São Paulo, sexta-feira, 18 de fevereiro de 2005

Texto Anterior | Próximo Texto | Índice

Para Alencastro, atitude brasileira é estranha

MÁRCIO SENNE DE MORAES
DA REDAÇÃO

É "estranha" a atitude amistosa da diplomacia brasileira em relação à Síria num momento em que se intensificam as pressões internacionais para que as tropas sírias deixem o Líbano e Damasco ajude na estabilização da região.
A análise é de Luiz Felipe de Alencastro, professor titular de história do Brasil da Universidade de Paris-Sorbonne e autor de "O Trato dos Viventes" (2000).
 

Folha - Em 2003, o chanceler Celso Amorim foi ao Oriente Médio, com o presidente Luiz Inácio Lula da Silva, e não visitou Israel. Agora, embora a visita sirva para acertar uma reunião entre países árabes e sul-americanos, ele faz outra viagem à região e, de novo, deixa Israel fora do roteiro. Como o sr. vê a atitude da diplomacia brasileira?
Luiz Felipe de Alencastro -
Se o chanceler não tem nenhuma visita a Israel já marcada [a assessoria de imprensa do Itamaraty disse à Folha que não há planos nesse sentido], trata-se de uma atitude estranha da diplomacia brasileira. Após morte de [Iasser] Arafat [líder palestino morto recentemente], a situação mudou nos territórios palestinos, e não seria impossível visitar autoridades palestinas e israelenses na mesma viagem.
Além disso, os EUA têm buscado facilitar as negociações entre os palestinos e Israel e pressionar a Síria a ajudar na estabilização da região. Com tudo isso, há um começo de desmilitarização nos territórios palestinos. Embora compreensível, pois o objetivo da viagem é estreitar relações com Estados árabes, a atitude da diplomacia do Brasil é, portanto, esquisita.

Folha - Amorim declarou que é preciso ouvir o que Damasco tem a dizer e manteve sua viagem à Síria. Como o sr. analisa o modo como a diplomacia brasileira lida com a questão síria?
Alencastro -
O modo como o Itamaraty trata a questão síria também é estranho, pois o Brasil não apoiou, no ano passado, a resolução da ONU que pede a saída da Síria do Líbano. Há 14 mil soldados sírios no Líbano. A situação vem-se prolongando e incomoda os países da região.
Como as negociações entre palestinos e israelenses parecem estar em via de serem retomadas, a questão da presença síria no Líbano se tornou, novamente, um assunto importante. Se o atentado contra o premiê [Rafik] Hariri foi cometido pelos sírios com a intenção de impedir que ele conquistasse apoio à sua frente contra a presença síria no Líbano, o tiro saiu pela culatra, já que ela se fortaleceu após a morte de Hariri.
Nesse contexto, quando observamos as duas atitudes do governo brasileiro, chegamos à conclusão de que a posição da diplomacia brasileira é muito estranha.


Texto Anterior: Artigo: Damasco não tem mais desculpa
Próximo Texto: EUA: Bush põe diplomata na chefia da Inteligência
Índice



Copyright Empresa Folha da Manhã S/A. Todos os direitos reservados. É proibida a reprodução do conteúdo desta página em qualquer meio de comunicação, eletrônico ou impresso, sem autorização escrita da Folhapress.