São Paulo, sábado, 16 de outubro de 2004

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Força brasileira enfrenta pesadelo em favela do Haiti

RICARDO BONALUME NETO
DA REPORTAGEM LOCAL

Os militares brasileiros estão enfrentando, nas favelas do Haiti, o pesadelo que não queriam enfrentar nas cariocas: gangues organizadas e ligadas ao narcotráfico.
Lidar com elas é difícil e envolve um trabalho mais policial do que militar, algo que os militares brasileiros costumam afirmar que não seria sua função principal.
Mas, no Haiti, a situação é ainda mais complicada, pois existe um delicado aspecto político-diplomático permeando tudo. As gangues foram aliciadas pelo ex-presidente Jean-Bertrand Aristide para intimidar seus opositores políticos.
Os "quimeras" teriam até armas como fuzis automáticos e submetralhadoras graças à sua ligação com narcotraficantes, principalmente colombianos. Alguns estariam até mais bem armados do que o dissolvido Exército local, outra fonte de tensão.
Há uma diferença vital entre agir em casa e em um outro país soberano. No Brasil, o número de militares, o equipamento e as ações nas favelas estariam sob controle direto das Forças Armadas, com apoio da polícia, como já ocorreu em ações no Rio.
No Haiti, os brasileiros estão sob jurisdição da ONU e não há como reforçá-los rapidamente, pois o efetivo dos "capacetes azuis" depende de negociações diplomáticas. Hoje não há nem metade do contingente previsto -cerca de 3.000 homens dos 6.700 militares (e 1.622 policiais) autorizados para cuidar de um país de 8 milhões de pessoas.
Mesmo as forças da ONU têm uma clara separação de funções entre o contingente militar e o policial. Os soldados internacionais não têm o chamado "poder de polícia".
Os militares devem dar apoio aos policiais civis internacionais, cuja função é assessorar a, por ora, pouco eficiente polícia local. Por exemplo, quando um bloqueio de estrada detecta alguém com uma arma ilegal ou drogas, quem deve fazer a prisão é a polícia local.
O uso da força é regido por regras rígidas. Quando uma força internacional fez intervenção no Haiti no começo do ano, ela fazia uma missão de "imposição da paz" e podia atirar com mais desenvoltura. Agora existe uma missão de "manutenção da paz", e apertar o gatilho tem mais restrições.
Os militares da ONU costumam ser empregados como uma força neutra entre dois beligerantes. Os dois lados são Exércitos nacionais ou podem ser um Exército e uma força guerrilheira. No Haiti, não há "beligerantes" tradicionais, mas o que os militares chamam de forças "irregulares". Isso torna bem difícil "pacificar" o país.


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