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IRAQUE SOB TUTELA
Para diretor de centro de direitos humanos, xiitas estão praticando "limpeza étnica" na cidade
Ignorada pela ONU, Fallujah passa por crise humanitária
ESPECIAL PARA A FOLHA,
DE FALLUJAH
Havia um ano a cidade de Fallujah -situada a oeste da capital
iraquiana e um dos redutos da insurgência sunita- era submetida
a uma das mais devastadoras operações militares, denominada
"Fúria Fantasma", que deixou 36
mil moradias destruídas, além de
mais de 60 escolas e 65 mesquitas.
Muhamad Tareq al Darraji, diretor do Centro de Estudos de Democracia e Direitos Humanos de
Fallujah (CEDDH), estima que na
ofensiva americana de 2004 tenham sido assassinadas e feridas
entre 4.000 e 6.000 pessoas, em
sua maioria civis. Mas não existem cifras oficiais a esse respeito.
"Fallujah e Qaim estão passando por uma crise humanitária
sem precedentes", observa Al
Darraji, que também é coordenador da plataforma Rede de Observação dos Direitos Humanos no
Iraque. "Estas eleições não têm
validade sob a ocupação. Elas são
realizadas por imposição da agenda dos EUA, e muitas pessoas não
concordam com elas."
Uma parcela grande dos moradores da cidade, que não recebe
água potável, sofre cortes diários
de luz e enfrenta doenças diversas, não recebeu as indenizações
prometidas por Iyad Allawi, então
premiê provisório, que tinha o
respaldo dos EUA.
Pressionado pela embaixada
dos EUA, o atual premiê, Ibrahim
al Jaafari, concordou em levar
adiante o pagamento de compensação aos moradores de Fallujah
que perderam entes queridos ou
tiveram suas propriedades danificadas nos combates. "Mas agora
Jaafari interrompeu os pagamentos", diz Darraji. "O governo é
fantoche dos americanos."
Faltando pouco para o pleito,
Darraji denuncia: "Milhares de
pessoas estão sofrendo. As violações dos direitos humanos são
constantes e diárias. Como se pode querer que as pessoas apóiem
ou acreditem nesse "processo democrático" que é uma farsa?".
Mais de 300 mil pessoas tiveram
que deixar suas casas, o número
de desaparecidos oscila entre 500
e 1.000 pessoas, e o número de
deslocados chega a 100 mil.
Sem resposta da ONU -depois
de várias cartas enviadas a seu secretário-geral, Kofi Annan, denunciando as reiteradas violações
dos direitos humanos-, Darraji,
que foi um dos principais responsáveis pela divulgação da utilização de armas químicas durante o
ataque das forças americanas,
afirma que no Iraque está sendo
levada a cabo uma operação semelhante à limpeza étnica, tendo
como alvo os árabes sunitas.
"As operações militares são lançadas contra cidades sunitas, como Fallujah ou Qaim, não em Najaf", diz. "Existe uma intencionalidade, um objetivo concreto." A
maioria dos habitantes de Fallujah pratica a vertente sunita do islamismo, e a maior parte do Exército iraquiano na cidade é formada pelos milicianos da xiita Organização Badr e da organização
curda Peshmerga.
As denúncias de tratamentos
brutais e humilhantes impostos
aos moradores da cidade, as valas
comuns escavadas no perímetro
urbano, nas quais já foram localizados mais de 400 corpos, e as detenções arbitrárias feitas na cidade, além dos casos de tortura, são
moeda corrente em Fallujah.
Enquanto a segurança continua
um problema na cidade, já que os
combates são diários, a saúde da
população foi seriamente afetada
pelo uso de bombas de fósforo
branco -que os EUA dizem servir para facilitar a identificação
dos insurgentes, fazendo-os brilhar, mas que os habitantes afirmam ter atingido civis.
"Foram detectados novos casos
de câncer, sobretudo em crianças
e pessoas que permaneceram em
Fallujah durante o ataque. É provável que elas tenham recebido altas doses de radiação, mas nossa
capacidade hospitalar está saturada", denuncia Darraji.
Longe da tão propalada pacificação de Fallujah, Darraji observa
que, no Iraque, está sendo cometido um crime contra toda a humanidade, enquanto a situação
vigente alimenta o ódio entre seus
habitantes.
(KAREN MARÓN)
Tradução de Clara Allain
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