São Paulo, sábado, 19 de dezembro de 2009

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CLÓVIS ROSSI

O clima, o G2 do mal e o Brasil do bem


Estados Unidos e China saem como vilões da grande cúpula do ano, reunião da qual, sem megalomania, Lula saiu bem

O G2 (Estados Unidos e China), o grupo que tende a ocupar o assento da frente na condução dos assuntos globais, materializou-se em Copenhague, na Cúpula do Clima.
Pena que tenha sido o G2 do mal, responsável pelo desfecho vergonhoso da mais importante cúpula em muitos anos.
Ouso até dizer que Barack Obama é mais culpado do que Hu Jintao, o presidente chinês, ou Wen Jiabao, o primeiro-ministro. Mais culpado porque é dele que mais se esperava, especialmente depois de ter revertido a posição de seu antecessor que se negou durante demasiado tempo a aceitar que a mudança climática "não é ficção, é ciência", como disse Obama ontem em Copenhague.
Pena que o americano não tenha sido coerente, nas propostas, com a sua própria avaliação de que a mudança climática, se não combatida, "representará riscos inaceitáveis para nossa segurança, nossas economias e nosso planeta". Obama abandonou até o "yes, we can", com que incendiou a imaginação dos americanos e do mundo, para jogar numa retranca indigna de quem se propunha a encarnar "a mudança".
Deu-se na prática o que dizia Michael A. Levi, do Council on Foreign Relations, antes mesmo do desfecho da cúpula: "Nos últimos oito anos, muitos argumentaram que as nações em desenvolvimento relutantes em se comprometer com um novo acordo [sobre mudança climática] -particularmente China e Índia- estavam simplesmente se escondendo atrás dos EUA, cujo engajamento entusiasmado seria tudo o que se necessitaria para um avanço".
Como Obama não demonstrou o "engajamento entusiasmado", a China, mais que a Índia, continuou se escondendo, entrincheirada em um conceito míope de soberania nacional, para recusar monitoramento de suas ações na área climática, a principal condição imposta pelo governo Obama para um acordo, ao menos em torno do fundo que financiaria a adaptação/combate à mudança climática pelos pobres .
Felizmente, o governo brasileiro, pela voz de Luiz Inácio Lula da Silva, aceitou aderir ao fundo, depois de uma negativa inicial da ministra Dilma Rousseff, que chegou a dizer que o US$ 1 bilhão defendido pela ex-ministra Marina Silva e pelo governador José Serra não faria "nem cócegas" [no esforço financeiro exigido para a adaptação e/ou combate à mudança climática].
Quando Lula abandona a megalomania de acreditar que o que diz será seguido pelo mundo todo, quando fica claro que não funcionam suas seguidas ameaças de telefonar para Obama e Hu Jintao para enquadrá-los, aí sim o Brasil sai bem na foto. Pelo menos na de Copenhague.
Apresentou propostas que entidades ambientalistas consideraram "top de linha" e manteve os compromissos previamente anunciados, fosse qual fosse o resultado final da cúpula.
E o resultado é sombrio para o planeta não apenas porque o grande momento para passar das palavras à ação foi perdido (ou adiado, na melhor das hipóteses), mas porque feriu o multilateralismo, uma das principais pedras de toque da nova diplomacia norte-americana, como admitiu o próprio Obama: "Penso que nossa habilidade para adotar uma ação coletiva está em dúvida neste momento".


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