São Paulo, domingo, 16 de maio de 2004

Texto Anterior | Próximo Texto | Índice

A FAVOR

"Choque" reduziu fosso, diz historiador

DA REPORTAGEM LOCAL

Terry Anderson é professor de história contemporânea americana numa universidade do Texas. Acredita que a ação afirmativa tenha defeitos, mas a considera necessária. Leia trechos de sua entrevista. (JBN)

Folha - A decisão da Suprema Corte de junho do ano passado comprometeu a ação afirmativa?
Terry Anderson -
Segundo a decisão, as universidades têm o direito de utilizar critérios étnicos para diversificar seus corpos docentes. O que a Suprema Corte negou foi a possibilidade de, mesmo indiretamente, estipular-se cotas. Na Universidade de Michigan, estudantes da maioria branca não tinham nenhuma vantagem inicial dentro do sistema de pontuação, que funciona como vestibular.

Folha - A população negra americana está hoje melhor só por causa da ação afirmativa?
Anderson -
Sem a ação afirmativa, ela estaria muito pior do que está. A ação afirmativa complementou a legislação sobre direitos civis aprovada nos anos 60. Em muitos Estados não havia negros policiais, negros no corpo de bombeiros.

Folha - Uma boa lei de direitos civis não seria suficiente para a promoção da população negra?
Anderson -
O que os partidários da ação afirmativa sempre disseram é que o fosso educacional e econômico entre as comunidades branca e negra era tão grande que apenas um "choque" poderia diminuí-lo. Poucos negros entravam nas universidades. Mesmo o sistema de ensino secundário era discriminatório, com boas escolas nos bairros brancos e escolas ruins nos bairros negros.

Folha - Por que não funcionou o sistema de "busing" [transferência por ônibus de crianças e adolescentes a escolas de outros bairros]?
Anderson -
A medida foi adotada em 1974. Mas uma decisão posterior da Corte Suprema disse que crianças poderiam ser transportadas apenas para escolas de dentro do mesmo distrito.

Folha - No Brasil, já houve uma tentativa, no Rio, de cotas para a população negra.
Anderson -
Nos Estados Unidos, o sistema de cotas foi considerado inconstitucional. O que hoje existe é um sistema de "preferência". Entre os muitos critérios que permitem o acesso à universidade, o fato de pertencer a uma minoria seria apenas mais um deles. Não se entra na universidade somente por ser negro. Mas a questão racial é levada em conta em muitas universidades.

Folha - Não há um choque com o critério do mérito?
Anderson -
Sim, mas isso é relativizado porque as universidades montaram mecanismos para detectar, já nas escolas secundárias, alunos de minorias étnicas que sejam os mais capacitados.

Folha - Qual a desvantagem da ação afirmativa?
Anderson -
Basicamente, as tensões que ela gera, em períodos nos quais a economia cresce pouco e há poucas oportunidades para todo mundo. Quando o crescimento é maior, a tensão diminui. E há o fato de também, por exemplo, um estudante que não pertence a uma minoria ficar desapontado porque não conseguiu matrícula em determinada universidade.


Texto Anterior: Sociedade: Livro de negro americano condena cotas
Próximo Texto: Contra: Ações provocaram violência, diz autor
Índice



Copyright Empresa Folha da Manhã S/A. Todos os direitos reservados. É proibida a reprodução do conteúdo desta página em qualquer meio de comunicação, eletrônico ou impresso, sem autorização escrita da Folhapress.