São Paulo, quinta-feira, 22 de abril de 2010

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Kissinger nega que tenha se omitido na Operação Condor

Ex-secretário de Estado diz que telegrama recém-descoberto não significa suspensão de ação diplomática para evitar mortes

Porta-voz de americano diz à Folha que denúncias de omissão, reforçadas pelo National Security Archive, são "totalmente falsas"


CLAUDIA ANTUNES
DA SUCURSAL DO RIO

O ex-secretário de Estado americano Henry Kissinger nega ter ordenado, em 1976, a suspensão dos esforços diplomáticos para advertir ditaduras sul-americanas contra assassinatos no exterior no âmbito da Operação Condor, de colaboração entre os regimes militares da região.
"A acusação é totalmente falsa", disse um porta-voz de Kissinger, 86, em resposta a questionamento enviado por e-mail pela Folha.
A denúncia sobre a omissão de Kissinger diante dos assassinatos foi reforçada no início do mês pelo National Security Archive, instituição não governamental de Washington.
A ONG descobriu um telegrama de Kissinger a seu secretário-assistente para Assuntos Hemisféricos, Harry Shlaudeman, que classifica como a "peça perdida" num quebra-cabeças de documentos relacionados à Operação Condor.
No telegrama, de 16 de setembro de 1976, Kissinger respondia a uma mensagem, de 30 de agosto, em que Shlaudeman pedia instrução após o embaixador em Montevidéu ter-lhe dito que correria risco de vida se comunicasse à ditadura local "a profunda preocupação" dos EUA sobre os "rumores" de assassinatos -ordem assinada por Kissinger e que fora transmitida, no dia 23 de agosto, às embaixadas do Cone Sul.
Na resposta curta, o então secretário de Estado se nega "a aprovar mensagem para Montevidéu" e determina que "nenhuma nova iniciativa seja tomada nessa questão".
O porta-voz de Kissinger afirma que o telegrama refere-se apenas ao Uruguai. "O Chile não é mencionado", diz. Segundo ele, continuaram valendo as instruções de 23 de agosto, "que foram transmitidas no início de outubro ao chefe da inteligência chilena".
O porta-voz menciona um telegrama de 8 de outubro, parcialmente censurado antes da liberação, em que Shlaudeman diz a Kissinger que Manuel Contreras, chefe da Dina (a polícia política chilena), "revelou que já estava a par de nossa preocupação".
Não fica claro quem falou com Contreras ou quando, já que o embaixador em Santiago também resistira a transmitir as advertências, dizendo temer ofender o ditador Augusto Pinochet. Àquela altura, no entanto, o ex-chanceler chileno Orlando Letelier já havia sido morto na capital dos EUA, em atentado executado pela Dina no dia 21 de setembro.
Na véspera, dia 20, Shlaudeman ordenara que os embaixadores no Cone Sul fossem instruídos a "não adotar nenhuma nova iniciativa", uma vez que "não houve informes nas semanas recentes indicando uma intenção de ativar o esquema Condor".
O porta-voz de Kissinger afirma que essa última mensagem não significou a efetivação de uma contra-ordem. Mas, para os pesquisadores do período, foi o que aconteceu. "O Departamento de Estado iniciou um esforço para impedir uma "Assassinatos Ltda" no Cone Sul, e Kissinger, sem explicação, o abortou", disse Peter Kornbluh, do National Security Archive, ao divulgar o documento recém-descoberto.
O ex-secretário de Estado é cioso da memória de suas ações no governo americano -o Archive teve que recorrer à Justiça para ter acesso a documentos do período. Ele escreveu três autobiografias e nega participação no golpe chileno de 1973, embora não o apoio a Pinochet. "Consideramos que a mudança de governo no Chile foi de modo geral favorável -mesmo da perspectiva dos direitos humanos", escreveu.


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