São Paulo, domingo, 24 de novembro de 2002

Texto Anterior | Próximo Texto | Índice

EUROPA

Pleito parlamentar deve criar entrave às pretensões políticas de Haider, que rachou a coalizão de governo e seu próprio partido

Eleição austríaca deve punir extrema direita

MÁRCIO SENNE DE MORAES
DA REDAÇÃO

Em meio ao caos político que se instalou no país após o enfraquecimento da atual coalizão governamental, os austríacos elegem hoje um novo Parlamento (Nationalrat), sabendo que o maior derrotado deverá ser o Partido da Liberdade (FPÖ), do líder de extrema direita Jörg Haider.
Em 1999, o FPÖ protagonizou a maior surpresa eleitoral da história da Áustria contemporânea, pois deu um salto de 5% dos votos para cerca de 27%, tornando-se a segunda força política do país.
Ironicamente, a formação que obteve mais votos (33%) em 1999, o Partido Social-Democrata (SPÖ), ficou fora da coalizão por não aceitar uma aliança com a extrema direita, abrindo caminho para os conservadores do Partido do Povo (ÖVP), do chanceler [premiê] Wolfgang Schüssel, que tinham chegado em terceiro, com pouco menos de 27% dos votos.
Agora a situação está indefinida, e, para especialistas consultados pela Folha, o Partido Verde (GPÖ) deverá ser o fiel da balança.
As últimas pesquisas mostram os dois principais partidos, o SPÖ e o ÖVP, que governaram em conjunto o país (quase sem interrupção) desde a década de 50 até 2000, com 39% das intenções de voto. A extrema direita e os ambientalistas ficariam com 10%. As pesquisas tinham margem de erro de dois pontos percentuais para cima ou para baixo.
"O desempenho do GPÖ será decisivo porque os social-democratas descartam a possibilidade de aliar-se aos extremistas. Ademais, os ambientalistas deverão conquistar o apoio de parte das pessoas que deixaram de votar no último pleito e de uma parcela significativa dos eleitores do ÖVP, que estão decepcionados com o partido por causa da aliança feita com Haider há quase três anos", explicou Fritz Windhager, da Universidade de Viena (Áustria).
Diferentemente dos Verdes alemães, o GPÖ não teve origem num amplo movimento popular, mas foi criado por algumas personalidades políticas. O partido já faz parte do Nationalrat há mais de uma década e tem 14 de suas 183 cadeiras atualmente.
O resultado da eleição deverá representar um entrave para as aspirações de Haider, figura central da cena política austríaca nos últimos anos. Ele e seu FPÖ deverão pagar caro por ter provocado o fim antecipado do atual governo, de acordo com os analistas.
"Após as enchentes de agosto, Schüssel decidiu adiar para 2004 a reforma fiscal que deveria ocorrer em 2003, como fez [o chanceler alemão] Gerhard Schröder. Haider não aceitou o adiamento, e os problemas da coalizão começaram", avaliou Herbert Dachs, do Instituto de Ciência Política da Universidade de Salzburgo.
"Com sua atitude, Haider causou uma grave disputa interna em seu partido. Ela opunha os pragmáticos, como a vice-chanceler Susanne Riess-Passer, que queriam continuar no poder, aos radicais de direita, que defendiam uma rápida redução dos impostos. Isso foi muito malvisto pela população e deverá custar caro à extrema direita", disse Dachs.

Perspectivas sombrias
Algumas das figuras de ponta dos dois principais partidos já acenaram com a possibilidade de formar uma "grande coalizão" para "impedir a instabilidade político-institucional". Todavia esse cenário poderia minar ainda mais a legitimidade da classe política austríaca, segundo os analistas.
"Em parte, a extrema direita teve sucesso em 1999 porque os eleitores estavam cansados de ver a divisão do poder entre social-democratas e conservadores desde a década de 50. Assim, só haverá uma grande coalizão se o GPÖ não conseguir bater o FPÖ ou se o SPÖ não acabar a disputa em primeiro, pois seu líder [Alfred Gusenbauer] já disse que não aceitará governar se seu partido não ganhar o pleito", analisou Dachs.
A Áustria ainda não se recuperou, portanto, do choque provocado pela ascensão da extrema direita. Assim, a eleição de hoje poderá, na melhor das hipóteses, restituir parte da legitimidade dos atores da cena política do país.


Texto Anterior: Indonésia: Exército divulga identidade de sargento morto
Próximo Texto: Caso Haider cria modelo para ação da UE sobre extremistas
Índice



Copyright Empresa Folha da Manhã S/A. Todos os direitos reservados. É proibida a reprodução do conteúdo desta página em qualquer meio de comunicação, eletrônico ou impresso, sem autorização escrita da Folhapress.