São Paulo, sábado, 26 de junho de 2010

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CLÓVIS ROSSI

G20 x os senhores do universo


Crise chegou a custar nas Bolsas de Valores mundiais o equivalente a duas vezes o PIB dos Estados Unidos


A REVISTA ALEMÃ "Der Spiegel" fez um interessante exercício sobre os custos da crise dos últimos dois anos: entre o início de 2008 e 3 de março de 2009, o valor de todas as ações negociadas em todas as Bolsas de Valores do planeta sofreu uma erosão de US$ 27,7 trilhões.
Para entender o número, basta saber que a economia dos EUA, no final do mesmo 2009, valia pouco mais da metade (US$ 14,3 trilhões).
É claro que não desapareceram nesses 15 meses dois EUA. Teriam desaparecido se todos os detentores de ações as vendessem, todas, naquele 3 de março em que o preço delas havia chegado ao fundo do poço.
Mas é um número que dá dimensão da profundidade da crise e da volatilidade que ela criou. Há outras cifras mais terrenais, como os 8 milhões de empregos perdidos nos EUA durante a crise.
Para comparação: o governo Lula, de bela performance na criação de empregos, precisou de sete anos para criar pouco mais de 8 milhões de empregos, a quantidade que um só ano de crise destruiu nos EUA.
Basta de números, por enquanto. Vamos à causa principal de tão terrível situação. Há consenso de que foi, na essência, provocada por uns "poucos -quantos? 300, 400, 500?- que [em Wall Street] se tornaram precisamente isso, Mestres do Universo" (Thomas Wolfe, um dos grandes novelistas norte-americanos do século passado).
Se é assim, você aí, perspicaz mas ingênuo, imaginará que os mestres do universo -ou, mais adequadamente, os chacais do sistema financeiro- foram devidamente punidos ou foram criadas regras para impedir que continuassem a jogar o mundo em um tobogã infernal.
Errou. Todas as três cúpulas do G20 já realizadas terminaram com palavras fortes a respeito do controle do sistema financeiro. Mas nada aconteceu. O jogo continua sendo jogado da mesmíssima maneira.
A já citada "Der Spiegel" verificou que, no primeiro trimestre deste ano, a porcentagem da aplicação de investimentos no lucro pré-impostos de grandes entidades financeiras manteve-se tão ou mais colossal do que antes da crise. A Goldman Sachs lucrou US$ 5,2 bilhões no total, dos quais US$ 4,9 bilhões vieram do manuseio de investimentos.
Além de jogar o mesmo jogo, praticam terrorismo: Josef Ackermann, presidente da entidade que agrupa os grandes bancos internacionais, disse que regulações estritas sobre os "senhores do universo" fariam que o mundo rico criasse menos 9,7 milhões de empregos até 2015.
Chute, puro chute. É impossível saber quantos empregos serão criados nesse período, porque é impossível saber quais as condições macroeconômicas predominantes.
Esse triste cenário começou a mudar só ontem, quando o Congresso americano aprovou o que Barack Obama chamou de a mais "dura reforma financeira desde as que foram criadas na esteira da Grande Depressão", 80 anos atrás.
Basta? Não, como admite o próprio Obama: "A crise provou que nossas economias nacionais estão indissociavelmente ligadas. E, assim como turbulência econômica em um lugar pode rapidamente se espalhar para outro, salvaguardas em cada uma de nossas nações podem ajudar a proteger todas elas".
A partir de hoje, na sua quarta cúpula, os líderes do G20 têm a chance de mostrar que são capazes de criar uma moldura global que imponha controle aos mestres do universo.


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