São Paulo, Domingo, 25 de Abril de 1999
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FUGA DE KOSOVO
ONU admite lentidão no registro de habitantes de Kosovo que fugiram à Albânia; êxodo de refugiados continua
Contagem de refugiados termina só em maio

SYLVIA COLOMBO
de Londres


Quando se pergunta a um kosovar de origem albanesa num dos campos de refugiados da Macedônia onde ele acha que estão seus parentes que não atravessaram a fronteira, ele levanta a cabeça em direção às montanhas cobertas de neve e é possível vê-lo lacrimejar. Outros choram ou, ainda, mostram raiva.
Um mês depois de ter se intensificado o êxodo dos albaneses de Kosovo, uma pergunta incomoda muitos refugiados: "O que está acontecendo do outro lado da fronteira?"
A preocupação com os que estão impedidos de procurar abrigo na Macedônia ou na Albânia, países que fazem fronteira com a Iugoslávia, e a incógnita sobre o que terá sido feito das casas e pertences dos kosovares são mistérios que nem a Otan, a ONU ou os governos dos países envolvidos sabem resolver.
Nas últimas semanas, cresceu o número de refugiados que procuraram sair de Kosovo via Montenegro, a outra República que, com a Sérvia, forma a Iugoslávia.
Na última quarta-feira, 3.000 alcançaram por ali a fronteira da Albânia e avisaram: há muito mais vindo pelas estradas. O Exército sérvio, segundo eles, já está agindo, e montou um posto de checagem na fronteira das duas regiões, selecionando quem pode continuar e procurar abrigo do outro lado e quem deve ficar e fazer parte do destino que os sérvios reservam para eles em solo iugoslavo.
Os refugiados que estão saindo por Montenegro vêm de pequenos vilarejos das montanhas de Kosovo: Kuciste, Maljevic, Pepic, lugares que foram aparentemente deixados em segundo plano pela polícia sérvia.
Atualmente, existem 362 mil refugiados na Albânia, 133 mil na Macedônia e cerca de 66.500 em Montenegro.
Os outros países que mais acolheram refugiados até agora são a Alemanha (9.974), a Turquia (3.849) e a Noruega (1.104), seguidos de Polônia (545) e Bélgica (517), segundo dados da ONU.
Na Albânia, milhares estão sendo levados de Kukes, cidade próxima à fronteira, para outros campos ou casas de famílias albanesas.
A ONU tenta, ali, fazer um registro e uma contabilidade mínima dos refugiados. A comissão encarregada admite: não será possível completar o trabalho antes do fim de maio.
A Cruz Vermelha, com estações de rádio e uma página na Internet, tem tentado reunir as famílias que foram separadas. A infra-estrutura para acomodação dos refugiados é mais crítica na Albânia, segundo dados do Acnur (Alto Comissariado das Nações Unidas para Refugiados).
Ali os campos operam excedendo sua capacidade máxima e as condições sanitárias são precárias. Autoridades locais estão improvisando ginásios e escolas, além de prédios públicos, para abrigar os refugiados.
Em Skodra, cidade ao norte da Albânia, um conjunto de fábricas abandonadas abriga 3.000 pessoas, que dormem sobre peças e máquinas usadas.
Já na Macedônia, apesar da hostilidade da polícia local, segundo as reclamações de grande parte dos albaneses, as condições de instalação dos refugiados são bem melhores.
O campos do país estão superlotados, mas as condições de higiene e de amparo médico são consideradas satisfatórias pela ONU.
No entanto, há na Macedônia o temor de que os refugiados saiam dos campos e resolvam se instalar no país. O estímulo para a remoção para países estrangeiros é grande, e as visitas de familiares são controladas com rigidez.
Por outro lado, o governo macedônio tem trabalhado com a ONU para liberar a entrada de kosovares que estão sendo impedidos de atravessar a fronteira.
Nos últimos dias, as negociações têm se desenrolado com o objetivo de que os milhares de albaneses que estão nas montanhas próximas do vilarejo Male Malina possam entrar na Macedônia e ser recebidos nos campos. Enquanto isso, grupos de ajuda humanitária têm levado até lá cobertores e comida, em caminhões.
Segundo a ONU, as condições de saúde atuais dos refugiados nos campos da Macedônia e da Albânia são regulares.
A mortalidade causada por doenças caiu muito, mas os principais problemas ainda são os respiratórios, causados pelo longo trajeto percorrido a pé pelas montanhas na fuga de Kosovo.


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