São Paulo, domingo, 21 de fevereiro de 2010

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Zuma sofre chuva de ataques na África do Sul

No ano da Copa, presidente sul-africano é criticado por estilo de vida exuberante enquanto economia do país patina

Imagem de líder enfrenta dano extra por escândalo apelidado de "Babygate" após ter filho com amante; ele já tem cinco mulheres


FÁBIO ZANINI
DE JOHANNESBURGO

Foi demais, mesmo para um país acostumado às aventuras sexuais de seu presidente. A notícia de que Jacob Zuma teve seu 20º filho, e ainda mais de uma amante, coroou um início de ano infernal para ele.
O "Babygate", como vem sendo chamado, seria apenas mais uma anedota na colorida vida particular de Zuma, 67, não tivesse vindo num momento em que a economia patina, sindicatos pressionam por mudanças, denúncias de corrupção se avolumam e a população nas "townships" (favelas) começa a perder a paciência.
O país perdeu 1 milhão de postos de trabalho em 2009, levando o desemprego a 25%. A recuperação será mais lenta do que o previsto: o FMI projeta crescimento de apenas 1,7% neste ano, e isso somente porque a Copa do Mundo contribuirá com 0,5% de aumento.
"Zuma afirma que esse será o ano da ação. As pessoas começam a se perguntar então o que ele vinha fazendo até agora", diz Justin Sylvester, do Instituto para Democracia na África do Sul.
No início do mês, Zuma fez um discurso nos moldes do "Estado da União" americano. Saiu dele atacado por todos os lados, inclusive por sua base tradicional, os sindicatos.
"As palavras do presidente não estão se traduzindo em ações", afirma Patrick Craven, dirigente da Cosatu, a maior central sindical do país e parte da coalizão de governo.
Zuma, concordam os analistas, está pagando o preço de suas declarações na campanha eleitoral de um ano atrás. Aos sindicatos, prometeu mudar a política econômica "neoliberal" de seu antecessor, o detestado Thabo Mbeki. Mas pilares do liberalismo, como as metas de inflação e o câmbio livre, sobrevivem. E o governo acena com a flexibilização do mercado de trabalho. "A mudança radical não veio", diz Craven.
Parte de seu partido pressiona pela nacionalização do setor minerador, um dos mais fortes no país. De novo, Zuma rejeita.
O "Babygate" veio apimentar a crise de credibilidade. Zuma tem cinco mulheres, o que é permitido pela lei sul-africana, com base no respeito a culturas poligâmicas tradicionais.
Na campanha, ele dizia que isso era muito mais honesto do que ocorre no Ocidente, em que homens têm amantes. Mas agora se sabe que o presidente pratica o que criticava.
"Os últimos eventos cristalizaram na classe média a oposição a Zuma", diz Anneke Greyling, diretora do Ipsos-Markinor, principal instituto de pesquisa de opinião do país.
Na África do Sul, a lealdade é muito mais ao partido governista (Congresso Nacional Africano, que liderou a luta contra o apartheid) do que ao presidente. O "Babygate" enfureceu várias alas do partido e obrigou o presidente a pedir desculpas públicas.
A massa mais pobre, diz Greyling, não gostou do escândalo, mas ainda está disposta a permanecer leal ao governo por mais algum tempo. A paciência tem limite, como demonstraram ondas de distúrbios nas favelas em 2008 e 2009. Tudo que o governo não quer é uma repetição às vésperas da Copa.
Em novembro de 2009, o instituto fez uma pesquisa com 3.374 sul-africanos, em que uma das conclusões foi a insatisfação com o desempenho de Zuma em várias áreas.
Menos de 50% se disseram satisfeitos com políticas de redução da desigualdade, geração de empregos e combate à corrupção. E há os casos de corrupção revelados pela imprensa, envolvendo figurões do regime. Pelo menos nesse front, Zuma decidiu agir. Anunciou uma auditoria completa nas finanças dos membros da direção de seu partido.


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