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Mística leva África do Sul a ratificar CNA em eleições de hoje
Partido que liderou combate à segregação luta para superar marca de 66% dos votos, necessária para alterar Constituição; racha recente deu força à oposição
FÁBIO ZANINI
ENVIADO ESPECIAL A JOHANNESBURGO
A mística da bandeira preta,
verde e amarela do Congresso
Nacional Africano, espalhada
por milhares de postes da África do Sul, deve dar hoje um
mandato de presidente a seu líder Jacob Zuma, na quarta eleição livre pós-apartheid.
Quatro anos de uma luta visceral de facções, que forçaram a
deposição do ex-presidente
Thabo Mbeki num movimento
puramente partidário (sem
participação dos eleitores, Parlamento ou Judiciário), não devem ser suficientes para abalar
a hegemonia do CNA no país
mais importante do continente, palco da Copa do Mundo de
2010. Nem a suspeita de corrupção que paira sobre Zuma.
A previsão é de filas gigantescas nos postos de votação, com
23 milhões de eleitores exercitando um direito que lhes foi
negado durante cinco décadas
do regime segregacionista
branco, encerrado em 1994.
Como disse Zuma no comício
final, no último domingo, a
"marca" CNA permanece intacta, apesar do racha que levou
à criação do Cope (Congresso
do Povo), em dezembro. Sentado num sofá um metro atrás estava o maior responsável pelo
partido reter muito de sua aura,
Nelson Mandela.
Zuma é o candidato, mas o
voto é no CNA, o partido que liderou a resistência ao apartheid. "O que nos guia é uma
implementação coletiva das
políticas da organização. Uma
vez que o CNA decide suas políticas, nós todos nos unimos",
diz Manto Tshabalala-Msimang, ministra da Presidência.
Ninguém admite, mas a estratégia tem o bônus de minimizar a pressão sobre o polêmico candidato, dado a gafes e frases de efeito. No comício, isso
parecia estar funcionando. "Eu
gosto do CNA muito mais do
que gosto de Zuma", dizia
Mbande Fanele, funcionário
dos supermercados Shoprite.
Dois terços
A vitória é indiscutível, mas
ainda há um elemento de drama na eleição. O número mágico é 66%, a barreira psicológica
necessária para mudar a Constituição, embora o partido negue que pretenda mexer nela.
No sistema sul-africano, os deputados são alocados na proporção dos votos recebidos pelos partidos. O Parlamento depois elege o presidente.
Uma vitória entre 60% e 66%
será um triunfo mediano para o
CNA, e abaixo de 60%, um "desastre". Sinal de que a frágil
oposição finalmente ganhou
musculatura. "Buscamos maioria esmagadora para trabalharmos pelos pobres", diz Lindiwe
Zulu, porta-voz do CNA.
Não é mera retórica de campanha. Lentamente, o CNA se
viu obrigado a mudar o foco de
um partido dos negros para um
partido dos pobres.
Hoje há uma classe média
negra, com cerca de 3 milhões
de pessoas, cuja identificação
com o CNA não é a mesma das
massas empobrecidas. Muitos
tendem a escolher a Aliança
Democrática, até hoje vista como o partido dos brancos, liderado pela prefeita da Cidade do
Cabo, Helen Zille. E o surgimento do Cope rompeu o monopólio do CNA sobre os negros, que são 80% dos eleitores.
"Raça continua sendo muito
importante, mas não é mais o
único tema", diz Justin Sylvester, do Instituto para a Democracia na África do Sul. Além
disso, diz ele, o CNA passou
muito tempo focando a estabilidade econômica, e hoje precisa voltar-se para os pobres.
Zuma, o primeiro presidente
sul-africano da etnia zulu, a
mais numerosa do país, gosta
de exibir sua linhagem tribal,
dançando com roupas típicas,
mas não tem mais como caracterizar sua campanha como a
dos negros contra os brancos,
como o CNA fez no passado.
O presidente herdará economia em desaceleração, aumento do desemprego e da xenofobia, criminalidade gigantesca,
uma das maiores desigualdades
sociais e o maior número de
portadores da Aids do mundo.
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