São Paulo, domingo, 25 de setembro de 2005

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ALEMANHA

Schröder empatou o jogo ao convencer parte do eleitorado que padrões sociais estavam em risco, diz Karl Kaiser

Para acadêmico, Bem-Estar Social determinou voto

CLAUDIA ANTUNES
ESPECIAL PARA A FOLHA, DE CAMBRIDGE (EUA)

A virada de última hora na votação parlamentar do domingo passado na Alemanha, frustando a previsão de que a eleição produzisse uma maioria clara para os conservadores, deveu-se ao fato de o chanceler social-democrata Gerhard Schröder ter conseguido mostrar que as reformas do Estado do Bem-Estar Social propostas por sua rival democrata-cristã, Angela Merkel, violariam "padrões sociais mínimos" que são consenso na sociedade alemã.
A opinião é do professor Karl Kaiser, 71, ex-diretor do Conselho Alemão de Relações Exteriores, ex-assessor dos chanceleres social-democratas Willy Brandt [1969-1974] e Helmut Schmid [1974-1982] e hoje professor visitante na Universidade Harvard, nos Estados Unidos. Leia a seguir trechos da entrevista com Kaiser.
 

Folha - Qual a mensagem enviada pelos eleitores alemães?
Karl Kaiser -
A principal mensagem é que não se pode desviar muito do consenso existente na sociedade alemã de que, mesmo quando se trata de reformar o Estado do Bem-Estar, é preciso manter padrões sociais mínimos.
O cerne da disputa entre Schröder e Merkel foram essas reformas, e ele foi bem-sucedido ao mostrar que ela violou esse consenso ao propor medidas que rebaixariam demais esses padrões.

Folha - O senhor pode especificar essas propostas?
Kaiser -
Foram principalmente duas: a indicação para o seu gabinete paralelo de um ministro de Finanças defensor de uma alíquota única de 25% para o Imposto de Renda, o que beneficiaria os mais ricos, e a proposta de aumento no imposto sobre o consumo, que prejudicaria os mais pobres.

Folha - A política externa influenciou a disputa eleitoral?
Kaiser -
Muito pouco, porque a única diferença real entre os social-democratas e a CDU [União Democrata-Cristã] é a questão do ingresso da Turquia na União Européia. O atual governo é a favor e a CDU é contra, mas isso não foi um tema determinante.

Folha - O senhor vê algum ponto em comum entre o resultado eleitoral na Alemanha e o voto dos franceses contra a Constituição européia?
Kaiser -
Existe na Europa em geral uma rejeição à globalização, mas essa não é a visão da maioria dos cidadãos. Na minha opinião, a maioria dos europeus apóia o envolvimento cada vez maior na economia internacional. A Alemanha é o primeiro exportador mundial e está se saindo muito bem no que diz respeito à globalização. Mesmo assim, existe um certo ressentimento em relação às conseqüências desse processo, diante dos altos níveis de desemprego na UE. Essa questão foi importante nos referendos sobre a Constituição na França e na Holanda. Mas nesses países houve temas com mais peso, como a imigração e o medo da ampliação da União Européia.

Folha - O fato de a eleição não ter produzido uma maioria clara significa que o país está dividido entre os que apóiam reformas liberais que supostamente tornariam a economia mais competitiva e os que não as aceitam?
Kaiser -
A divisão não é entre os que são a favor ou contra mudanças no sistema de bem-estar. A questão é a extensão dessas reformas. Os democrata-cristãos têm uma ala social que é muito forte, e devemos ter em mente que praticamente todas as leis do Estado do Bem-Estar Social alemão do pós-guerra foram aprovadas tanto por eles quanto pelos social-democratas. É esse o enorme consenso a que me referi no início.

Folha - O senhor apostaria na formação de uma grande coalizão entre SPD e CDU?
Kaiser -
No momento, Schröder está numa posição mais forte do que a de Merkel, porque a Constituição alemã determina que o governo de turno permaneça no poder até que seja formada uma nova maioria.


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