|
Texto Anterior | Próximo Texto | Índice | Comunicar Erros
Votação na Venezuela evoca a do Brasil
Belicosidade do governo e acanhamento da oposição são elementos em comum nas eleições dos dois países
Semelhança, porém, é mais de forma do que de conteúdo; ambiente difere nos "decibéis" e no trato com a mídia
CLÓVIS ROSSI
ENVIADO ESPECIAL A CARACAS
Quem sai do ambiente
eleitoral no Brasil e desembarca no da Venezuela nota,
sem muito esforço, uma forte
coincidência: a belicosidade
do governo e o acanhamento
da oposição, colocada na defensiva.
Entre o desejo de Luiz Inácio Lula da Silva de extirpar o
DEM e a retórica de Hugo
Chávez contra a oposição, há
uma diferença apenas de decibéis, embora grande.
Disse Chávez na quinta-feira: "Vamos dar uma surra
nos esquálidos "vendepátria", sem vergonhas, corruptos subordinados ao império
ianque". "Esquálidos" não é
para tomar no sentido literal,
mas uma designação depreciativa de Chávez contra todos os que não são chavistas.
Os "esquálidos" reagem timidamente, não como Jorge
Bornhausen, o presidente de
honra do DEM, que insinuou
que Lula estava bêbado, mas
como os tucanos, que hesitam em criticar Lula.
Armando Briquet, da direção nacional do Primero Justicia, do conglomerado oposicionista, disse ao jornal "El
Mundo" uma frase que soa
como o "pode mais", o primeiro mote dos tucanos:
"Não queremos voltar ao
passado. Não só reconhecemos que há uma Venezuela
diferente, que mudou para
sempre, mas também que
crescemos nesta Venezuela.
O que queremos é melhorar."
Do lado governista, há, como no Brasil, uma profusão
de cânticos aos feitos (supostos ou reais) do governo Chávez. Já no saguão do aeroporto, um punhado de painéis
que anunciam desde 99% de
crianças levadas ao ensino
médio até o crescimento de
132% na produção de milho.
Mas os painéis acabam
sendo, também, a evidência
de que as semelhanças Chávez/Lula, Brasil/Venezuela,
são muitíssimo mais de forma do que de conteúdo. Eles
atribuem os feitos anunciados a "vivir en socialismo".
No Brasil, "socialismo" entrou em desuso no léxico e na
prática do PT desde que assumiu o governo faz oito anos.
Segunda diferença de conteúdo: Lula esbraveja contra
a mídia, mas não tomou nenhuma medida concreta para cerceá-la, ao passo que
Chávez não renovou a licença da RCTV, canal de maior
audiência.
E sitia o dono da Globovisión, outro canal oposicionista, mas mais equilibrado
que a TV pública venezuelana: pelas contas do Conselho
Nacional Eleitoral, a estatal
VTV dedicou aos governistas
90% de seu espaço informativo, ao passo que a Globovisión distribuiu-o em 58% para a oposição e 39% para o
governo.
DIFERENÇA DE PROJETOS
A diferença mais importante entre os dois processos
está dada pelos projetos em
jogo em cada um dos dois
países. No Brasil, todos os
principais candidatos se dispõem a fazer mais, mas a
manter o eixo central, composto por estabilidade macroeconômica, programas de
transferência de renda, investimentos em infraestrutura. Nada revolucionário.
Na Venezuela, a oposição
pretende ter uma presença
na Assembleia Nacional suficiente para barrar o que chamam de transformação do
país em uma "VeneCuba".
Já o governo quer dar a
surra na oposição porque "a
presença dela na Assembleia
Nacional dificulta a construção do socialismo", como diz
o sociólogo espanhol Juan
Carlos Monedero, que acompanha de perto e com fervor a
evolução do chavismo.
Agora que Cuba está desestatizando setores da economia, a oposição passa a ter
maior razão ainda em falar
de "VeneCuba": Monedero
rejeita a plena estatização da
economia venezuelana e calcula em 50% a fatia que deve
ficar com o setor privado.
Se é assim mesmo, ainda
há socialismo a construir:
cálculos do ano passado indicam que 58% do PIB (Produto Interno Bruto, medida
da produção de um país) é
gerado pelo setor privado,
para 42% do estatal.
Texto Anterior: Eleição define ritmo do projeto chavista Próximo Texto: Oposição critica alterações em regra eleitoral Índice | Comunicar Erros
|