São Paulo, segunda-feira, 26 de junho de 2006

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Constituinte testa "refundação" da Bolívia de Morales

População vai às urnas no domingo para eleger Assembléia e decidir em referendo se dá mais autonomia aos Estados

Partido do ex-cocaleiro precisa de dois terços dos votos; oposição denuncia ingerência do presidente venezuelano Hugo Chávez

Jose Luis Quintana/Reuters
O presidente Morales participa de festa indígena em Tiwanaku


FABIANO MAISONNAVE
DA REPORTAGEM LOCAL

Pela primeira vez sob o governo Evo Morales, a Bolívia vai às urnas no próximo domingo para eleger uma Assembléia Constituinte e votar em referendo sobre se os departamentos (Estados) devem ter mais autonomia administrativa.
Mais do que um teste político, o resultado será decisivo para determinar quanto poder o presidente socialista terá para levar adiante o que tem chamado de "refundação" do país.
A alta popularidade Morales -81%, segundo pesquisa divulgada na quinta-feira- tem sido a grande arma de seu partido, o MAS (Movimento ao Socialismo), para tentar chegar aos dois terços necessários para a aprovação de matéria constitucional sem negociar com outros partidos e frear a maior independência dos departamentos em relação a La Paz.
Na oposição ao socialista, há duas forças principais. No caso do referendo, os adversários mais fortes são os seis dos nove prefeitos (governadores) do país, dentre os quais se destaca Rubén Costas, de Santa Cruz, principal pólo econômico.
Já a principal agremiação oposicionista, Podemos (Poder Democrático e Social), também com candidatos inexperientes, tem apostado na liderança do ex-presidente Jorge "Tuto" Quiroga, segundo colocado nas eleições de domingo.
Apesar de ser o tema do referendo, a questão sobre a autonomia terá de ser regulamentada pela Assembléia Constituinte, que será inaugurada em 6/8.
"Morales é contrário às autonomias porque significaria ceder poder aos prefeitos, na maioria de oposição", disse à Folha a analista política Jimena Costa, da Universidade Mayor de San Andrés. "Por outro lado, a oposição sabe que a única maneira de fazer frente ao governo MAS é conseguir na Constituinte que os poderes locais consigam fazer oposição. Esse é o tema de fundo."
A polarização com relação ao tema chega até sobre como o resultado do referendo deve ser interpretado. O partido Podemos defende que o resultado seja considerado a partir de cada departamento, e não pela votação nacional.
"O risco da polarização e divisão do país não está tanto no fato de que um departamento diga "sim" e o outro, "não", mas no fato de desconhecer o resultado que pode emergir desse referendo em cada um dos departamentos", disse à Folha Carlos Alberto Goitia, candidato por Podemos. "Se Santa Cruz disser "sim" no referendo, por exemplo, entrará num regime de autonomia que deve ser tratado pela Assembléia Constituinte sob esse princípio, porque são as normas estabelecidas pela convocatória."

Chávez na campanha
O MAS discorda e defende que os resultados sejam analisados a partir de subdivisões, como as províncias que formam os departamentos, e que as autonomias incluam territórios indígenas.
Analistas acreditam que Morales dificilmente conseguirá obter os dois terços por causa das recém-aprovadas regras eleitorais. Uma derrota de Morales no Congresso, a Lei de Convocatória praticamente impede que um partido consiga eleger todos os constituintes de um distrito eleitoral.
Depois de um começo tímido devido ao impacto do decreto da nacionalização, a campanha ganhou visibilidade nas últimas semanas. Ela tem sido marcada pelas declarações dos dois líderes e pela acusação de ingerência do presidente venezuelano, Hugo Chávez, que foi à Bolívia participar da abertura da campanha do MAS, em maio.
"A ingerência de Chávez gera a necessidade de alertar o país sobre os riscos que isso traz. Particularmente, para a elaboração da Constituição, que deve ser feita por, para e pelos bolivianos", disse Goitia.
"As contribuições para a campanha são de militantes do MAS. Aqui não há ingerência de Cuba, da Venezuela, não é como os governos do passado, que pagaram suas campanhas com dinheiro das multinacionais e dos EUA", disse Cuasace.


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