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EUA exageram perigo, mas Teerã deveria parar enriquecimento, diz líder da oposição
SÉRGIO DÁVILA
DE WASHINGTON
Como membro do Tratado
de Não-Proliferação Nuclear, o
Irã tem o direito de enriquecer
urânio para fins pacíficos. Mas
não deveria. Pelo menos até
passar a crise. Por quê? "Porque há uma intenção do governo dos EUA de exagerar o perigo de o Irã ter uma arma atômica, para justificar um eventual
ataque ao país."
Quem diz isso, sob risco de
ser preso por suas palavras, é
um dos líderes da oposição iraniana em Teerã, Ebrahim Yazdi, 75, secretário-geral do Partido do Movimento pela Liberdade, de oposição -e ilegal.
Chanceler do governo provisório entre a queda do xá e o endurecimento do regime do aiatolá Khomeini, em 1979, Yazdi
é uma figura polêmica.
Recentemente, justificou o
direito do Hizbollah de se defender de Israel. O político
também é acusado de ter atuado como promotor público de
alguns julgamentos que levaram à execução de membros do
antigo regime de Reza Pahlevi
(1919-1980), logo após a Revolução Islâmica no Irã. Era uma
maneira de pelo menos garantir um julgamento aos ex-governantes, em vez da execução
sumária, justificaria ele depois.
Yazdi falou à Folha sobre a crise nuclear iraniana:
FOLHA - Como um dos líderes da
oposição, o sr. acha que o governo
atual do Irã deveria dominar a tecnologia nuclear?
EBRAHIM YAZDI - O Irã é membro
do Tratado de Não-Proliferação Nuclear e, como tal, tem o
direito de enriquecer urânio
para fins pacíficos. Tem o direito de adquirir, de dominar a
tecnologia e a energia nucleares. Ninguém pode nos dizer o
que fazer. Isso é papel dos iranianos. Dentro do país, no entanto, alguns dizem que o Irã
não deveria insistir em ter
energia nuclear. Nós temos petróleo, gás, para que mais?
Mas deixemos isso para os
entendidos.
Como membros do tratado,
somos obrigados a seguir as
normas de segurança e de cooperar internacionalmente. De
alguma maneira, deixamos de
seguir essas diretrizes até agora. Precisamos ganhar de novo
a confiança mundial. Para superar essa crise, deveríamos
cooperar com a Agência Internacional de Energia Atômica
(AIEA) por alguns anos até que
a situação esteja esclarecida.
Mesmo que isso signifique que
o Irã pare seu programa de
enriquecer o urânio. Ainda assim, eu repito: isso é uma questão para os iranianos decidirem, não para os norte-americanos.
FOLHA - Mas o sr. não se preocupa
com o fato de que quem vai cuidar
ou não para que todas as regras sejam seguidas é o presidente Mahmoud Ahmadinejad? Que estará
nas mãos dele quando e como o programa vai parar, se no limite pacífico
ou se nas armas nucleares?
YAZDI - Não acho que no momento o Irã tenha capacidade
de produzir armas nucleares,
então essa é uma falsa proposição. Mas é claro que há gente
dentro do Irã que acredita que
nós deveríamos ter armas. Só
que o governo dos Estados Unidos está mirando o alvo errado.
Imaginemos por um momento
que o Irã tenha capacidade de
construir uma arma atômica. E
daí? Qual seria o efeito colateral ou as conseqüências disso?
Nenhum. Israel tem o maior arsenal atômico da região. As
guerras que Israel ganhou até
hoje têm alguma relação com o
fato de eles terem armas atômicas?
Há uma intenção do governo
dos EUA de exagerar o perigo
de o país ter uma arma atômica,
para justificar um eventual ataque ao Irã e a atual pressão sobre Teerã. Como já disse, alguns iranianos de extrema direita também acham que nós
deveríamos ter armas. Se nós
tivermos, dizem, ninguém nos
invadirá. Isso é errado. A Coréia do Norte está em melhor
posição agora do que a Coréia
do Sul porque tem armas atômicas? Não, eles estão mendigando ajuda de outros países...
FOLHA - Qual sua avaliação sobre a
gestão Ahmadinejad?
YAZDI - O presidente Ahmadinejad faz parte da Guarda Islâmica Revolucionária . Eles gostam de dizer que libertaram o
país durante a guerra com o
Iraque (1980-1988), então eles
deveriam mandar no país por
conta disso. Pois bem, agora
eles comandam o Irã. Pois eu
não acho que ele saiba o que está fazendo. Na verdade, acho
que não sabe tudo o que acontece, está envolvido por uma
rede.
Mas sei que a retórica externa que ele usa é proposital e na
verdade ajuda o governo Bush e
Israel. Ambos estão se beneficiando tremendamente da retórica dele. Já internamente,
durante sua campanha, ele falava de justiça social. Pois algumas pessoas acreditam que ele
está destruindo a economia. Alguns até o comparam com a
desgraça econômica da época
do xá. Foi isso que destruiu o
regime do xá, aliás.
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