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Europa quer resposta menos ruidosa ao terror
DA REDAÇÃO
A reação européia aos atentados de Madri, que mataram 202
pessoas, não será tão "ruidosa"
quanto a americana ao 11 de Setembro, de acordo com especialistas consultados pela Folha.
Anteontem, oito dias depois dos
ataques, os ministros do Interior e
da Justiça dos países-membros da
União Européia concordaram em
intensificar sua cooperação na luta contra o terrorismo global.
Eles decidiram criar o posto de
comissário antiterrorismo da UE
e estabelecer uma instância operacional de intercâmbio de informações na qual forças de segurança, autoridades judiciais e serviços secretos poderão compartilhar seus conhecimentos sobre a
ameaça terrorista ao continente.
Inúmeras razões explicam a diferença entre a reação européia e a
americana, segundo os analistas.
Para Bruno Tertrais, responsável
pelo Pólo Defesa e Estratégia da
da Fundação pela Pesquisa Estratégica (França), "como os europeus convivem há muito tempo
com o terrorismo [local ou regional], há menos dramatização" no
continente.
De acordo com Tertrais, é errônea a impressão de que os EUA
tenham restringido bastante as liberdades civis e de que a Europa
não o fez. "Antes do 11 de Setembro, os EUA estavam atrasados
em relação à Europa no que diz
respeito à proteção contra a
ameaça de ataques terroristas",
apontou.
"Ademais, como o atual governo americano não teme parecer
ser caricatural, anunciando sem
moderação cada medida drástica
que toma, as pessoas ficam com a
impressão de que suas ações são
mais restritivas que as européias",
acrescentou Tertrais.
Segundo Michael Kreile, especialista em UE da Universidade
Humboldt (Alemanha), tanto o
bloco como um todo quanto seus
Estados-membros individualmente tomaram inúmeras medidas para proteger o território europeu após o 11 de Setembro.
"Os europeus dotaram-se de
um aparato de segurança forte,
deram força à Europol, um órgão
de polícia criminal intergovernamental que facilita a troca de informações entre as polícias nacionais, e à Eurojust, uma unidade de
cooperação judicial, e instituíram
o mandado de prisão europeu. O
problema é que nem tudo vem
sendo aplicado", indicou Kreile.
De fato, uma das conclusões às
quais chegaram os ministros europeus reunidos em Madri anteontem é que os países da UE deverão acelerar o processo de implementação das medidas antiterror já tomadas.
Por exemplo, o mandato de prisão europeu ainda não é aplicado
em países como a Alemanha e a
Áustria.
"Os europeus buscarão melhorar o que já existe no continente.
Por exemplo, a França e a Espanha já trabalham lado a lado com
sucesso contra o terrorismo do
ETA [grupo basco], porém ainda
não o fazem em relação ao terrorismo islâmico. Isso terá de melhorar", ressaltou Tertrais.
Charles Kupchan, especialista
em relações transatlânticas do
Council on Foreign Relations
(EUA), salientou que a expansão
da UE para o Leste Europeu, que
será concretizada em 1º de maio
próximo, também constitui uma
fonte de preocupação para as autoridades européias.
"Não há um controle das fronteiras tão rígido nos futuros países
do bloco quanto existe nos atuais
15 membros. É claro que os grandes Estados da União Européia se
preocupam com essa situação,
pois a imigração clandestina pode
ser usada por terroristas para infiltrar pessoas na Europa", disse
Kupchan.
Comissário antiterror
Mesmo o comissário antiterror
europeu não terá os mesmos poderes que Tom Ridge, secretário
da Segurança Interna dos EUA
-posto criado depois dos atentados de 11 de setembro de 2001.
"A luta antiterror européia não
ocorre apenas na esfera continental. Há uma grande diferença entre os EUA e a UE, já que ela é um
bloco que reúne Estados soberanos, não um país [como os EUA].
Assim, seria impossível que um
comissário pudesse ter os poderes
de que dispõe o secretário da Segurança Interna", analisou Kreile.
Ademais, como enfatizou Tertrais, várias medidas já foram tomadas no âmbito doméstico. "Seria errado pensar que o combate
ao terror na Europa é uma exclusividade da UE. Muitas medidas
restritivas já são aplicadas nos
países do bloco, mas elas não são
alardeadas como nos EUA."
Ele lembrou ainda que a percepção popular européia não é a de
que todo o continente foi atacado
por extremistas islâmicos em Madri. "Os europeus em geral crêem
que a Espanha tenha sido alvo dos
atentados, não a Europa como
um todo", afirmou Tertrais.
Para Kreile, isso também se reflete na desaprovação à Guerra do
Iraque. "Para os americanos, o
conflito contra o regime do ex-ditador Saddam Hussein fez parte
da guerra ao terrorismo global.
Para a população e os políticos europeus, ela prejudicou o combate
ao terror, já que provocou o caos
num país árabe e muçulmano,
dando ainda mais munição aos
extremistas islâmicos."
Mesmo assim, a cooperação do
serviço secreto dos EUA com os
da Europa será reforçada.
(MSM)
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