|
Texto Anterior | Próximo Texto | Índice
Libaneses e palestinos fecham feridas
Líderes apostam em novas relações com pedido de perdão 33 anos após início da guerra civil no Líbano
Para analista, aproximação tem importância histórica, mas é ato político; o grande
desafio é sair dessa arena e conquistar os militantes
TARIQ SALEH
COLABORAÇÃO PARA FOLHA, DE BEIRUTE
Ghassan Haddad e Ali Zaher
são amigos desde os tempos de
escola, mas o primeiro é libanês
cristão e o último é palestino.
Ambos sempre enfrentaram a
desconfiança alheia devido ao
ressentimento mútuo entre
cristãos e palestinos por causa
da sangrenta guerra civil libanesa (1975-1990). Mas agora os
dois amigos têm esperança.
Um aperto de mãos histórico,
há duas semanas, entre o líder
do partido libanês Falange
Cristã, Amin Gemayel, e o representante da Organização
para a Libertação da Palestina
(OLP) em Beirute, Abbas Zaki,
deu por encerrada, formalmente, uma das piores feridas remanescentes da guerra civil.
Gemayel e Zaki escolheram a
semana em que o país realizou
uma série de eventos para relembrar o início da guerra civil,
no dia 13 de abril. No evento,
chamado de "Abertura e Reconciliação" e que aconteceu
na sede do partido, em Beirute,
também estava presente o líder
druso Walid Jumblatt.
"Nós, palestinos ,lamentamos profundamente nossos erros antes e durante a guerra civil contra nossos irmãos libaneses", declarou Zaki a 44 importantes políticos cristãos.
Gemayel pediu perdão pelas
ações cometidas pelas milícias
cristãs durante a guerra e salientou a necessidade de todos
respeitarem a soberania do Líbano. Ele também citou o Acordo do Cairo, de 1969, que permitiu às facções palestinas se
armarem e usarem o solo libanês para lançarem ataques a Israel, como erro histórico.
No entanto, Gemayel, que já
foi presidente do Líbano de
1982 a 1988, disse que lembrar
as batalhas e "heroísmos" que
ocorreram entre os cristãos e
palestinos era, agora, desnecessário, sendo mais importante
rever os laços em comum que
unem os dois povos. "Os palestinos sãos nossos irmãos, a causa deles é a nossa também."
Desprezo
Segundo Zaki, a mudança de
política das lideranças palestinas se deu em 2006, visando
melhorar as relações com os líderes libaneses. A aproximação
teria começado em 2001, por
intermédio de Jumblatt.
A relação entre palestinos e
cristãos libaneses sempre foi
muito tensa e de desprezo mútuo entre os membros mais radicais de suas comunidades.
Haddad e Zaher contam que
muitas vezes foram discriminados por outros amigos e até
familiares. "Eu sentia um racismo por alguns de meus parentes quando Ali estava presente.
Por anos eu tentei não mesclar
o que aconteceu no passado
com os palestinos, que sempre
foram muito gentis comigo",
disse Haddad.
Zaher teve problemas semelhantes. "Muitos me perguntavam como eu podia ser amigo
de Ghassan e esquecer o que os
cristãos haviam feito na guerra
civil com a gente."
A guerra civil libanesa eclodiu no dia 13 de abril de 1975,
quando milicianos da Falange
Cristã metralharam um ônibus
com refugiados palestinos em
Beirute. O evento foi o estopim
para um conflito civil que já vinha se desenhando devido às
divergências políticas entre
cristãos e os outros libaneses
muçulmanos e drusos.
Durante a guerra, os muçulmanos e drusos se aliaram aos
palestinos, e o país mergulhou
em um conflito que durou 15
anos e matou mais de 150 mil
pessoas. Ambos os lados cometeram atrocidades, como o
massacre de mais de 300 cristãos por milícias palestinas e libanesas na cidade de Damour,
em 1976, e o massacre de Sabra
e Chatila, em que forças cristãs
assassinaram mais de mil refugiados palestinos, em 1982.
A guerra levou a um pedido
da comunidade internacional
para que a Síria interviesse militarmente no Líbano, que só se
retirou definitivamente do país
em 2005. Israel invadiu o Líbano em 1978 e 1982.
Após o fim da guerra, em
1990, os ressentimentos de lado a lado continuaram.
Segundo o professor Oussama Safa, diretor do Centro Libanês de Estudos Políticos de
Beirute, a relação cristã-palestina era umas das mais sensíveis feridas da guerra.
"O pedido de desculpas é um
fato histórico, um importante
início para cimentar a animosidade que jamais havia se dissipado entre eles", disse.
Mas segundo o professor, o
pedido de desculpas vem mais
por necessidade política. "Claramente o Fatah [partido palestino do presidente Mahmoud Abbas], que domina a
OLP, está alinhado com as forças do governo, do qual fazem
parte os Falangistas".
O desafio, de acordo com Safa, será se esta aproximação
chegará aos povos, de ambos os
lados, ou se ficará restrita apenas à arena política.
E ele destaca uma questão
ainda mais importante: "se a
aproximação chegará aos militantes de ambos os lados que
abandonaram a Falange e a Fatah e foram para partidos mais
radicais, que se desprezam".
Para o professor, a Falange
virou um partido moderado,
pois seus integrantes mais críticos dos palestinos foram para
as Forças Libanesas e outros
pequenos grupos.
Texto Anterior: Colômbia: Exército acusa Farc de atacar desde Equador Próximo Texto: Artigo: A encruzilhada democrata Índice
|