São Paulo, sábado, 27 de novembro de 2010

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CLÓVIS ROSSI

A caixa preta dos bancos e o Brasil


Os testes de estresse a que as instituições foram submetidas no auge da crise não aclararam a situação


NÃO SEI se os bancos ainda usam, nesta era de dinheiro mais virtual que real, aquelas imensas caixas-fortes de cinema. Mas está se comprovando que se transformaram em uma perigosa caixa preta (ou sempre foram?).
Essa é uma das causas de fundo da crise que já foi grega, virou irlandesa e começa a ser ibérica (Portugal e Espanha).
Por partes:
1 - No auge da crise, a Europa submeteu seus bancos ao chamado teste de estresse, para ver quais deles resistiriam a um eventual novo vendaval como o que se seguiu à quebra do Lehman Brothers. A maioria passou, o que levou a uma certa calma nos mercados (os Estados Unidos fizeram idêntico teste, mas não cabe nesta coluna).
Agora, no entanto, quando a crise volta a apertar, vem o vice-governador do Banco de Espanha, o banco central local, para dizer que vai pedir ao setor bancário "um esforço adicional de transparência", com novos requisitos a partir do primeiro trimestre de 2011.
2 - Aguçada como está a sensibilidade nos mercados, o anúncio certamente vai contribuir para novas especulações sobre os bancos da Espanha. Afinal, especular é o que os mercados mais sabem fazer.
Ajuda esse instinto básico o fato de que, na Irlanda, dois de seus grandes bancos, o Anglo Irish e o Allied Irish, passaram no teste de estresse, ainda que com nota mínima, digamos assim.
Não obstante, estão agora no olho do furacão, como os demais bancos irlandeses. Nunca é demais repetir que a crise irlandesa é antes e acima de tudo uma crise do seu sistema bancário (e imobiliário).
3 - Some o 1 e o 2 acima e torna-se impossível não concordar com o ministro alemão de Finanças, o ultra-ortodoxo Wolfgang Schläuble, quando diz que a Europa vive "uma situação muito nervosa, na qual há uma incrível quantidade de especulação em que comentários completamente obscuros de repente parecem fazer sentido e desestabilizam os mercados".
Convém lembrar que até hoje, dois anos depois da quebra do Lehman Brothers, tida como a data inaugural da grande crise, não voltou inteiramente ao normal o crédito interbancário, ao menos na Europa, exatamente porque todo o mundo ficou com medo de emprestar para todo o mundo porque não se sabe o tamanho do mico em cada ombro.
O que esse quadro ainda obscuro tem a ver com o Brasil? Por enquanto, pouco ou nada.
Mas é sempre bom lembrar que, pós-Lehman Brothers, um dos canais mais relevantes do contágio no Brasil foi exatamente a retranca do sistema bancário nos empréstimos. As grandes casas multinacionais passaram a dar prioridade, de resto óbvia, a seus clientes locais, afogados pela crise.
As filiais brasileiras, por sua vez, atendiam quase só os grandes clientes (Petrobras, por exemplo).
O então primeiro-ministro britânico Gordon Brown chegou a definir a situação como "protecionismo financeiro". Parece óbvio que a retranca no crédito voltará a ser aplicada enquanto não se abrir totalmente a caixa preta da grande banca europeia.


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