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ARTIGO
Caso reflete esquizofrenia continental
RICARDO BONALUME NETO
DA REPORTAGEM LOCAL
Fragmentação da personalidade e perda de contato com a realidade são características do comportamento esquizofrênico, segundo definição de dicionário. A
descrição é perfeita para parte dos
militares latino-americanos, com
destaque para muitos brasileiros,
quando o assunto são as relações
com os EUA e suas Forças Armadas muito mais poderosas.
O receio de uma maior presença
dos americanos no Paraguai é o
exemplo mais recente dessa atitude, cuja manifestação clássica
contemporânea no Brasil é a idéia
que de que os "gringos" conspiram para tomar a Amazônia.
Essa atitude vai de soldados a
generais, felizmente nem todos, e
afeta mesmo o pequeno grupo de
especialistas universitários em temas militares, além de grupelhos
de discussão na internet.
Se por um lado há muitos exemplos de intervenção americana
em assuntos internos da região,
por outro o atual temor ignora os
imperativos estratégicos que norteiam as ações dos EUA hoje.
Basta ver que o Comando Sul do
Exército dos EUA -responsável
pela América Latina- tem 363
militares e 141 civis (no total, incluindo as outras forças, o Comando Sul conta com cerca de 3
mil membros, entre militares e civis), segundo uma contagem recente. Parte deles colaborou diretamente com tropas brasileiras na
transição de comando da força internacional para a força da ONU,
sob comando do Brasil, no Haiti,
em 2004.
Como comparação, há em torno de 120 mil soldados dos EUA
hoje no Iraque.
Os novos mitos criados também
colocam de lado coisas óbvias
-como a própria razão de ser da
existência de uma base militar de
um país em território de outro.
Bases no exterior
Um país tem uma base em outro país por uma simples questão
geográfica: essa base serve de
trampolim para atingir eventuais
inimigos na região. Para intervir
no Afeganistão e no Iraque, os
EUA usaram bases no Paquistão e
no Kuwait, por exemplo.
Para defender a Europa Ocidental de um ataque comunista, os
EUA mantiveram algumas unidades com maior poder de fogo na
Alemanha e em países próximos.
Boa parte ainda está lá. O mesmo
raciocínio vale hoje para as unidades na Coréia do Sul, parte da defesa deste país contra a Coréia do
Norte comunista.
Qual o interesse estratégico dos
EUA no Paraguai para manter bases ali? No máximo, se quer vigiar
a Tríplice Fronteira e seus vínculos hipotéticos com o terrorismo
islâmico. Para isso não é preciso
ter tanques ou helicópteros de
ataque ou caças. Meia dúzia de
agentes resolve a coisa.
Os EUA hoje estão em processo
não de ampliação, mas de redução de bases no exterior.
Ajuda do "inimigo"
Os militares são, por força de
sua profissão, nacionalistas; são
pagos para defender territórios
nacionais. Os EUA foram aliados
do Brasil na Segunda Guerra
Mundial. Tiveram bases aéreas e
navais no território brasileiro.
Mas uma crise precoce surgiu
quando os americanos quiseram
desembarcar fuzileiros navais para proteger as bases. Os militares
brasileiros, corretamente, impediram a pretensão descabida.
Hoje os militares brasileiros, e
também os dos países vizinhos,
fazem rotineiramente exercícios
com forças dos EUA, especialmente navais. Uma empresa dos
EUA, a Raytheon, ganhou a concorrência para o estratégico programa Sivam (Sistema de Vigilância da Amazônia). Se os EUA quisessem invadir a região, seria loucura rematada pedir ao "inimigo"
para colaborar na sua proteção.
Outros países latino-americanos são menos sensíveis. Basta ver
que boa parte dos Exércitos da região usa uniforme camuflado
idêntico ao dos "gringos". Não é o
caso do Brasil.
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