|
Texto Anterior | Próximo Texto | Índice
AFEGANISTÃO
Novo governo e grupo suíço estudam formas de reconstruir estátuas destruídas pelo Taleban no ano passado
Budas de Bamiyan poderão ser refeitos
MARCELO STAROBINAS
DE LONDRES
O novo governo do Afeganistão
começa a esboçar planos para um
projeto que promete simbolizar
do fim da era Taleban: a reconstrução das estátuas de Buda de
Bamiyan, monumento erguido
há cerca de 1.500 anos e destruído
pelo regime extremista islâmico
em março de 2001.
A iniciativa, porém, ainda pode
levar algumas décadas para sair
do papel. Após mais de dez anos
de guerra civil, o país é uma terra
arrasada. Fome, doenças, seca,
falta de infra-estrutura e a reconciliação de grupos armados de diferentes etnias são as prioridades
na agenda de Hamid Karzai, líder
do recém-empossado governo
provisório.
Num encontro com parlamentares japoneses na semana passada, durante uma conferência de
arrecadação de fundos para a reconstrução afegã, Karzai se referiu em tom emocionado aos Budas de Bamiyan. Mas, destacou,
"muitas outras necessidades levam precedência".
"A destruição dos Budas foi
uma perda com a qual ainda não
conseguimos nos reconciliar", declarou Karzai durante o encontro.
"É como se você perdesse um
membro de sua família todos os
dias."
Projeto
Enquanto as autoridades afegãs
se concentram na resolução de
causas mais urgentes, um grupo
com sede na Suíça vem assumindo as rédeas do projeto de reconstituição de um dos Budas. O Instituto e Museu do Afeganistão, entidade amparada pela Unesco
(órgão da ONU para fins sociais,
culturais e educacionais), já trabalha na primeira etapa do processo: a digitalização de imagens e
medidas da estátua.
O protótipo virtual será exibido
numa página da internet
(www.new7wonders.org), na qual
os interessados podem saber mais
sobre o projeto e fazer doações.
Os organizadores estimam que
entre US$ 40 milhões e US$ 50 milhões sejam necessários.
A partir da imagem computadorizada tridimensional, eles planejam construir na Suíça uma réplica de um décimo do tamanho
do monumento original (a maior
estátua tinha 53 metros de altura,
e a menor, 38 metros).
"Primeiro vamos reconstruir
um deles. Depois, aprendendo
com a experiência do primeiro,
partiremos para o segundo", disse
à Folha, por telefone, Paul Bucherer, arquiteto especialista em arte
e história afegã que dirige o museu situado na pequena cidade de
Bubendorf. "Essas estátuas foram
originalmente construídas ao longo de um período de 300 anos. Assim, se fizermos devagar, e levarmos 20 anos, já será muito mais
rápido."
Ele esteve no Afeganistão no início do mês, onde discutiu com
Karzai e com os ministros da Cultura e do Interior os planos para o
futuro das estátuas. "Eles acreditam que a reconstrução de pelo
menos um dos Budas seja prioridade política absoluta", disse.
"Vai ser um símbolo para o povo
afegão de que se livraram finalmente da influência do Taleban."
Incentivo ao turismo
Além das motivações nacionalistas do projeto, argumenta Bucherer, os Budas, quando reerguidos, devem trazer milhares de turistas e seus dólares ao país. Apenas cerca de 160 km separam a capital, Cabul, até o local onde ficavam as estátuas (embora, com as
atuais condições das estradas, sejam necessárias sete horas de carro para percorrer o trajeto).
A Unesco e o governo afegão
pretendem realizar uma conferência de especialistas em maio
para determinar os detalhes técnicos e logísticos da reconstrução.
Ainda não se sabe, por exemplo,
se os Budas serão esculpidos nas
mesmas montanhas em que se
encontravam. Ou se as novas estátuas terão propositalmente as
imperfeições que tinham em razão dos efeitos do tempo.
O antigo governo do Taleban
-derrubado em novembro por
grupos de oposição beneficiados
pela ampla campanha de bombardeios dos EUA em retaliação
aos atentados de 11 de setembro- dinamitou as estátuas por
julgá-las símbolo de culto pagão,
contrário às premissas religiosas
do islamismo. O budismo, entretanto, não é praticado no Afeganistão há cerca de mil anos. As estátuas eram patrimônio histórico,
um retrato do passado pré-islâmico do país, e não um ponto de
peregrinação religiosa.
"Os muçulmanos do Afeganistão dizem que esses Budas são
símbolos da grandeza de Deus",
diz Bucherer. "Na visão deles, hoje ninguém reza mais para essas
estátuas, mas sim para Deus, que
é muito maior que as estátuas."
Texto Anterior: Oriente Médio: Autoridade Nacional Palestina pede fim de ações contra Israel aos militantes Próximo Texto: Comentário: Um vazio eloquente Índice
|