São Paulo, segunda-feira, 19 de julho de 2010

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Crítico de Mao, professor atrai censura

Após ganhar fama com aulas de história postadas na internet, Yuan Tengfei passa três semanas desaparecido

Popular entre os alunos, docente diz em vídeo na web que líder é culpado pela Grande Fome, crise que matou 30 milhões

FABIANO MAISONNAVE
DE PEQUIM

Todas as notas de yuan, a moeda chinesa, estampam Mao Tse-tung, seu mausoléu está na praça da Paz Celestial, e a China continua sob o regime fundado por ele.
O que acontece, então, quando um professor de história da rede pública o acusa de ser um "abutre com as mãos sujas de sangue" por causa da morte de 30 milhões de pessoas por fome?
Docente de ensino médio, Yuan Tengfei, 38, vem ganhando fama desde 2008, depois que suas aulas, sempre irreverentes e críticas à história oficial, passaram a circular na internet. Em poucos meses, elas foram vistas por 10 milhões de pessoas.
"O estilo de Yuan é totalmente novo e me fez mudar de opinião sobre história", diz a universitária Xu (ela só autorizou publicar seu sobrenome), 19, uma ex-aluna. "Arrisco dizer que toda a classe era fã dele."
Até há pouco, a fama só fazia bem a Yuan. Ganhou o apelido de "o melhor professor de história da história", publicou "Que Diabos é História?", coleção de quatro livros que já vendeu 900 mil exemplares, participou de um prestigioso programa de TV e foi contratado por uma escola pública experimental.
Mas, em maio, Yuan começou a ficar sob pressão depois que uma aula antiga sua sobre o governo de Mao (1949-76) caiu na web.
Na aula, Yuan responsabiliza Mao pela Grande Fome (1959-61), quando 30 milhões de chineses morreram após mudanças na política agrícola -para ele, o "maior desastre da história da China".
"Nunca vou à praça da Paz Celestial", diz Yuan. "Se passo de carro por lá, fico com vergonha, há 30 milhões de fantasmas tentando te assombrar. Esse lugar deveria ser rebatizado de praça da Comemoração do Massacre."
Yuan ainda disse a seus alunos que "ri" da história oficial contada pelos livros do Partido Comunista.
Todos os vídeos de Yuan foram censurados, e ele sumiu por três semanas. Reapareceu apenas para uma declaração, postada na internet, em que, comedido, nega que tenha sido preso.
"Confio no Partido Comunista e no governo popular e acredito que a lei me trará justiça", afirmou Yuan, cujas mãos para trás, em vez da usual gesticulação, levantaram rumores de que ele estaria algemado.
Procurado pela Folha, Yuan disse que não está concedendo entrevistas.
O editor de seus livros, Xu Hang, disse que Yuan passou a ter mais dificuldade para publicar seus textos. "O quarto volume, que sai no final do ano, foi aprovado pelo governo, mas teve 4.000 das 96 mil palavras cortadas."


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