São Paulo, quarta-feira, 24 de agosto de 2011

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'Mercenários' são exibidos como troféus

Repórter da Folha visita jovens africanos detidos por rebeldes, acusados de serem combatentes do governo líbio

Capturas reforçam tese veiculada por ONGs de que insurgentes também podem ser arbitrários e violentos

DO ENVIADO A TRÍPOLI

Numa sala apertada e escura se amontoam, trancafiados, 20 jovens africanos subsaarianos. Os olhos estão arregalados de medo, e os rostos, cobertos de suor devido ao calor sufocante.
"São mercenários enviados por Gaddafi para nos matar", grita Mohamed Ahmed, 30, militante rebelde. A sala que serve de prisão aos africanos fica na sede do comando rebelde no bairro de Janzur (oeste), um dos primeiros da capital, Trípoli, a se autoproclamar livre do controle governista.
O tratamento degradante dado aos suspeitos de integrar as fileiras de estrangeiros contratados pelo regime líbio como combatentes reforça a tese, veiculada por ONGs, de que os insurgentes também podem ser arbitrários e violentos.
Os detidos foram mostrados à Folha como troféus de guerra, mas nenhuma prova do envolvimento deles em atividades militares foi apresentada pelos rebeldes, apesar da insistência do repórter.
"Eu nunca peguei em armas nem fui contratado por Gaddafi. Trabalho como pedreiro", disse Abdullah Jarra, 30, imigrante de Mali. A negativa é repetida por todos que dividem a salinha imunda onde estão Jarra e outros africanos, de Gana e Nigéria principalmente.

NIGERIANOS
Numa outra sala, esta com janela, há cerca de 30 pessoas deitadas no chão, inclusive mulheres e adolescentes. São todos nigerianos e também estão presos acusados de ser mercenários.
"Não nos dão comida e não dizem quando sairemos", afirma um homem deitado no chão, antes de ser xingado por um insurgente. O repórter foi afastado do local por um rebelde e, minutos depois, cerca de metade dos detidos foi liberada. Não ficou claro se a presença da Folha teve algum impacto na soltura.
Mustafa Salem, 58, um dos líderes do conselho rebelde, alegou que "investigações" comprovaram que alguns dos detidos não eram mercenários, mas imigrantes.
Eles constituem uma mão de obra barata e dócil usada há décadas na Líbia para trabalhos braçais. Mercenários subsaarianos são notoriamente usados por Gaddafi. Analistas afirmam que eles constituem um dos alicerces da força combatente do regime líbio.
"Quem fica preso aqui não é coitadinho. São pessoas sem escrúpulos, inimigos da revolução", exalta-se o militante Ahmed.
(SAMY ADGHIRNI)


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