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entrevista
"Lógica não é a mesma de luta antiditaduras"
DE CARACAS
O ex-presidente boliviano e ex-dono da emissora
de TV PAT Carlos Mesa,
56, fez dura crítica aos
meios de comunicação e à
oposição em países como
Venezuela e Equador.
(FM)
FOLHA - O sr. afirma que as
ameaças à liberdade de expressão vêm hoje de governos
democraticamente eleitos. Por
que existe esse paradoxo?
CARLOS MESA - O problema
dos políticos e dos meios
de comunicação que estão
em confronto com esses
governos autoritários é
que seguem pensando
com a mentalidade preexistente, partindo do pressuposto de que estão contra ditaduras quando se
trata de ditaduras eleitas e,
portanto, não são ditaduras. Têm tendências autoritárias? Sim. Mas não serão derrotados como ditaduras militares porque o
fenômeno é diferente. É
preciso reconquistar o
eleitor. Senão, não haverá
vitória.
FOLHA - O sr. criticou meios
de comunicação que teriam
passado a cumprir o papel de
partidos políticos. Quais os riscos dessa tendência?
MESA - É urgente a construção de um sistema de
médio prazo que não passa
por ganhar eleições nem
derrotar o governo de turno. É essa armadilha na
qual caíram alguns partidos na Venezuela, na Bolívia e no Equador. Não há
projeto, não há estrutura,
não há nada. Isso é uma luta de reconstrução de longo prazo, que deve ser
combinada com os meios
de comunicação para que
estes transfiram o espaço
de atividade política aos
políticos.
O desafio parece impossível de resolver. Pela via
não democrática, é impossível. Em 2008, houve
uma lógica da oposição boliviana que pretendia derrubar Evo Morales. Não o
derrubou e ainda perdeu
toda a sua força, além de
dar argumentos para que
Morales dissesse ao mundo que queriam derrocá-lo, quando ele é um homem autoritário. É um
processo lento, de mudança de mentalidade. Se seguirmos com o discurso de
vítimas de ditadores, estaremos perdidos.
FOLHA - No Brasil, rádios e
TVs muitas vezes estão em
mãos de políticos e seus aliados. Na Bolívia, a sua carreira
política se deve muito à projeção que teve na emissora da
qual era dono. Como deveria
ser a regulamentação para a
fronteira entre meios de comunicação e política?
MESA - É uma linha muito
difícil de discernir. Alguém que, como eu, esteve
23 anos durante uma hora
todas as noites nas casas
de 1 milhão de pessoas
num país de 10 milhões
obviamente tem um nível
de conhecimento maior
do que um carpinteiro.
A realidade é que os
meios defendem interesses que vão além do interesse coletivo. Se não se
reconhecer isso, estaremos enganando a nós
mesmos.
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