|
Texto Anterior | Próximo Texto | Índice
Casar por dinheiro é febre em Portugal
Número de matrimônios com estrangeiros no país duplicou de 2000 a 2004; são, na maioria, uniões com brasileiras
Dificuldades econômicas de um lado e obtenção da cidadania européia de outro estimulam as uniões de conveniência, ilegais no país
VITORINO CORAGEM
COLABORAÇÃO PARA A FOLHA, DE LISBOA
Antônio (nome fictício) tem
33 anos e se casou há dois anos
com uma imigrante brasileira,
por 3.000. Por sua vez, sua irmã Joana (nome fictício), 22,
recebeu 1.000 a menos para
ser desposar um homem que
chegou a Portugal há uma semana.
"Ele está a viver na nossa casa até que consiga uma casa para si. Nós combinamos todos os
pormenores pela internet.
Neste momento estou desempregada e, além de ajudar alguém que precisa do passaporte da União Européia, recebo
algum dinheiro", conta ela.
Apesar de saberem que um
casamento por conveniência
pode levar a uma pena de prisão de um a quatro anos, eles
consideram muito difícil provar que se trata de um negócio.
"Como podem provar, se formos discretos, que é um casamento desse tipo, e não por
amor? O mais curioso foi que
cheguei a me apaixonar mesmo
por ela e acabamos ficando juntos. As mulheres brasileiras são
mais alegres e divertidas do
que as portuguesas", afirma
Antônio.
Segundo dados fornecidos
pelos Serviços de Estrangeiros
e Fronteiras (SEF), o número
de casamentos de portugueses
com estrangeiros duplicou de
2000 a 2004, passando de
1.698 para 3.540. São na maioria uniões com brasileiras -foram registrados 271 casamentos em 2000, subindo para
1.165 quatro anos depois.
Os brasileiros também se casam cada vez mais com portuguesas. Esses casamentos quase triplicaram, tendo passado
de 126 para 351 nesse período.
Autorização
Um estrangeiro que se case
com um português obtém automaticamente a autorização de
residência e pode pedir a nacionalidade ao fim de três anos, daí
que os casamentos por conveniência sejam um dos temas
mais discutidos em Portugal.
"Não acredito que eu possa
vir a ser presa. Nós trocamos
correspondência e tiramos
muitas fotografias onde aparecemos a nos beijar", brinca Teresa (nome fictício), 40. Ela
sempre viveu em Setúbal e,
desde que se divorciou, há cinco anos, sua situação financeira
se agravou. "Como tenho algumas amigas brasileiras, elas me
perguntaram se estaria interessada em receber dinheiro em
troca de um casamento com
um familiar ou amigo", conta.
Teresa diz que a primeira
proposta que recebeu foi por
pouco dinheiro. "Uns meses
depois surgiu outra oportunidade, em que ofereciam o dobro, e aceitei logo."
No entanto nem sempre o
negócio corre como se espera.
João (nome fictício) se casou e
viveu na mesma casa com uma
brasileira durante cinco anos.
Estabeleceram uma relação de
mera amizade, uma vez que ele
é homossexual. Ao fim desse
tempo, ela pediu o divórcio,
com a divisão de bens.
Por outro lado, o SEF e as polícias de diferentes países trocam informações para descobrir mulheres que se arriscam a
viajar para outro país sem conhecer a língua e o local para
onde vão. Ocultando a viagem
da família, muitas vezes desaparecem ou caem nas mãos de
traficantes de seres humanos.
A pesquisadora italiana Marzia Grassi, do Instituto de Ciências Sociais da Universidade de
Lisboa, considera que os chamados "casamentos brancos"
estão florescendo um pouco
por toda a Europa.
"Essas redes transacionais
servem-se das mulheres mais
pobres, que, devido à sua fragilidade, à falta de apoio familiar
e à fraca inserção na sociedade,
são recrutadas para casar com
estrangeiros", afirma Grassi.
Considera ainda que Portugal é mais aberto a esse fenômeno, pois tem uma sociedade
mais multicultural do que o
resto da Europa.
Agenciamento
Freqüentemente a organização dos casamentos por conveniência é feita por agências matrimoniais. No entanto seus
responsáveis negam qualquer
envolvimento.
A internet é a grande concorrente nesse mercado. Sites especializados em promover encontros ou mesmos os chats
são a forma mais rápida de as
pessoas se contatarem e promoverem casamentos brancos.
A Amoravista.com.br é uma
agência matrimonial que se diz
especializada em casamentos
entre portugueses e brasileiras.
No que diz respeito a organizações com sede em Portugal, a
agência Raisa é uma das mais
conhecidas e citadas no estudo
de Grassi.
Sua proprietária, Raisa, afirma que o seu público-alvo continua a ser os homens portugueses, brasileiras e mulheres
do Leste Europeu. A agência já
contatou mais de mil pessoas,
tendo proporcionado mais de
110 casamentos.
Apesar do risco, para muitos
os casamentos por conveniência são a única saída para viver
o sonho europeu.
Texto Anterior: Bolívia: Oposição e governo se enfrentam Próximo Texto: Artigo: Missão do sucessor de Kofi Annan é completar reforma das Nações Unidas Índice
|