São Paulo, quarta-feira, 16 de maio de 2007

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Cidade governada por direitista é oásis da elite

CÍNTIA CARDOSO
COLABORAÇÃO PARA A FOLHA, DE PARIS

Governada por Nicolas Sarkozy por quase duas décadas, Neuilly-sur-Seine, cidade ao oeste de Paris, é uma espécie de tubo de ensaio do projeto para a França do presidente que assume o cargo hoje.
Como prefeito desse pequeno e rico município, Sarkozy conseguiu imprimir o seu estilo de governo: política fiscal agressiva para atrair grandes companhias e estimular as pequenas empresas, manutenção de um elevado padrão de vida e uma paisagem urbana chique com demografia controlada.
Em Neuilly, os prédios não podem ultrapassar seis andares, o tráfego flui silencioso e as madames passeiam com seus cachorrinhos em bolsas de grife em meio a jardins de ervas aromáticas, lavandas e orquídeas. À frente da Prefeitura entre 1983 e 2002, Sarkozy se encarregou pessoalmente de vários projetos de reurbanização da cidade. "Além da economia, uma das principais contribuições de Sarkozy foi para a preocupação com o embelezamento da cidade. Ele realizou obras inovadoras, como o complexo esportivo, sem alterar a harmonia arquitetônica de Neuilly", diz Antoine Masson, diretor do gabinete do prefeito.
Quanto à imigração, um tema de sua campanha, a proporção de estrangeiros se aproxima da média nacional, cerca de 10% dos 60 mil habitantes da cidade. A diferença é que a maioria desses imigrantes pertence a corpos diplomáticos ou a altos quadros executivos.
Outros indicadores da cidade também a colocam acima do resto do país. Enquanto a França enfrenta a fuga de empresas em alguns setores, Neuilly atrai companhias do segmento de serviços e do setor de luxo. A dívida pública do departamento de Hauts-de-Seine, do qual a cidade faz parte, representa cerca de 15% do seu PIB. Já na França o endividamento chega a 60% do PIB nacional.
No caso da renda, dados do Insee (órgão responsável pelas estatísticas oficiais) mostram que metade dos habitantes de Neuilly declarou renda anual de 33 mil. A média da França metropolitana é de 13,9 mil.
Esse poder aquisitivo permite que 44% dos habitantes tenham casa própria num dos mercados imobiliários mais caros do país. No bairro de Île de la Jatte, onde Sarkozy tinha um apartamento, o metro quadrado custa 8.000. Apesar do preço, o prédio de dois andares com uma varanda de vidro fumê seria considerado austero em comparação com os prédios dos bairros caros de São Paulo.

Críticas sociais
Neuilly sempre teve governos de direita de tradição gaullista. No segundo turno, Sarkozy teve ali 86,8% dos votos.
No entanto o bom desempenho econômico da cidade nos últimos anos não evita as críticas dos que consideram a sua administração voltada exclusivamente para os ricos.
Neuilly planeja a construção de um túnel para abafar os ruídos e a poluição da avenida de maior circulação da cidade. Em cima do túnel, projeta-se a instalação de jardins suspensos como área de lazer. A obra está orçada em 1 bilhão e é fortemente criticada pelos partidos de esquerda, sobretudo porque os recursos para o projeto devem vir do governo federal.
Outra polêmica é a questão das moradias populares. Pela lei francesa, os governos devem destinar 20% das habitações para os mais pobres. Dados da Fundação Abbée Pierre indicam que, em Neuilly, esse percentual é de 1,34%, um dos 15 piores desempenhos do país. "A maioria dessas cidades não teve uma política real de moradia social, foram governadas pela UMP [partido de Sarkozy] ou pela UDF [partido de centro]. Há 20 anos, os eleitos locais rejeitam essa responsabilidade social", diz o Observatório das Desigualdades.
O diretor do gabinete da prefeitura de Neuilly contesta o dado e a crítica. "Temos 3,5% de moradias sociais. Não é má vontade política. É uma questão de limitação física. A cidade está totalmente urbanizada, e não temos dinheiro para comprar os imóveis já existentes e transformá-los em casas populares", argumenta Masson.


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