São Paulo, domingo, 24 de abril de 2005

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Em sua primeira audiência com a imprensa, Bento 16 foi breve, mas afirmou que pretende ter um bom contato com jornalistas

Afável, papa agradece trabalho da mídia

IGOR GIELOW
ENVIADO ESPECIAL A ROMA

Em um encontro inusitado do ponto de vista formal, já que a maioria dos jornalistas presentes o aplaudiu efusivamente e rezou em voz alta um pai-nosso, o papa Bento 16 agradeceu ontem os profissionais que participaram da cobertura da morte de seu predecessor e da transição que culminou em sua eleição na terça passada. Apesar de pregar a continuação do contato que João Paulo 2º com a mídia, Bento 16 apenas falou por 15 minutos -quando assumiu em 1978, Karol Wojtyla respondeu a perguntas por 40 minutos.
"Obrigado a todos. Esses historicamente importantes eventos eclesiais tiveram cobertura mundial. Eu sei o quão duro vocês trabalharam, longe de seus lares e suas famílias, por longas horas e às vezes em condições difíceis. Eu espero seguir esse diálogo com vocês", disse o papa.
Fez uma elegia do papel dos meios de comunicação. "Consciente da missão e da importância da mídia, a igreja procura a colaboração com o mundo da comunicação social, especialmente a partir do Concílio Vaticano 2º", disse, citando novamente o encontro liberalizante da igreja nos anos 60 do qual ele era visto como um adversário nos anos em que foi o "cardeal de ferro", o guardião da doutrina católica. Desde então, disse, "a humanidade tem testemunhado uma extraordinária revolução de mídia, afetando todos os aspectos da vida".
Joseph Ratzinger chegou às 11h no auditório Paulo 6º, a antiga Sala Neri, assim nomeada em homenagem ao expoente da arquitetura italiana do século 20 que a construiu em 1971, Pier Luigi Neri. Estava com o tradicional traje branco, que parecia estar um pouco mais curto do que o usado por João Paulo 2º, e sapatos de camurça avermelhada. Sentou numa cadeira tendo atrás a escultura em bronze "Ressurreição", de Pericle Fazzini (1974), que apesar da temática religiosa parece saída do set de um filme da série "Alien".
Pessoalmente, Bento 16 transmite mais firmeza e energia do que em suas aparições na televisão. Tem estatura mediana e menos intensa presença física, em comparação com o Karol Wojtyla no início do pontificado. Sua fala é suave. Falou claramente, com notável sotaque bávaro, em italiano, inglês, alemão ("Me permitam falar minha língua natal", brincou) e francês. Causou estranheza entre os repórteres de países de fala espanhola presentes a ausência da língua. Houve quem especulasse que tinha algo a ver com a aprovação pelo Parlamento da Espanha da lei que autoriza o casamento homossexual.
O bispo brasileiro Amaury Castanho, que é jornalista e estava como convidado do Pontifício Conselho de Comunicação Social, disse que "o papa é tímido, talvez não fale bem o espanhol". Português ele não fala. Em italiano, d. Amaury falou com o papa e o desejou um longo pontificado. "Ele riu quando disse isso", disse o bispo, que levava no bolso duas pontes dentárias que retirou. "Imagina se cai no colo do papa."
Havia cerca de 5.000 pessoas no auditório. O monsenhor John Patrick Foley, presidente do conselho, o saudou. A grande maioria aplaudiu muito Ratzinger.
Perguntado se não era um pouco estranha a reação entusiasmada dos jornalistas, já que em tese os presentes devem reportar criticamente sobre o papado, o vaticanista Orazio Petrosselli ("Il Messagero") disse que o ocorrido é habitual. "Nós somos todos amigos", disse. Mas Ratzinger não era malvisto por sua rigidez? "Uma coisa é o que ele pensa, mas ele sempre foi correto no trato com a imprensa, assim como Wojtyla", disse o jornalista.


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