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São Paulo, sexta-feira, 25 de julho de 2003

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CONFLITO

Companhia militar privada diz poder enviar batalhão de soldados à Libéria para deter presidente; EUA recusam oferta

Empresa oferece tropa para agir na África

THOMAS CATÁN E
STEPHEN FIDLER
DO "FINANCIAL TIMES"

Enquanto os EUA estudam uma possível intervenção na guerra civil liberiana, uma empresa anglo-americana se ofereceu para enviar ao país um batalhão de soldados de manutenção da paz para deter o presidente Charles Taylor.
A Northbridge Services, empresa militar privada fundada por soldados reformados dos EUA e do Reino Unido, anunciou que tinha condições de enviar entre 500 e 2.000 homens armados à Libéria, em três semanas, para pôr fim aos combates -que afetam toda a região em torno de Monróvia, a capital. "O nosso pessoal pode trabalhar de acordo com as regras da comunidade internacional e evitar a necessidade de deslocar soldados americanos para uma situação de risco", diz a empresa.
A proposta não recebeu apoio dos EUA. Ele seria necessário para o financiamento da operação. Mas representa uma idéia que está sendo encarada com seriedade pelo governo americano e por outros governos, que relutam em enviar suas tropas à região.
Kofi Annan, secretário-geral da ONU, disse, em 1998, que havia considerado empregar uma empresa privada para manter os combatentes distantes dos refugiados na crise de Ruanda (1994). Mas concluiu que "o mundo talvez ainda não estivesse pronto para privatizar a paz".
Mas o momento pode ter chegado. Peter Singer, do Instituto Brookings, especialista no tema, diz que há discussões no governo de George W. Bush, sobretudo no Pentágono, sobre o assunto.
A idéia estaria sendo estimulada pelas preocupações com o Exército dos EUA: muitas de suas divisões estão no Iraque, e há tropas estacionadas no Afeganistão, na Coréia do Sul e em outros lugares.
No Reino Unido, uma comissão da Câmara dos Comuns sugeriu, em 2002, que o governo estudasse cuidadosamente se o uso mais amplo de empresas militares privadas em operações humanitárias e de apoio à paz britânicas não poderia ajudar a reduzir o gasto excessivo de recursos militares.
Especialistas privados já são usados para apoiar atividades de manutenção da paz da ONU, como a remoção de minas ou a purificação de água. Empresas privadas financiadas pelos EUA já estiveram em ação na Libéria.
A Northbridge diz que sua intervenção "custaria uma fração do investimento necessário para enviar soldados americanos", mas não deu estimativa exata.
Em Serra Leoa, um tribunal especial apoiado pela ONU, que, em junho, indiciou Taylor por crimes de guerra, respondeu favoravelmente à proposta da Northbridge.
Mas funcionários do tribunal disseram à empresa que não há verbas disponíveis e instaram-na a procurar financiamento dos EUA. O Departamento de Estado não respondeu favoravelmente à proposta, apesar do apoio velado de alguns congressistas.
Pasquale Dipofi, o diretor de operações da Northbridge nos EUA, disse que "há um estigma em torno da profissão". A Northbridge entrou em conflito com a Chancelaria britânica, neste ano, depois de surgirem reportagens de que ela teria contratado centenas de ex-soldados para combater pelo governo da Costa do Marfim.
Jack Straw, chanceler britânico, disse que o envio de homens armados pela Northbridge "solaparia seriamente o processo de paz". A empresa reagiu e negou que se tratasse de uma fachada para a contratação de mercenários.
Os EUA pediram a renúncia de Taylor e querem que ele deixe o país antes de considerar o envio de soldados à Libéria. Taylor insiste em que só aceitará a oferta de asilo na Nigéria quando as forças de paz chegarem ao seu país.
Em junho, a empresa se ofereceu para fornecer ao tribunal apoiado pela ONU uma "força policial militar especial" de cerca de 60 homens armados, que deteriam Taylor e o levariam a julgamento (por cerca de US$ 4 milhões). De lá para cá, a violência se agravou na Libéria, o que tornaria essa operação difícil. Dipofi disse que "essa situação poderia ter sido resolvida em junho".
Kevin O'Brien, da Rand Europe, outro especialista no assunto, diz que essas operações paramilitares correm o risco de serem vistas como uma "caça a recompensas".
Mas as empresas militares privadas vêm mantendo a pressão sobre os governos. Doug Brooks, da International Peace Operations Association, diz que as operações de paz da ONU são, em larga medida, conduzidas por soldados de países em desenvolvimento. Ele diz que o uso de empresas privadas aumentaria a qualidade dessas operações.
"Muitas vezes, os EUA, o Reino Unido e a França se recusam a participar. As Forças Armadas menos capacitadas acabam, então, executando uma das tarefas militares mais difíceis", diz.


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