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EUROPA
Para Noëlle Lenoir, negociação será difícil e faltará dinheiro para financiar o desenvolvimento dos novos membros
Se existir, acordo será ruim para UE, afirma ex-ministra francesa
MÁRCIO SENNE DE MORAES
DA REDAÇÃO
Se vier a ser fechado, o acordo
sobre o Orçamento da União Européia será deletério para o futuro
do bloco, já que implicará forte
redução do montante destinado
aos dez novos países-membros.
A afirmação é de Noëlle Lenoir,
que foi ministra para Assuntos
Europeus da França de 2002 a
2004 e é, atualmente, conselheira
jurídica num dos mais reputados
escritórios de advocacia de Paris.
Folha - Haverá um acordo orçamentário na cúpula da UE?
Noëlle Lenoir - É possível que haja um acordo entre os 25 países-membros por conta da pressão
exercida pelos líderes das maiores
potências sobre os Estados menos
abastados, porém essa solução de
compromisso não será favorável
para o futuro do bloco.
Afinal, ela implicará forte redução do Orçamento, o que forçará
uma diminuição dos créditos a
que terão direito os dez novos países-membros. Estes são mais pobres e precisam de mais apoio para que possam chegar ao patamar
dos outros. A solução não permitirá que cheguemos a um acordo
verdadeiro sobre o que deve ser o
Orçamento a médio e longo prazos nem sobre como novas iniciativas deverão ser financiadas.
Não podemos esquecer que a
UE ainda não sabe como financiará sua política externa e de segurança, seus projetos de alta tecnologia destinados a dar mais competitividade aos Estados europeus
ou seus programas de melhora da
infra-estrutura, como o do transporte viário ou o do ferroviário.
Isso sem mencionar a luta contra
o terrorismo ou o trabalho de harmonização das informações dos
serviços secretos nacionais.
Infelizmente, o próximo Orçamento europeu cobrirá o período
entre 2007 e 2013, o que significa
que não teremos outra possibilidade de resolver as questões que
citei anteriormente antes da próxima década. Isso é insuficiente
para as aspirações daqueles que
pretendem ver uma Europa coesa
e ativa em todas as áreas.
Ou seja, a possível solução de
compromisso não permitirá que
as populações nacionais percebam a importância da Europa
nem lhes passará a mensagem de
que seus líderes desejam realmente que a UE continue a avançar.
Trata-se de um paradoxo, pois,
atualmente, entre 60% e 70% das
leis nacionais são de inspiração
européia ou diretamente a aplicação do direito europeu. Mas o Orçamento é de pouco mais de 1%
do PIB. Há, portanto, um problema, já que o Orçamento da França, por exemplo, gira em torno de
45% do total de suas riquezas.
Cada vez mais, as regras são estabelecidas em Bruxelas, todavia
muito pouco é transferido aos
países-membros para lhes proporcionar uma margem de manobra razoável, o que gera dúvidas na população e agrava a crise
que vivemos desde que, em meados deste ano, franceses e holandeses rejeitaram a Constituição
da UE em referendo.
É uma pena que não utilizemos
essa crise para resolver os verdadeiros problemas do bloco, como
seu modo de financiamento. Deveremos, cedo ou tarde, chegar à
conclusão de que ele deverá ser
realizado por meio de recursos
fiscais, não de esmolas provenientes dos Estados. Uma parte dos
impostos que incidem sobre as
empresas poderia ser repassada à
Europa. Esta só poderá se aprofundar se houver um elo real entre
seus cidadãos e suas instituições.
Folha - As populações européias
já são suficientemente maduras
para que aceitem essa mudança?
Lenoir - Creio muito na vontade
política. Afinal, nem todas as decisões importantes têm absolutamente de passar pelo crivo popular. Os franceses não eram suficientemente maduros para fazer a
paz com os alemães nos anos 50,
mas, mesmo assim, isso ocorreu e
foi benéfico para ambas as partes.
Na década de 90, quando [o ex-chanceler alemão] Helmut Kohl
[1982-98] admitiu abandonar o
marco em benefício de uma moeda única para atenuar as preocupações francesas com a reunificação alemã, sua população também não apoiou essa decisão.
Ora, há momentos na história européia e na da humanidade em
geral em que a vontade política de
líderes de visão deve prevalecer.
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