São Paulo, domingo, 17 de fevereiro de 2008

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Ataque mata 37 na véspera de eleição paquistanesa

Explosão atinge escritório eleitoral e reacende temores de uma série de atentados

Eleições legislativas de amanhã são tidas como as mais importantes desde 1970; sustentação do regime é questionada

DO ENVIADO ESPECIAL

Pelo menos 37 pessoas morreram ontem em um atentado contra um escritório eleitoral do PPP (Partido do Povo Paquistanês), naquilo que o governo teme possa vir a ser uma série de ataques visando desestabilizar a eleição parlamentar de amanhã.
A explosão, que segundo o Ministério do Interior foi provocada por um carro-bomba, ocorreu na cidade de Parachinar (norte do país). Haveria, segundo a TV paquistanesa Dawn, pelo menos 50 feridos.
A região é conhecida pela atividade de extremistas islâmicos, que vêm boicotando o pleito e que são acusados pelo governo pelo assassinato da ex-premiê Benazir Bhutto, em dezembro. O partido de Benazir, contudo, lança suspeitas sobre agências do próprio governo.
Foi o primeiro grande ataque em uma semana. Antes, dois atentados haviam deixado 35 mortos entre o sábado retrasado e a segunda-feira.
Descrito com certa propriedade pela revista "The Economist" como o "lugar mais perigoso do mundo", o Paquistão realizará as eleições parlamentares mais importantes e temerárias desde 1970.
Naquele ano, a disputa feroz entre um partido político do então Paquistão Oriental e o PPP, dos Bhutto, majoritário no território ocidental, levou a uma crise que culminou na independência de Bangladesh no ano seguinte.
Só que desta vez a situação é ainda mais complexa. O Paquistão tornou-se um colosso islâmico com 160 milhões de pessoas, metade delas com menos de 18 anos e um quarto na miséria. Infectado pelo vírus do extremismo, que se mescla com aspirações de soberania legítimas, o país de quebra tem que salvaguardar pelo menos 50 ogivas nucleares.
A chave da situação está com Pervez Musharraf, 64. General e comandante da Forças Armadas, teve de deixar o posto para permanecer apenas como presidente do país, ditador para seus críticos -embora o Paquistão não seja uma ditadura clássica por haver elementos como imprensa relativamente livre e oposição organizada.
Para analistas da cena política paquistanesa ouvidos pela Folha, a eleição é uma derrota para Musharraf em si própria. "É uma situação de perder ou perder. Ou ele manipula resultados e aí enfrentará uma explosão nas ruas e críticas do exterior ou deixa a oposição ganhar livremente e se vê ameaçado de impeachment ou ingovernabilidade", diz o general da reserva Talaat Massud.
A rigor, o Paquistão nunca deixou de estar em crise desde sua criação, em 1947. O próprio Musharraf chegou ao poder em 1999 após um golpe.
A situação de crise atual recrudesceu a partir do ano passado, quando Musharraf interveio no Judiciário e afastou a cúpula da Suprema Corte, colocando aliados em seu lugar. Isso levou a uma quebra de confiança da classe média que recebe hoje metade da renda familiar no país devido ao crescimento econômico recente.
Isso, aliado a uma crise de abastecimento de energia e produção do trigo básico na mesa dos paquistaneses mais pobres, criou o caldo para protestos em massa e o subseqüente endurecimento do regime, em novembro.
A partir daí, as coisas só pioraram. Instado pelos EUA, país ao qual se aliou como linha de frente contra o Taleban após o 11 de Setembro, transformou áreas tribais de seu país em zonas de guerra na caça a extremistas islâmicos, algo impopular no país.
Mas o Exército ainda estava com Musharraf, ainda que ele tenha tido que deixar a farda. Estava, porque nesta semana o novo comandante, general Pervaiz Kayani, ordenou a retirada de todos os oficiais comissionados em postos de administração civil. Embora nada indique que Musharraf "perdeu" o Exército, claramente está enfraquecido.
Pressionado pelos EUA, Musharraf teve de aceitar a volta de dois líderes da oposição exilados, Benazir e o seu arquiinimigo Nawaz Sharif (PML-N). Tudo caminhava para um acordo quando Benazir foi morta.
As eleições de 8 de janeiro foram transferidas para amanhã. Os atentados são a grande preocupação do governo, que deslocou 81 mil homens do Exército e 47 mil paramilitares para tentar garantir a segurança no país. Mais de mil pessoas foram detidas nos dois últimos dias no país. Em cidades principais, como Islamabad, há bloqueios e patrulhas armadas. A campanha acabou ontem. (IG)


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