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ALEMANHA
Schröder empatou o jogo ao convencer parte do eleitorado que padrões sociais estavam em risco, diz Karl Kaiser
Para acadêmico, Bem-Estar Social determinou voto
CLAUDIA ANTUNES
ESPECIAL PARA A FOLHA, DE CAMBRIDGE (EUA)
A virada de última hora na votação parlamentar do domingo passado na Alemanha, frustando a
previsão de que a eleição produzisse uma maioria clara para os
conservadores, deveu-se ao fato
de o chanceler social-democrata
Gerhard Schröder ter conseguido
mostrar que as reformas do Estado do Bem-Estar Social propostas
por sua rival democrata-cristã,
Angela Merkel, violariam "padrões sociais mínimos" que são
consenso na sociedade alemã.
A opinião é do professor Karl
Kaiser, 71, ex-diretor do Conselho
Alemão de Relações Exteriores,
ex-assessor dos chanceleres social-democratas Willy Brandt
[1969-1974] e Helmut Schmid
[1974-1982] e hoje professor visitante na Universidade Harvard,
nos Estados Unidos. Leia a seguir
trechos da entrevista com Kaiser.
Folha - Qual a mensagem enviada
pelos eleitores alemães?
Karl Kaiser - A principal mensagem é que não se pode desviar
muito do consenso existente na
sociedade alemã de que, mesmo
quando se trata de reformar o Estado do Bem-Estar, é preciso
manter padrões sociais mínimos.
O cerne da disputa entre Schröder e Merkel foram essas reformas, e ele foi bem-sucedido ao
mostrar que ela violou esse consenso ao propor medidas que rebaixariam demais esses padrões.
Folha - O senhor pode especificar
essas propostas?
Kaiser - Foram principalmente
duas: a indicação para o seu gabinete paralelo de um ministro de
Finanças defensor de uma alíquota única de 25% para o Imposto
de Renda, o que beneficiaria os
mais ricos, e a proposta de aumento no imposto sobre o consumo, que prejudicaria os mais pobres.
Folha - A política externa influenciou a disputa eleitoral?
Kaiser - Muito pouco, porque a
única diferença real entre os social-democratas e a CDU [União
Democrata-Cristã] é a questão do
ingresso da Turquia na União Européia. O atual governo é a favor e
a CDU é contra, mas isso não foi
um tema determinante.
Folha - O senhor vê algum ponto
em comum entre o resultado eleitoral na Alemanha e o voto dos
franceses contra a Constituição européia?
Kaiser - Existe na Europa em geral uma rejeição à globalização,
mas essa não é a visão da maioria
dos cidadãos. Na minha opinião,
a maioria dos europeus apóia o
envolvimento cada vez maior na
economia internacional. A Alemanha é o primeiro exportador
mundial e está se saindo muito
bem no que diz respeito à globalização. Mesmo assim, existe um
certo ressentimento em relação às
conseqüências desse processo,
diante dos altos níveis de desemprego na UE. Essa questão foi importante nos referendos sobre a
Constituição na França e na Holanda. Mas nesses países houve temas com mais peso, como a imigração e o medo da ampliação da
União Européia.
Folha - O fato de a eleição não ter
produzido uma maioria clara significa que o país está dividido entre
os que apóiam reformas liberais
que supostamente tornariam a
economia mais competitiva e os
que não as aceitam?
Kaiser - A divisão não é entre os
que são a favor ou contra mudanças no sistema de bem-estar. A
questão é a extensão dessas reformas. Os democrata-cristãos têm
uma ala social que é muito forte, e
devemos ter em mente que praticamente todas as leis do Estado
do Bem-Estar Social alemão do
pós-guerra foram aprovadas tanto por eles quanto pelos social-democratas. É esse o enorme consenso a que me referi no início.
Folha - O senhor apostaria na formação de uma grande coalizão entre SPD e CDU?
Kaiser - No momento, Schröder
está numa posição mais forte do
que a de Merkel, porque a Constituição alemã determina que o governo de turno permaneça no poder até que seja formada uma nova maioria.
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