|
Texto Anterior | Próximo Texto | Índice
Cidade governada por direitista é oásis da elite
CÍNTIA CARDOSO
COLABORAÇÃO PARA A FOLHA, DE PARIS
Governada por Nicolas Sarkozy por quase duas décadas,
Neuilly-sur-Seine, cidade ao
oeste de Paris, é uma espécie de
tubo de ensaio do projeto para a
França do presidente que assume o cargo hoje.
Como prefeito desse pequeno e rico município, Sarkozy
conseguiu imprimir o seu estilo
de governo: política fiscal
agressiva para atrair grandes
companhias e estimular as pequenas empresas, manutenção
de um elevado padrão de vida e
uma paisagem urbana chique
com demografia controlada.
Em Neuilly, os prédios não
podem ultrapassar seis andares, o tráfego flui silencioso e as
madames passeiam com seus
cachorrinhos em bolsas de grife
em meio a jardins de ervas aromáticas, lavandas e orquídeas.
À frente da Prefeitura entre
1983 e 2002, Sarkozy se encarregou pessoalmente de vários
projetos de reurbanização da
cidade. "Além da economia,
uma das principais contribuições de Sarkozy foi para a preocupação com o embelezamento
da cidade. Ele realizou obras
inovadoras, como o complexo
esportivo, sem alterar a harmonia arquitetônica de Neuilly",
diz Antoine Masson, diretor do
gabinete do prefeito.
Quanto à imigração, um tema de sua campanha, a proporção de estrangeiros se aproxima da média nacional, cerca de
10% dos 60 mil habitantes da
cidade. A diferença é que a
maioria desses imigrantes pertence a corpos diplomáticos ou
a altos quadros executivos.
Outros indicadores da cidade
também a colocam acima do
resto do país. Enquanto a França enfrenta a fuga de empresas
em alguns setores, Neuilly atrai
companhias do segmento de
serviços e do setor de luxo. A dívida pública do departamento
de Hauts-de-Seine, do qual a cidade faz parte, representa cerca de 15% do seu PIB. Já na
França o endividamento chega
a 60% do PIB nacional.
No caso da renda, dados do
Insee (órgão responsável pelas
estatísticas oficiais) mostram
que metade dos habitantes de
Neuilly declarou renda anual
de 33 mil. A média da França
metropolitana é de 13,9 mil.
Esse poder aquisitivo permite que 44% dos habitantes tenham casa própria num dos
mercados imobiliários mais caros do país. No bairro de Île de
la Jatte, onde Sarkozy tinha um
apartamento, o metro quadrado custa 8.000. Apesar do
preço, o prédio de dois andares
com uma varanda de vidro fumê seria considerado austero
em comparação com os prédios
dos bairros caros de São Paulo.
Críticas sociais
Neuilly sempre teve governos de direita de tradição gaullista. No segundo turno, Sarkozy teve ali 86,8% dos votos.
No entanto o bom desempenho econômico da cidade nos
últimos anos não evita as críticas dos que consideram a sua
administração voltada exclusivamente para os ricos.
Neuilly planeja a construção
de um túnel para abafar os ruídos e a poluição da avenida de
maior circulação da cidade. Em
cima do túnel, projeta-se a instalação de jardins suspensos
como área de lazer. A obra está
orçada em 1 bilhão e é fortemente criticada pelos partidos
de esquerda, sobretudo porque
os recursos para o projeto devem vir do governo federal.
Outra polêmica é a questão
das moradias populares. Pela
lei francesa, os governos devem
destinar 20% das habitações
para os mais pobres. Dados da
Fundação Abbée Pierre indicam que, em Neuilly, esse percentual é de 1,34%, um dos 15
piores desempenhos do país.
"A maioria dessas cidades não
teve uma política real de moradia social, foram governadas
pela UMP [partido de Sarkozy]
ou pela UDF [partido de centro]. Há 20 anos, os eleitos locais rejeitam essa responsabilidade social", diz o Observatório
das Desigualdades.
O diretor do gabinete da prefeitura de Neuilly contesta o
dado e a crítica. "Temos 3,5%
de moradias sociais. Não é má
vontade política. É uma questão de limitação física. A cidade
está totalmente urbanizada, e
não temos dinheiro para comprar os imóveis já existentes e
transformá-los em casas populares", argumenta Masson.
Texto Anterior: Sarkozy toma posse hoje como presidente francês Próximo Texto: Sérvia: Parlamento aprova coalizão de moderados Índice
|