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São Paulo, quarta-feira, 26 de fevereiro de 2003

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IMPRENSA

Autores dizem que o principal jornal francês "degrada a vida democrática do país", o diário se diz vítima de inveja e ódio

Livro acusa "Le Monde" de abuso de poder

ALCINO LEITE NETO
DE PARIS

O principal jornal francês, "Le Monde", é alvo de ataque violentíssimo no livro "La Face Cachée du Monde: du Contre-Pouvoir au Abus du Pouvoir" (a face oculta do "Monde': do contra-poder ao abuso de poder), dos jornalistas Pierre Péan e Philippe Cohen.
O livro chega hoje às livrarias da França, pela editora belga Mille et Une Nuits. A exclusividade na publicação de alguns trechos foi dada à revista "L'Express", que dedicou a sua última capa ao assunto, deixando em polvorosa o meio jornalístico e intelectual.
Ontem, o "Monde" adiantou-se ao lançamento e respondeu aos ataques, com página e meia de artigos e o editorial do dia, acusando os autores de estarem movidos pela inveja e pelo ódio. Anunciou que está processando os autores, o editor do livro, a "L'Express" e o diretor da revista, Denis Jeambar. Em 1997, o grupo Monde tentou comprar a revista, sem sucesso.
A principal denúncia contra o "Monde" é a de que a publicação está pondo em risco a democracia francesa, por abuso de poder, lobismo e conduta parcial. O jornal teria, inclusive, ajudado na derrocada do ex-premiê socialista Lionel Jospin, que abandonou a vida política depois de ter sido ultrapassado pelo líder de extrema direita Jean-Marie Le Pen na corrida presidencial de 2002.
Segundo o livro, o "Monde" contribuiu para a ruptura do premiê com seu antigo parceiro Jean-Pierre Chevènement, que apresentou candidatura própria. Foi o "Monde" também que revelou o passado trotskista de Jospin, que este escondera ao deslanchar sua carreira no Partido Socialista.
A opção de Chevènement de não se associar aos socialistas é considerada por Jospin como um dos motivos de sua derrota, conforme artigo que o ex-premiê publicou no mesmo "Monde".
O jornal teria também se comprometido com a candidatura de Edouard Balladur (centro-direita), em 1995, às eleições presidenciais, contra Jacques Chirac (centro-direita) e a esquerda reunida em torno de Jospin.
"O novo "Monde" apresenta todos os traços da impostura, mesmo se se trata de uma impostura moderna. É porque ele acarreta uma verdadeira degradação da vida democrática neste país que decidimos levantar o véu sobre esse assunto", escrevem Péan e Cohen.
O "novo "Monde'" a que eles se referem é o que resultou de reformas empreendidas a partir de 1994 pelos jornalistas Jean-Marie Colombani, presidente do grupo Le Monde e diretor da publicação, Edwy Plenel, diretor de Redação, e Alain Minc, presidente do Conselho de Fiscalização, que cuida da saúde econômica da empresa.
É contra esse trio que se concentram as acusações mais duras e minuciosas, na apuração de dois anos dos jornalistas. Segundo o livro, Colombani teria "treinado" políticos para entrevistas na TV, aceitado viagens gratuitas do festival de cinema de Cannes e da Bienal de Veneza, aumentado seu próprio salário em 85% (para 29.919) e fixado residência fiscal na Córsega, de onde é originário.
Sobre Plenel, os autores descrevem suas relações "privilegiadas" com o chefe de polícia Bernard Deplace, a partir dos anos 80, considerado "o segundo policial da França". Relação que, segundo o livro, "ultrapassa a que normalmente pode existir entre um jornalista e um informante".
O livro também diz que a diretoria do jornal oculta a verdadeira situação financeira da empresa, bem como a tiragem real.
Para os autores, o grupo Le Monde registrou nos últimos dois anos perdas "que ultrapassam 25 milhões", e sua tiragem média teria sido de 213.014 exemplares em 2001. Segundo o "Monde", o resultado bruto consolidado do grupo foi negativo em 13 milhões em 2001. E a tiragem na França e no exterior chegaria 405.983, apurada, conforme o jornal, por um organismo independente, Diffusion Contrôle OJD.


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