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ANÁLISE
Sim, ele pode, mas menos do que dizia
CLÓVIS ROSSI
COLUNISTA DA FOLHA
Nove de cada dez analistas
americanos e estrangeiros escreveram, quando Barack Obama tomou posse, que o sucesso
de sua administração seria determinado pela aprovação de
seu plano de saúde e pelo resultado da guerra no Afeganistão.
Se essa perspectiva estava
correta -e parece ao menos razoável-, Obama andou 40% do
caminho para o sucesso, com a
aprovação, pelo Senado, de seu
plano de saúde, a grande aposta
em política interna.
Digo 40% porque o plano
aprovado (e que ainda tem que
ser conciliado com o da Câmara
de Representantes) não é o que
Obama mandou ao Congresso.
Não contém, por exemplo, a
opção de saúde pública, a favorita dos progressistas, a corrente em que, teoricamente, se inscreve o presidente.
Mesmo assim, é um belo passo adiante. Corrige uma tremenda anomalia: os Estados
Unidos gastam, em saúde, o dobro, como porcentagem de seu
PIB, da média de seus pares do
mundo rico membros da Organização para a Cooperação e
Desenvolvimento Econômico.
Mas o gasto maior não corresponde a uma universalização maior, ao contrário. É, dos
países ricos, o que deixa maior
fatia de sua população sem cobertura média (46 milhões de
um total de 308 milhões).
O que embaça o êxito representado pela passagem do plano de saúde é o fato de que a sua
tramitação despertou todos os
(maus) instintos do conservadorismo americano. A campanha de ódio desatada pelos conservadores incluiu não apenas
exageros, compreensíveis mesmo que não justificáveis em
momentos de polarização político-administrativa, mas também mentiras tão descaradas
que lembravam mais uma república bananeira do que a primeira potência do planeta.
De alguma maneira, o ímpeto
dos conservadores condicionará o restante da gestão Obama.
Basta lembrar o comportamento na Conferência do Clima em
Copenhague, em que Obama,
em vez do "yes, we can" de sua
campanha eleitoral, preferiu o
"não, não dá para avançar",
abraçando-se à China para produzir um documento final tão
pífio que começa a ser atacado
até pelos que participaram de
sua gestação (União Europeia)
ou finalização (África do Sul).
E a questão climática, que é
tanto interna como externa,
passa a ser o grande desafio para Obama doravante, aprovado
o plano de saúde, até porque o
Afeganistão é uma obra em
construção sobre o qual só se
poderá fazer avaliações em algum tempo mais.
O próprio presidente vincula
ao menos parcialmente a criação de empregos, que é o grande nó da incipiente recuperação econômica, à transformação da economia americana em
uma "economia verde", para
usar o rótulo da moda.
O projeto Obama de "economia verde" também está tramitando no Congresso e de sua
aprovação depende em parte a
apresentação de propostas
mais ousadas nas discussões
globais sobre o clima, de que
Copenhague foi apenas o primeiro passo, de acordo com o
próprio presidente.
Tudo somado, a aprovação
do plano de saúde melhora o
balanço do primeiro ano Obama, que, ainda assim, termina
com a nítida sensação de que
ele pode, sim, muito, mas menos do que fizera o mundo
acreditar durante a campanha.
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