São Paulo, domingo, 23 de dezembro de 2007

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Terrorista indica "biblioteca básica" para fazer a revolução

DA REPORTAGEM LOCAL

Na virada dos anos 60/70, havia mais de 70 partidos de inspiração marxista-leninista no Peru. Muitos deles eram minúsculos, conta Roncagliolo em "La Cuarta Espada".
O debate era intenso e, em suas largas conferências, os militantes costumavam discordar sobre vários temas. Se a composição do exército revolucionário deveria ser camponês, mineiro ou pescador, se o itinerário da revolução teria de ser do campo à cidade ou ao contrário, e qual modelo de produção seria melhor para um Peru comunista, o chinês, o albanês, o iugoslavo ou outros.
Entre esses grupos, aquele criado por Abimael Guzmán, em 1969, era apenas mais um, e levava o inusitado -e mesmo poético- nome de Partido Comunista do Peru pelo Sendero Luminoso de Mariátegui. Sendero Luminoso significa "caminho iluminado". E José Carlos Mariátegui (1894-1930), autor de "Sete Ensaios de Interpretação da Realidade Peruana", foi o principal intelectual de esquerda que teve o país.
O Sendero, que seguia inspiração maoísta, tornou-se um dos agrupamentos terroristas mais perigosos do mundo. Na luta armada que desencadeou a partir de 1980, atacou camponeses, civis em geral, autoridades locais e o Exército.
A cifra de vítimas dessa guerra supera os piores cálculos de mortos e desaparecidos no Chile e Argentina juntos durante suas ditaduras militares.
A carnificina em larga escala acabou apenas quando Guzmán foi capturado, em uma emboscada armada por um grupo de inteligência do governo Alberto Fujimori, em 1992. O ditador, como era de se esperar, depois tirou vantagens políticas a partir dessa vitória contra o terrorismo.

Biblioteca da revolução
Guzmán costuma ser descrito por aqueles que conviveram com ele como um homem educado, que sempre quis deixar claro que, antes de tudo, era um professor universitário dedicado a encontrar o que supunha serem soluções para seu país.
Num intervalo dos interrogatórios após sua captura, um policial lhe perguntou o que ele deveria ler se quisesse "fazer uma revolução". Guzmán explicou-lhe didaticamente: "Dê uma olhada na minha biblioteca, sei que vocês a recolheram. Você deveria começar pela "História da Filosofia", de Dynnik, que não é difícil. Depois, a obra completa de Marx e os 57 volumes das obras de Lênin, que tenho em duas edições diferentes. Depois, Stálin, que é mais fácil, somente sete tomos. E finalmente os quatro de Mao. Há um quinto, mas foi editado pós-mortem e está carregado de revisionismo. Desse você pode prescindir", concluiu.
Hoje, Guzmán, condenado a prisão perpétua, está em uma cela construída para ele, na Base Naval de Callao, perto de Lima. Além das grades, guardam o terrorista paredes de concreto resistente a explosivos, sete portas metálicas e um muro de oito metros. (SC)


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