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ORIENTE MÉDIO
Para Vanunu, que denunciou o programa nuclear israelense, palestinos não deveriam aceitar dois Estados
Dissidente de Israel critica tática palestina
FÁBIO ZANINI
ENVIADO ESPECIAL A JERUSALÉM
Mordechai Vanunu, o mais famoso dissidente israelense, diz
que os palestinos adotam a tática
errada para obter seus direitos.
Em vez de ficarem se batendo
por seu próprio Estado, deveriam
lutar por um Estado único na região, em que árabes e judeus tenham os mesmos direitos.
"Os palestinos precisam entender a força do fator populacional e
começar a defender a solução
com um Estado que dê a eles direitos iguais", diz, em entrevista.
A lógica de Vanunu é simples:
por terem crescimento vegetativo
maior, os palestinos que vivem
sob ocupação israelense, hoje
pouco mais de 4 milhões, devem
ultrapassar os 5 milhões de judeus
em cerca de duas décadas.
Israel seria forçado a dar a eles
plenos direitos civis e políticos,
sob pena de se transformar em
um Estado com "apartheid", com
a minoria dominando a maioria.
Conforme uma piada de gosto
duvidoso contada por palestinos
defensores da estratégia, "Israel
tem a bomba atômica, mas nós temos a bomba de sêmen".
Vanunu, 50, é uma figura polêmica em Israel. Em 1986, denunciou o então secreto programa
atômico israelense, para o qual
trabalhava, alegando que queria
livrar o mundo do perigo nuclear.
Foi seqüestrado pelo serviço secreto israelense e passou 17 anos
preso, 11 em uma solitária. Libertado em abril de 2004, é considerado um traidor por grande parte
dos israelenses, mas é um ídolo de
pacifistas e ativistas antinucleares
ao redor do mundo.
Ele deu entrevista em um restaurante de Jerusalém, desrespeitando ordens de não conversar
com estrangeiros. Enquanto falava, acessava a internet, que acabou de conhecer, com um laptop
em cima da mesa. "É fascinante."
Folha - Os defensores da bomba
atômica em Israel argumentam
que ela funciona como instrumento de dissuasão contra outros países, principalmente o Irã. Não é um
bom argumento?
Mordechai Vanunu - O Irã já disse que está pronto para abrir suas
instalações para inspeção e assinou o Tratado de Não-Proliferação, enquanto Israel não assinou.
Israel usa esse argumento só para
justificar suas armas nucleares. A
verdade é que é o único a ter bombas atômicas na região, o que é
desestabilizador e apenas incentiva outros a buscarem também.
Folha - Por que, para o sr., Israel
não é uma democracia real?
Vanunu - Por causa do tratamento dos palestinos e do tratamento com relação a mim. Eu sofri por 17 anos porque sou cristão.
Se todos fossem judeus, receberiam direitos iguais.
Folha - O sr. acredita em uma solução negociada para o conflito israelo-palestino? Defende a constituição de dois Estados?
Vanunu - A melhor solução é um
Estado único, onde todos são seres humanos, respeitados pelo governo, pela Constituição. Os judeus deveriam perceber que, se
quiserem realmente ter orgulho
de sua democracia, deveriam dar
direitos iguais aos palestinos.
Folha - Mas nem os palestinos
acreditam nisso, a maioria quer seu
Estado ao lado do de Israel.
Vanunu - Os judeus não aceitam
um único Estado por causa do
crescimento populacional mais
rápido dos árabes. Perderiam sua
maioria. Os palestinos precisam
entender a força do fator populacional e começar a defender a solução com um Estado, que dê a
eles direitos iguais.
Folha - Os palestinos deveriam
mudar de tática, então?
Vanunu - Sim, sim, sim. Seria a
solução. E resolveria o problema
dos quase 5 milhões de refugiados
palestinos que têm vivido em
campos nos últimos 55 anos. Eles
poderiam viver em qualquer lugar no território histórico da Palestina, como os judeus.
Folha - A eleição de Mahmoud Abbas para a presidência da Autoridade Nacional Palestina muda algo?
Vanunu - Até agora os israelenses culparam Iasser Arafat [líder
histórico palestino, morto em novembro], agora terão Abbas, aceito por todos. Ninguém pode acusá-lo de terror. Está tudo nas
mãos de Israel agora.
Folha - A resistência armada contra Israel deveria continuar?
Vanunu - A segunda Intifada
causou muitos danos aos palestinos. Foi um erro, e é usada pelos
judeus para justificar o que fazem,
é uma razão para formar novas
gerações de extremistas religiosos
de direita. Os palestinos deram
uma justificativa para os israelenses fazerem o que fazem.
Folha - Como é o mundo após 17
anos e meio preso?
Vanunu - Bom, estou aqui sentado numa mesa de restaurante
com um computador ligado à internet. Eu gosto muito dessa nova
modernidade. Essa era de computadores, internet, telefones celulares. É fascinante. Antes eu escrevia cartas com caneta, agora só
mando e-mail. É a melhor coisa
que existe.
Folha - Onze anos numa solitária
deixaram algum trauma?
Vanunu - Houve muita tentativa
de lavagem cerebral. E eu lutei
contra isso, procurando manter
meus sentimentos internos intocados. Eles puderam me prender,
mas não puderam controlar meu
espírito. Tudo estava sob meu
controle. Estou aqui conversando
com você porque consegui me
manter são.
Folha - Como o sr. se sente quando é chamado de traidor?
Vanunu - Eu ignoro. Os judeus
são apenas 5 milhões. No mundo
existem 6 bilhões, e a maioria está
me apoiando, gostam do que eu
fiz e me entendem.
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