São Paulo, quinta-feira, 17 de março de 2011

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SOS decasséguis

Brasileiros retirados da área mais afetada pelo terremoto no Japão contam como sobreviveram; Folha acompanha trajeto de 27 pessoas em ônibus fretados pela embaixada em Tóquio

FABIANO MAISONNAVE
ENVIADO ESPECIAL A SENDAI E TÓQUIO

Na sexta-feira, às 14h37, a família Sato desembarcou na estação de Sendai após uma longa maratona desde Curitiba (PR). O trem rápido vindo de Tóquio era a última etapa para visitar o médico Douglas, sua mulher, Marina, e a filha de seis anos. Às 14h46, os recém-chegados buscavam ainda o ponto de encontro quando a terra tremeu.
"No começo, pensamos que era por causa de um trem", lembrou ontem o engenheiro Roberto Hirama, 31, cunhado de Douglas, que viajou ao Japão com a mulher, Ângela, e os sogros, Jorge e Fusae. "Mas logo ficou tão forte que as placas do teto começaram a cair e não conseguíamos ficar de pé."
Depois de cinco intermináveis minutos, os quatro saíram pela porta de emergência, onde finalmente encontraram Marina e a criança -Douglas estava no hospital universitário, onde faz especialização. Eles abandonaram o carro e andaram por 45 minutos até o apartamento.
Os cinco dias seguintes foram de privação. Nas primeiras 48 horas, não havia luz, água ou gás; telefone, só celular. Para comprar alimentos racionados, filas de três horas. Água, só para cozinha e higiene: a sede era saciada com sucos e refrigerantes.
Sem perspectiva de melhora e sob a ameaça de um acidente nuclear na usina de Fukushima 1, os sete paranaenses embarcaram ontem com outros 20 brasileiros em dois micro-ônibus fretados pela embaixada em Tóquio.
O grupo incluía a Folha, presa desde anteontem na região após a van em que viajava ter ficado sem gasolina. O motorista Carlos Tamari acabou se revezando na direção em parte da viagem.
Comandado pelo empresário decasségui Walter Saito, o comboio chegou a Sendai após uma viagem de dez horas e 350 km, boa parte feita de noite e sob nevasca.
Graças a uma autorização do governo japonês, foi possível usar a autopista e abastecer nos poucos postos com combustível.
Treze brasileiros que haviam se inscrito na embaixada brasileira desistiram da viagem. Com isso, houve espaço para cinco de Bangladesh, incluindo um bebê de três meses.

VOLTA
Na viagem de volta, houve mais duas paradas para recolher brasileiros. Em Koyiama, esperava apenas o operário Luciano Sonoda, 34. Nervoso e ofegante, ele havia chegado 20 minutos antes ao local de encontro, dirigindo já quase sem combustível.
Funcionário de uma fábrica da Citizen, Sonoda mora a 30 km da Fukushima 1, área onde o governo recomenda que as pessoas permaneçam dentro de casa por causa do risco de contaminação.
"As pessoas vão morrer ou de radiação ou de estresse", disse Sonoda, ao contar como está a região. "Salvaram a minha vida."
Segundo Sonoda, existe muita desconfiança com as informações dadas pelo governo, provocando um grande êxodo. "Quem tem gasolina no carro está saindo, mas a maioria está presa. Muitos esperam pelo pior."
Como não havia banheiro ou comida nos ônibus, houve várias paradas pelo caminho, onde era possível comprar chocolate, biscoito e bolinhos tradicionais.
Numa delas, o médico Douglas comprou um pequeno fogão elétrico, para cozinhar no alojamento providenciado pela embaixada.
O comboio chegou a Saitama, na região metropolitana de Tóquio, após oito horas de estrada, boa parte sob neve. Muitos foram para a casa de parentes.
Como a estrada está longe do litoral devastado pelo tsunami, não havia sinais de destruição no caminho, com a exceção de pequenos e raros desníveis, parcialmente consertados.
Sonoda disse que se alojaria numa casa da irmã. Douglas, que vive e trabalha na região de Sendai deixada intacta pelo tsunami, pretende voltar para a especialização assim que puder. Seus pais ainda não decidiram se antecipam a volta ao Brasil, marcada para o dia 30, ou se passeiam pelo sul do Japão.


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