes de drogas, que,
hoje, semeiam o terror nas ruas de
Porto Príncipe", declara.
Quando relembrado de que foram os EUA que lhe permitiram
retomar o poder, em 1994, ele
menciona a metáfora do "pai e filho", insinuando que Bill Clinton
tinha política bem diferente da
adotada pelos dois Bushes. E,
mesmo que não queira se pronunciar sobre as próximas eleições americanas, supõe que "o
povo haitiano teria mais simpatia
por um presidente democrata".
E, enquanto o mundo e os novos detentores do poder no Haiti
acusam seus partidários armados,
os "chimères" (quimeras), de recorrer à violência, Aristide denuncia nova manipulação. E
compara as acusações que lhe são
feitas ao caso das armas de destruição em massa no Iraque.
"Trata-se apenas de uma nova
mentira que estão brandindo para justificar seus crimes", insiste o
ex-presidente. "Nós sempre optamos pela não violência." No entanto foram os "chimères" que
atacaram o secretário de Estado
Renaud Muselier, alvo de fogo
cerrado quando visitou a capital
em agosto. "Fiquei chocado. Condeno todas as formas de violência,
venham de onde vierem", disse.
Para que o Haiti saia da crise, o
ex-presidente quer um diálogo
sob a égide das Nações Unidas.
Mas, acrescenta, "o diálogo não
pode incluir apenas os haitianos,
porque são os estrangeiros que
desejam ver o Haiti caindo de golpe de Estado em golpe de Estado".
Ele quer que a França e os EUA
participem do processo. "Propus
esse diálogo depois de chegar
aqui. Mas eles achavam que conseguiriam resolver o problema
pelas armas, e se deram mal."
"Fui eleito, e o povo que me elegeu clama pelo meu retorno",
afirma o ex-presidente. Enquanto
espera, Aristide foi convidado a se
tornar pesquisador honorário na
Universidade da África do Sul, em
Pretória. Está aprendendo o idioma zulu. Sua estadia, organizada
pelo governo sul-africano, parece
destinada a ser longa. Aristide
mantém a discrição e, mesmo que
participe de algumas cerimônias
públicas, como funerais, quase
conseguiu se fazer esquecer. Mas
a oposição e a imprensa sul-africanas questionam regularmente a
decisão de acolhê-lo no país.
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