São Paulo, domingo, 27 de outubro de 2002

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COMPORTAMENTO

Liberalização das leis de adoção nos anos 90 possibilita a 2 milhões de casais gays americanos adotarem filhos

Homossexuais promovem "gayby boom" nos EUA

SÉRGIO DÁVILA
DE NOVA YORK

Nunca na história dos EUA tantas crianças voltaram da escola e contaram o que aprenderam para papai e papai ou mamãe e mamãe. Segundo o último grande levantamento da população norte-americana feito pelo governo, há hoje em dia pelo menos 2 milhões de casais homossexuais masculinos e femininos criando filhos, adotados ou não. O fenômeno foi batizado de "gayby boom".
O nome faz trocadilho com o "baby boom", termo em inglês criado para designar a explosão de nascimentos que ocorreu logo após a Segunda Guerra Mundial. Os filhos do "baby boom", dos quais o ex-presidente Bill Clinton foi um dos representantes mais famosos e poderosos, têm hoje 50 anos em média e são o principal mercado consumidor do país.
O "gayby boom" é bem mais recente e reúne homossexuais de todas as idades. No final dos anos 90, com a liberalização das leis de adoção nos EUA, cada vez mais casais gays puderam virar pais ou mães adotivos legitimamente, o que, por tabela, acabou estimulando outros pares que pensavam em conceber naturalmente ou com pais e mães de aluguel e criar os filhos em lares gays.
Hoje, há 3 milhões de crianças vivendo em famílias não-convencionais, e esta pequena multidão deve chegar a 3,4 milhões em dois anos. Apesar de não haver levantamentos confiáveis ao longo da história, o número é inédito, afirma a empresa de marketing Witeck-Combs, voltada para o mercado homossexual.
E deve aumentar, de acordo com a Witeck: segundo pesquisa recente realizada pela firma, quase metade dos casais gays sem filho ouvidos disseram ter vontade ou planos de ter ou adotar uma criança nos próximos anos.

US$ 22 bilhões
O interesse do mercado no assunto se explica em cifras. O "gayby boom" deve movimentar US$ 22 bilhões neste ano só em artigos infantis, educação e alimentação. "Casais com filhos deram uma nova dimensão ao mercado gay", disse Don Montuori, editor da Packaged Facts, empresa que co-patrocina as pesquisas dirigidas da Witeck.
De acordo com ele, até hoje os anunciantes voltados para a comunidade se concentravam em viagem, moda e bebidas. "Mas, quanto mais cresce o número de lares gays, mais se amplia o seu raio de consumo, e os publicitários começam a perceber que é aí que estão os próximos dólares a ser ganhos", disse Montuori.
A constatação do boom acontece num momento particularmente favorável aos casais gays na sociedade americana. Há dois meses, o prestigioso jornal "The New York Times" anunciou que passaria a publicar avisos de casamentos homossexuais em sua tradicional página dominical. Logo o "Boston Globe" avisou que seguiria política editorial semelhante.
"Para serem listados, os casais de mesmo sexo devem ter sua parceria confirmada numa cerimônia oficial", avisou o diário. Os dois provocaram um efeito cascata. Na mesma semana do anúncio do "Boston Globe", o "Charlotte Observer", da Carolina do Norte, e o "St. Louis Post-Dispatch", do Missouri, tomaram decisões de igual teor.
Hoje, segundo a ONG norte-americana Aliança Gay e Lésbica contra a Difamação, há 139 jornais no país que aceitam anúncios de uniões homossexuais.
Além disso, gays famosos assumidos como a comediante Rosie O'Donnell estão perdendo o medo de aparecer na mídia para falar de seus relacionamentos e da criação de seus filhos (no caso de O'Donnell, são três crianças, com uma quarta a caminho, já que sua companheira engravidou por inseminação artificial).
Há hoje nos EUA 14,2 milhões de homossexuais, segundo cálculos das ONGs (o governo é proibido por lei de perguntar em seu censo a orientação sexual do entrevistado). Esse contingente deve consumir US$ 600 bilhões em 2007, total que já chega a mais de dois terços disso hoje em dia.


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