|
Texto Anterior | Próximo Texto | Índice
OPINIÃO
Viva o intelectual conquistador
MAUREEN DOWD
DO "NEW YORK TIMES"
OS DEMOCRATAS estão
andando por aí em estado de choque.
Uau, estão se dizendo. Não
somos uns fracotes totais! Não
precisamos ficar parados, levando tapas na cara de fanfarrões republicanos e do pessoal
do movimento Tea Party, com
seus discursos voltados a semear o medo. Com humildade,
e encontrando um jeito de
atuar em conjunto, conseguimos que alguma coisa fosse feita realmente.
Num minuto eles eram perdedores legislativos, brigando
entre eles e acotovelando-se
para encontrar a saída. No momento seguinte eram pessoas
que fizeram história, dividindo
socos congratulatórios no peito
e arrepios de emoção na Casa
Branca. Como foi que o presidente, que sempre conserva
sua atitude altiva, e a presidente da Câmara, Nancy Pelosi,
cheia de artimanhas, de repente conseguiram afastá-los da
rodovia Jimmy Carter e conduzi-los para a alameda Franklin
Roosevelt?
Os democratas se deram as
mãos, prenderam a respiração
e pularam do penhasco -não
que o projeto de lei fosse radical. E, milagre, nada terrível
aconteceu. Os mercados tiveram alta. Os resultados das pesquisas de opinião subiram. A
confiança das pessoas cresceu.
John McCain ameaçou democratas, dizendo a uma rádio
que "não haverá cooperação
pelo resto do ano" dos republicanos. Acabou ali, pelo visto, o
discurso de "o país em primeiro
lugar".
Mas David Frum, ex-redator
de discursos de George W.
Bush, admitiu que, ao tentarem
transformar a reforma da saúde no Waterloo de Obama
-uma reprise do desastre dos
Clinton em 1994-, os republicanos podem ter criado seu
próprio Waterloo.
"Demos ouvidos às vozes
mais radicais do partido e do
movimento, e elas nos conduziram para a derrota abjeta e irreversível", escreveu Frum em
seu blog, acrescentando: "Oradores conservadores na Fox e
em programas de rádio tinham
instigado a base eleitoral republicana a um frenesi tão grande
que qualquer negociação se
tornou impossível. Como negociar com alguém que quer assassinar sua avó?"
Alguns membros da base republicana se revelaram como
os neandertais racistas que são.
Manifestantes reunidos
diante do Capitólio no sábado
lançaram um epíteto racista
contra dois congressistas negros, quando estes passaram
pelo local. Barney Frank, de
Massachusetts, foi alvo de um
xingamento antigay. O democrata contrário ao aborto Bart
Stupak foi xingado de "assassino de bebês" pelo deputado republicano do Texas Randy
Neugebauer, que diz que vem
recebendo "uma enxurrada
tremenda" de apoio.
Porrete
Foi repulsivo. E, para os democratas que tinham se combatido durante cada volta e reviravolta do projeto de reforma
da saúde, foi unificador.
Uma semana antes, Fred
Hiatt, editor da página de editoriais do "Washington Post",
tinha escrito que Obama não
parecia feliz em seu cargo, que,
em lugar da "jovialidade" de
Roosevelt e John Kennedy, ele
projetava "cansaço e a impressão de estar apenas cumprindo
seu dever".
Na terça-feira, porém, o presidente estava alegre, e o sorriso contagiante que esteve tão
escasso nos últimos dois anos
iluminou o Salão Leste. Muitos
parlamentares democratas tinham ficado frustrados com o
fato de Obama não agir com
mais contundência, antes. Como a deputada Louise Slaughter, que em fevereiro disse que
"gostaria de ver um pouco mais
dureza aqui ou ali".
Até agora, Obama vem se irritando com as pessoas que retratam os assuntos de Washington em termos maniqueístas de força ou fraqueza ou de
vermelho ou azul. Ele queria
apresentar argumentos razoáveis, queria buscar acordos de
meio-termo, queria flutuar em
sua torre de marfim.
Mas, finalmente, quando
chegou a hora de fazer pressão,
ele a fez (e deixou Pelosi aplicar
a pressão final). Ele tratou a política não como exercício intelectual, mas como exercício político. Entendeu que às vezes
não é possível manter uma postura altiva. Às vezes é preciso
mergulhar na lama. É preciso
parar de ser cerebral, é preciso
sujar as mãos. É possível combater o medo com o poder.
O político de Chicago teve de
aprender uma das grandes verdades americanas: é preciso dar
um tapa na cara do agressor. O
presidente sempre falou com
voz macia. Mas desta vez ele
brandiu o porrete.
Tradução de CLARA ALLAIN
Texto Anterior: Reforma financeira será o próximo desafio Próximo Texto: Eleições regionais viram referendo sobre Berlusconi Índice
|