São Paulo, quinta-feira, 20 de maio de 2004

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Guerra do Iraque foi erro, diz McNamara

J. M. MARTÍ FONT
DO "EL PAÍS", EM BARCELONA

Robert McNamara, 87, foi secretário da Defesa dos EUA entre 1961 e 1968. Viveu a crise dos mísseis de Cuba e a escalada da Guerra do Vietnã. Para ele, a Guerra do Iraque não era necessária.
 

Pergunta - Há algum paralelo entre o Vietnã e o Iraque?
Robert McNamara-
Não, são totalmente diferentes. As razões da Guerra do Vietnã precisam ser buscadas na Guerra Fria. Eisenhower [1953-61] disse que, se o Ocidente cedesse o controle do Vietnã do Sul à URSS, as peças do dominó começariam a cair, uma após a outra, e o comunismo se estenderia por toda a Ásia. Estávamos equivocados. A intervenção no Iraque se baseou na existência de armas de destruição em massa e no perigo que Saddam Hussein representava. Muitas pessoas acreditavam em uma dessas razões, mas era preciso ir à guerra? Minha resposta é não. Era preciso levar a questão à ONU.

Pergunta - Existe, na opinião pública européia, a idéia de que os EUA travaram essa guerra com o objetivo de controlar o petróleo.
McNamara-
Não acredito nisso. É verdade que consumimos quantidades muito pouco razoáveis de petróleo, mas a questão é se nosso fornecimento corre perigo. E não corre. O petróleo é um produto cujo preço é muito elástico. Quando o preço subiu bastante, nos anos 80, o consumo caiu. Além disso, os produtores de petróleo não podem comê-lo. Precisam vendê-lo, sob o risco de suas economias pararem.

Pergunta - A opinião pública nos EUA apóia o unilateralismo atual?
McNamara-
Não há dúvida de que os EUA estão divididos. A visão de mundo dos neoconservadores, a direita religiosa, é importante, mas minoritária. Hoje ela é prevalecente, mas os acontecimentos das últimas duas semanas no Iraque vão enfraquecê-la.

Pergunta - Com o Vietnã em vista, como o sr. acha que a guerra afetará a sociedade americana?
McNamara-
A Guerra do Iraque está tendo um efeito adverso sobre o governo. A do Vietnã também teve. Mas acho que Bush está em posição muito mais forte do que Johnson estava. O Iraque ainda não se converteu em um problema tão sério quanto o Vietnã.

Pergunta - Talvez agora, com o escândalo das torturas...
McNamara-
É verdade. A tortura é absolutamente condenável, e todas as medidas devem ser tomadas para que nunca volte a acontecer. Mas acredito que a opinião pública americana ainda não se veja refletida nessas imagens.

Pergunta - O governo Kennedy (1961-63) representava o sonho de uma geração. A Europa os adorava. Os EUA mudaram tanto assim?
McNamara -
Nem tanto. Muitas pessoas criticam o governo Bush por ele ser unilateralista, mas a verdade é que, basicamente, os americanos são unilateralistas. Acreditamos que salvamos a Europa nas duas guerras mundiais e que a salvamos economicamente com o Plano Marshall. Acreditamos que fazemos mais do que nossa devida parte para ajudar os países em desenvolvimento, o que não é verdade, e acreditamos que procuramos fazer o bem, que o fazemos e que, por Deus, os outros países deveriam reconhecê-lo. Não compartilho esse ponto de vista, mas ele é muito difundido.


Tradução de Clara Allain


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