São Paulo, domingo, 19 de maio de 2002

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EUA

Presidente afirma que teria agido se soubesse que aviões sequestrados em 11 de setembro seriam usados "como mísseis"

Bush se defende de críticas e ataca oposição

MARCIO AITH
DE WASHINGTON

O presidente dos EUA, George W. Bush, tentou ontem defender-se das críticas e atacar a oposição democrata em sua primeira aparição pública após admitir que foi alertado, no dia 6 de agosto de 2001, sobre possíveis planos do terrorista Osama bin Laden de sequestrar aviões comerciais do país.
Em cerimônia em homenagem a cadetes da aeronáutica na Casa Branca, Bush afirmou que teria agido de outra maneira se soubesse da natureza dos ataques que, em 11 de setembro, usaram aviões sequestrados como mísseis para matar cerca de três mil pessoas em Nova York e em Washington.
"Dizer o que o outro deveria ter feito se tornou hábito em Washington", afirmou Bush, numa crítica às lideranças democratas que o criticam por ter demorado oito meses para admitir a existência do alerta e por não ter agido apropriadamente para impedir os atentados. "Eu teria feito tudo em meu poder para proteger a população norte-americana. Quero que as tropas aqui saibam que levo muito seriamente meu trabalho de comandante em chefe."
O líder democrata no Senado, Tom Daschle, disse ontem que, ao pressionar Bush a revelar o que sabia antes de 11 de setembro, seu partido não está dizendo como o presidente deveria ter agido, mas sim "tentando assegurar que isso nunca ocorra novamente."
Daschle tentou ontem moderar as críticas a Bush ao reconhecer que, apesar de ter sido alertado pela CIA em agosto, o presidente pode não ter tido acesso a outros relatórios, feitos por agentes do FBI nos Estados do Arizona e de Minessota, indicando a possível existência de terroristas em escolas de aviação nos EUA.
"Se isso é verdade, precisamos entender por que essas informações não chegaram ao presidente", disse Daschle. "No entanto, também precisamos saber por que a Casa Branca demorou oito meses para admitir que recebeu um alerta da CIA."
Para o alívio de Bush, os editoriais dos principais jornais norte-americanos pouparam o presidente de críticas contundentes em suas edições de ontem, preferindo questionar, construtivamente, a capacidade do FBI e da CIA de coordenarem esforços e informações de inteligência. Os jornais também identificaram um exagero na reação da oposição democrata. O "New York Times" lembrou que as comissões de inteligência da Câmara e do Senado receberam alertas semelhantes antes de 11 de setembro e não pressionaram o governo a agir nem os repassaram à população.
No entanto, fica claro que a dinâmica dos poderes em Washington mudou desde quarta-feira à noite, a seis meses das eleições parlamentares que poderão mudar o controle do Senado. A oposição democrata perdeu o medo de criticar Bush publicamente, colocando fim à união partidária que tem legitimado a reação militar de Bush e mantido índices inéditos de popularidade a ele.
Além disso, uma pesquisa preliminar CNN/Gallup, feita na quinta-feira, concluiu que dois terços dos norte-americanos acham que Bush errou ao não divulgar o alerta para a população assim que o recebeu da CIA durante um briefing diário, em agosto passado. Um terço dos entrevistados acha que o episódio os faz avaliar Bush de maneira menos favorável.
Além de dizer que o alerta recebido em agosto era vago e dizer que a oposição democrata é oportunista, a Casa Branca parece ter uma terceira estratégia para sair dessa crise: vazar documentos de inteligência favoráveis a Bush para neutralizar o estrago político.
Ontem, o porta-voz da Casa Branca, Ari Fleischer, confirmou a existência de um relatório, fornecido aos jornalistas por um membro do governo, indicando que Bush autorizou operações contra Bin Laden dias antes de 11 de setembro. O documento poderia indicar que o presidente não estava inerte e que preparava-se para agir contra o terrorista.
O problema de Bush é que a Casa Branca parece ter perdido o controle sobre o vazamento de informações sensíveis. Ontem, um outro relatório, preparado por um conselho presidencial em 1999, alertou o então presidente, Bill Clinton, que Bin Laden poderia usar o sequestro de aviões em missões suicidas contra alvos como o Pentágono. Essa revelação indicaria que a idéia do uso de aviões como mísseis não era tão inovadora e surpreendente como Bush e seus assessores hoje argumentam.



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