São Paulo, terça-feira, 20 de abril de 2010

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Chávez faz festa socialista pelo bicentenário

Presidente venezuelano transforma cerimônia em homenagem a Bolívar em desfile de armamentos

FLÁVIA MARREIRO
DE CARACAS

O governo venezuelano comemorou ontem os 200 anos do primeiro grito de independência do país com uma grande parada cívico-militar, cuja tônica foi a demonstração das recentes aquisições de armas e a defesa do "socialismo do século 21". Passaram 12 mil pessoas pelo imponente passeio dos Próceres, em Caracas, dos "guerreiros indígenas socialistas" à brigada de funcionários da estatal petroleira PDVSA.
O presidente Hugo Chávez, com traje militar de gala, abriu o desfile afirmando que a Venezuela não será jamais "colônia ianque ou de nenhum país estrangeiro", ladeado por líderes esquerdistas, entre eles os de Cuba, Nicarágua, Equador e Bolívia, integrantes da chavista Alba (Aliança Bolivariana para as Américas).
A convidada de honra, e que seria oradora da sessão solene da Assembleia Nacional mais tarde, foi Cristina Kirchner, presidente da Argentina -escolha criticada pela oposição.
Chávez se esmera para fixar a ideia de que a comemoração do bicentenário representa a retomada das ideias do herói da independência Simón Bolívar (1783-1830). Seu governo, porém, atravessa momento delicado. A popularidade do presidente caiu (44%, segundo o instituto Datanálisis), efeito do desgaste da crise energética e da inflação.
Aviões americanos F-16, e os russos Sukhoi-30, parte do arsenal a partir de 2008, e os chineses K-8W, comprados neste ano -todos adquiridos após os EUA vetarem a venda de aeronaves brasileiras e espanholas, com componentes americanos, e de peças de reposição para os F-16-, cruzaram o céu. Parte levava câmeras a bordo, efeito para a transmissão em cadeia de rádio e TV. Um grupo de militares de Belarus fez uma apresentação de honra de dez minutos, e desfilaram ainda tratores iranianos e delegações de Argélia e Líbia.
Também desfilou a controversa Milícia Nacional Bolivariana, composta por militares da reserva e civis treinados pelo governo -de estudantes e funcionários públicos a camponeses. Os diferentes contingentes militares gritavam palavras de ordem socialistas.
Venezuelanos, a maioria de vermelho, com camisetas e bonés identificando programas sociais do governo e estatais, preencheram a arquibancada do passeio, aplaudindo apresentações folclóricas.
"Antes de 1999 [ano da posse de Chávez], eu era excluído", diz Miguel Liendo, 26, facilitador da Missão Sucre, programa de alfabetização do governo. "Viemos para nos divertir, conhecer mais do país", disse o estudante Ángel Sandrano, 18, defensor do governo, ao lado da namorada, Albaña Molina, 18, que "não gosta do governo de jeito nenhum", mas quis vir mesmo assim.
A oposição não foi convidada às comemorações. As forças opositoras, que tentam se unir para disputar as cruciais eleições legislativas de setembro, lançaram nota dizendo que a democracia corre risco sob Chávez e rejeitando o "militarismo" dos festejos.
A realeza espanhola também não foi convidada, mas "movimentos sociais e historiadores do país, sim", disse à Folha o historiador e vice-ministro da Cultura, Pedro Cazaldilla.
A ex-metrópole faz parte do Grupo Bicentenário, integrado por todos os países que comemoram a emancipação entre 1809 e 1811 -cada um adaptando a cor política do momento à data- e tenta se equilibrar na atual conjuntura. Madri já disse, porém, que não pedirá desculpas pela colonização, ao contrário do que sugeriram Chávez e outros presidentes.


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