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AMÉRICA LATINA
Relatório da Anistia Internacional diz que a violência contra a mulher aumentou sob Uribe; governo elogia estudo
Estupro vira arma de guerra na Colômbia
FABIANO MAISONNAVE
DA REDAÇÃO
Aos 15 anos, Sofia engravidou
ao ser estuprada por um paramilitar para quem trabalhava como
empregada doméstica. Seqüestrada pelas Farc (Forças Armadas
Revolucionárias da Colômbia), a
bacteriologista Rina Bolaño foi
violentada duas vezes no cativeiro. Já Inocência Pineda teve o marido morto por soldados do Exército e, em seguida, foi estuprada
na frente de seus quatro filhos.
Essas e outras histórias constam
do relatório da Anistia Internacional "Corpos Marcados, Crimes
Escondidos", divulgado nesta semana sobre a violência contra
mulheres no sangrento conflito
armado colombiano, que neste
ano completou 40 anos.
"Ao aterrorizar e explorar mulheres para fins militares, as forças
de segurança, os paramilitares
apoiados pelo Exército e a guerrilha têm transformado os corpos
de milhares de mulheres e crianças num campo de batalha", diz a
diretora da Anistia Susan Lee.
Segundo um informe da ONU
do ano passado, a violência contra
a mulher aumentou cerca de 20%
ano ano entre 2000 e 2002.
Para a Anistia, a atual política
do governo colombiano, que, sob
o presidente Álvaro Uribe, intensificou as ações militares, têm
contribuído para o aumento da
violência e da impunidade ao empurrar mais civis ao conflito.
Apenas no ano passado, segundo a Anistia, 220 mulheres foram
assassinadas por razões ligadas ao
conflito armado e outras 20 estão
desaparecidas -esse número
não inclui as que foram mortas
em combate. Desses casos, 5% estão ligados às forças de segurança,
26%, aos paramilitares, e 16%, às
guerrilhas. Não há informações
sobre os demais casos.
A falta de informação, aliás, é
um dos principais problemas para medir a extensão da violência
contra a mulher. Além dos motivos mais comuns, como a percepção de que se trata de um "problema privado", várias regiões da
Colômbia estão em poder dos
grupos armados ilegais, às quais o
Estado não tem acesso há anos ou
até mesmo décadas.
Punições contra mulheres
Em áreas sob controle paramilitar, são impostos "códigos de
conduta", que incluem proibir a
prostituição e o uso de piercings e
shorts curtos. As punições incluem estupro, mutilação sexual e
humilhação pública.
Há relatos de guerrilheiras das
Farc forçadas a abortar e de outras que são assassinadas por contrair Aids: "Enquanto uma mulher que é HIV positivo pode ser
fuzilada, os homens [HIV positivo] não são", afirma a Anistia.
O problema das famílias obrigadas a abandonar suas casas por
grupos armados também tem impacto grande entre as mulheres.
Segundo a ONU, a Colômbia tem
3 milhões de "desplazados", número inferior apenas aos do Sudão e da República Democrática
do Congo (ex-Zaire). Mais da metade dessa população é feminina.
Muitas delas tiveram seus maridos assassinados e foram obrigadas a deixar a área rural com filhos e sem levar nada além de roupas, alojando-se em favelas das
grandes cidades do país.
Levantamento do Ministério da
Proteção Social mostra que 36%
das "desplazadas" foram obrigadas a manter relações sexuais com
homens que desconheciam.
Também são comuns casos de
adolescentes seqüestradas por
grupos armados para serem combatentes, escravas sexuais ou para
realizar serviços domésticos.
Geralmente em pé de guerra
com a Anistia, o governo Uribe
surpreendeu ao elogiar o relatório
da ONG. "Estivemos olhando [o
relatório] num primeiro momento porque não tivemos tempo para estudá-lo em detalhe, mas acreditamos que tenha muitos elementos positivos sobre os quais
atuar", disse anteontem o vice-presidente Francisco Santos.
Em tempo: dos três casos que
abrem este texto, apenas os soldados foram detidos, mas fugiram.
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